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Destruição
Lixx

E até agora eu não sei como fui parar ali. No chão frio, mesmo que estivesse com diversas camadas de roupa, aquele frio ainda conseguiria penetrar a minha alma. O rosto úmido, olhos vermelhos e inchados. Cabelos bagunçados, cheios de nós por conta das minhas mãos que passavam e embaraçavam-no cada vez mais. Por minha boca saía um som lastimável, uma voz entrecortada com soluços que faziam meu corpo todo estremecer. A parede que estava usando como apoio, parecia me engolir. Um desespero se instalou dentro de mim. Não era porque eu sentia que a parede me engoliria, por uma aparência catastrófica ou pelo chão frio. Era porque estávamos partindo um do outro. Só pertenceríamos a nós mesmos e a ninguém mais, nem mesmo nos compartilharíamos entre nós dois. Não existia um nós, era só um você só seu e um eu só meu.

     E esse sentimento de solidão me invadiu, preenchendo cada poro do meu corpo. Espalhando-se pelas veias e artérias. Agora tudo dentro de mim era saudade, confusão e dor. Continuei ali ainda, no chão frio que me mantinha lúcida no meio de toda aquela miscelânea que transbordava dentro de mim, começando a escorrer e molhar o chão frio. O chão que começava a esquentar. A parede que me devorava, agora só me dava apoio. As minhas mãos inquietas largaram meus cabelos e foram para o chão, servindo de apoio para levantar meu corpo quase sem vida. Um espelho que ficava pendurado na parte oposta a parede que dava apoio, vi nele meu reflexo. Olhar perdido, distante e sem vida, rosto molhado e olhos inchados, um emaranhado de cabelos escuros e uma feição de desespero.

     Passei água pelo rosto, para tentar tirar os vestígios do choro. Uma dor de cabeça manifestava-se aos poucos. Encontrei um pente desembaracei o cabelo, levou um tempo considerável. Tirei a roupa, jogando-a em algum canto do banheiro. Quando liguei o chuveiro, as lágrimas retornaram. Agora eu encostava a testa no vidro do box. Não contive um mísero soluço. Comecei a lavar o cabelo e a ensaboar meu corpo. Ainda chorava desesperadamente. Meu peito doía quando respirava, na tentativa de buscar mais ar e me acalmar. Aos poucos toda aquela angústia começava a ir embora, esvaindo-se com a água. Ao fechar o chuveiro todas as lágrimas tinham acabado. O ardor que percorria meu corpo, deixando rastros e consumindo as partes que ainda estavam em desespero.

     A calmaria se instalou. Coloquei o roupão, que estava pendurado do lado da toalha, no corpo e apertei bem. A toalha foi para o que cabelo para evitar que o chão molhasse. Caminhei descalça até o quarto, sentei-me na cama e fiquei olhando minhas mãos. Estava enrugada por causa do banho, era normal, já estava acostumada, nadei por muitos anos. Tirei a toalha do cabelo, o excesso de água já tinha secado. Meu guarda-roupas estava abarrotado, tinham roupas caídas pelo chão, espalhadas por todos os cantos, menos na cama. O lugar que eu me recusava a deitar para dormir, minha cama agora era o sofá ou o tapete da sala. A televisão quase nunca estava desligada, ela ajudava a distrair. Alguns filmes me faziam chorar, outros só mantinham minha atenção por alguns segundos. Os filmes de romance eram os piores, eu quebrava objetos, mas nunca acertava a televisão, ficaria sem distração.

     Cada vez que acordava de manhã era de um pesadelo, o pesadelo da briga. Acordava gritando ou chorando, sempre pedindo pra ele voltar. Já faziam duas semanas que era aquela mesma rotina, acordar gritando e dormir chorando. Cortava meu coração ter a mesma lembrança sempre, aquela briga, a “despedida” catastrófica, cheia de gritos. Não dormia bem, não comia direito. Estava no fundo do poço, lutando para sobreviver e tentar recolher os cacos que sobraram. Respirei fundo, coloquei uma roupa, penteei o cabelo e continuei ali parada, tentando não pensar, tentando esquecer. Vaguei pelo apartamento, acabei encontrando uma garrafa de vodca perdida entre as caixas de coisas dele. Se as pessoas bebiam para esquecer, eu faria o mesmo. Precisamos destruir para recomeçar.


Este texto é administrado por: Larissa Costa
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