Moro afastado do centro da cidade e o bairro ainda tem um certo ar rural, se bem que nos últimos tempos tenha se desenvolvido bastante. Aqui por perto existe um Centro de Tradições Gaúchas, onde todos os anos se desenrolam grandes eventos alusivos á Semana Farroupilha e que culminam com um concurso de trovas e trovadores muito disputado, pois aparecem gaudérios de todas as querências do nosso estado. Como sou quase vizinho do "galpão", tenho o “privilégio” de acompanhar as acirradas disputas musicais entre os trovadores, nem sempre muito sóbrios devido ao “aquecimento” para o embate, que começa de manhã cedo, antes do tradicional e esperado churrasco, pois os gaudérios são madrugadores. Entre um mate e outro, testemunhei esta cantoria que vai abaixo, e que era mais ou menos assim:
Meu amigo e companheiro,
Parceiro de muita luta
Enxergo a tua cara feia
Marcada por tanta disputa
De tanto perder peleia
Viraste um filho da puta
E isso não me aporreia...
-
Filho da puta? Eu não sei
Nem sei do que estás falando
Na tua cama deitei e rolei
Tu sabe quem tô comendo
Da tua china eu sou rei
Já tô até te guampeando
E é só isso que eu já sei...
-
Guampeando coisa nenhuma
Não se passa nada disso
Tu não come coisa alguma
Pois teu pinto deu enguiço
Índio "véio" te apruma,
Gostas mesmo é do chouriço
Acho até que tu é dama... -
Já te atendo a altura
Do chouriço eu não gosto
te orienta criatura
Me agrada um tira gosto
Mas gosto mesmo é da fartura
E quando chegar no agosto
Eu te mostro a dita dura...
-
Tu é mesmo um cara dura
Mas que falta de respeito
Não me fala em ditadura
Com tua china eu me deito
Pois tu vive de "pindura"
Só sei que tu leva jeito
De viver só na frescura...
-
To arrombando esta porta
Que frescura, mas que nada
Vou cagar na tua horta
Além de uma baita mijada
Vai ter a faca que corta
Já vou te baixar porrada
Não te esconde guampa torta...
-
De guampa eu não entendo
É melhor sair pro lado
Tu não é o que tá dizendo
Com esse verso delicado
Tu já tá te derretendo
Com esta trova de veado
Não fica aí te metendo...
-
Não te "fresqueia" vivente
De veado eu não sei nada
Mas sei bem do teu passado
Da tua família afamada
Sei por onde tens andado
Esta macheza é fachada
Teu pai também é veado...
-
Mas que trova mais melosa
Isso é coisa de veado
E tá ficando perigosa
- Eu já tava desconfiado
Teu nome deve ser Rosa
Ainda por cima tarado...
Olha só a poderosa...
..
-
Pra fechar o desafio
Vais saber o que eu acho
Pois a Rosa tu não viu
Tu não passa de um borracho
Que até peida em assobio
Vou capar teu apetrecho
Vai pra puta que o pariu...
E por aí terminou o desafio de trovas, com vaias, aplausos,pela gritaria que se ouviu e o tiroteio que aconteceu em seguida. Foi uma peleia musical e tanto, que se esparramou pela vizinhança, terminando com a chegada da nossa briosa Brigada Militar, que botou os gaudérios campo afora, acabando com a festa. Ainda escutei um último verso, que surgiu desgarrado entre a barulhada e a correria dos trovadores e assistentes que disparavam da polícia. Acho que era mais ou menos assim:
Vai com calma brigadiano
Eu sei qual é teu defeito
Tu sabe que não me engano
Mas nem é assim tão feio
Como o teu chapéu aragano
E já que parou o rodeio
Tá lá por baixo "dos pano"
É a "ródia" do cú "vermeio"...
Luiz Carlos Rivera - Livramento/RS.
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Biografia: Sou Psicólogo e Psicoterapeuta. Separado, 62 anos, pai de um casal de filhos, escritor amador recente. Leitor voraz, fumante inveterado e abstêmio convicto. Me interesso por fotografia digital e analógica e por antiguidades. Torcedor fanático do S.C. Internacional. Músico profissional (já aposentado). Me interessam também pessoas e suas histórias de vida, verdadeiras ou não... |