Estava eu passeando pela praia de Ipanema quando me deparei com um grupo constituído por três garotas adolescentes e um moreno forte que devia ser o "personal trainer" delas. Faziam ginástica num daqueles deques ao longo do calçadão. Eu devia estar sem ter o que fazer, ou então, as meninas eram, de fato, uma gracinha, porque fiquei observando a cena durante bastante tempo.
Além dos quatro havia um personagem que ocupava o centro do espetáculo: uma balança, dessas portáteis, digitais, elegantemente "slim", quase uma folha de papel. Era um tal de subir e descer da balança, acaloradas discussões em torno de diferenças entre uma e outra pesagem, comparações com a pesagem do dia anterior e da semana passada. Quase tudo devia estar girando em torno de frações de quilo, bem abaixo da precisão da balança, foi o que eu pensei com sarcasmo.
Não sei se foi alguma informação que as meninas deram ou se foi algum fato novo, só sei que, lentamente a discussão foi tomando novos rumos e o foco foi se deslocando do aferido para o aferidor. Era argumento para lá, argumento para cá, via-se claramente que o moreno estava começando a ficar preocupado. Desconcertado, ele tentava se justificar, elas fazendo pouco caso do instrumento dele que, de fato, podia ser chinês, mas, era novo, comprado em camelô de confiança.
Estavam naquele bate-boca, elas atacando, ele na defensiva, quando subitamente da noite fez-se dia. A balança devia estar mal posicionada, algum grão de areia devia estar prejudicando a precisão da máquina, ou então foi algum ajuste que o rapaz deu, a verdade é que, depois de uma mexida, o peso das meninas baixou. Agora era tudo só felicidade, as meninas sorrindo e o forçudo nitidamente aliviado, fazendo graça.
Eu pensei com meus botões: quanto desperdício! Não que eu quisesse que a preocupação das meninas fosse outra, que elas se ocupassem com o destino da humanidade, o mundo aí se esvaindo em crises. Não que eu esperasse que a energia delas, gasta com a balança, com os exercícios de ginástica, fosse empregada de forma mais útil. Não! Isto seria muita ingenuidade, pior, seria muita ignorância!
Eu pensei em sexo mesmo! As meninas cavando a sua própria sepultura com as preocupações de uma beleza que esvanece, rendendo-se à tirania da balança, da academia, do "personal trainer", da dieta, submetendo-se aos preconceitos de uma sociedade para quem mulher é tão somente forma, o "slim" da balança regendo a anorexia, afinando a silhueta.
Depois, em casa, eu refleti melhor: ignorância mesmo era eu achar que estas coisas se separam, a questão social da questão sexual. O mercado que paga pouco para uma força de trabalho que abunda, porque a automatização comandada pelos donos do poder assim o fez, é o mesmo mercado que define o "slim" da silhueta. A mídia que comenta em tom sério e circunspecto a emissão de papéis fantasmas por empresas fantasmas sem qualquer respaldo no real, que alardeia o lado podre de tudo, divulga morte e crime fazendo do mundo um circo de horrores é a mesma mídia que cria o escape, a fuga para um mundo fictício e virtual, de beldades plásticas, heróis movidos a pó. É neste mundo que se vende o esvanecimento da mulher no "slim" da balança, claro, só depois de empanturrá-la nos "fast-foods" da vida!
Cláudio Thomas Bornstein
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