Eu não tenho a certeza que o Brasil tenha acordado. Acho que neste momento, estamos começando a se espreguiçar. O que seria um passo antes de acordar de vez. Que também é importante. Seria injusto depois de trinta anos de democracia corporativista acordar sem se espreguiçar. Só que muitas vezes, espreguiçamos e não acordamos.
Com dez dias de protestos, já é possível fazer uma análise do que está acontecendo. As ruas do Brasil foram tomadas por uma multidão ainda sem rosto. O que num primeiro momento é compreensível. No meio dessa multidão estão alguns delinquentes que tapam o rosto. É preciso averiguar a mando de quem eles estão lá. De outro lado, vemos uma polícia repressiva. Com resquícios da ditadura. Também com suas reivindicações.
Tive de desandar em gargalhadas, com um cientista político analisando as depredações da prefeitura de São Paulo. Ele chamou esses delinquentes de infiltrados. Depois completou usando outro adjetivo. Chamou-os de anarquistas. Gargalhei ainda mais quando ele disse que esses “anarquistas” devem ter lido Godwin ou Tolstói. Esses dois devem ter se revirado no túmulo.
E para que tudo não acabe numa grande decepção, é urgente que esta multidão mostre um rosto. Diga claramente a que veio. O Brasil embarcou na onda de São Paulo. E a princípio os paulistas estão revoltados com o aumento nas passagens de ônibus e metrô. Se, de repente, São Paulo achar que já deu, o Brasil vai acompanhar.
E essa não é a hora de achar que já deu. O povo parece ter descoberto que pode dando apenas uma espreguiçada. Acordando de vez, a História poderá contar que o Brasil mudou nos braços dos brasileiros. Para isso é preciso líderes e uma pauta de reivindicações clara. Saúde, segurança, e educação. Um basta do desperdício do dinheiro público. Neste momento, não se vê líderes e nem uma pauta. Apenas multidão. Sem um rumo. E também sem entender.
Pelo menos até agora, há um silêncio na classe política. Das duas uma. Ou estão achando que a coisa não é com eles. Ou perderam a fala com a surpresa. Claro que é mais surpresa. O que mais surpreende, é a multidão tomando as ruas durante um governo do Partido dos Trabalhadores. Uma mancha na biografia de Dilma Rousseff.
Sempre é uma boa hora para pressionar pelo fim da corrupção. De chutar o traseiro dos corruptos. Infelizmente, contra os desmandos da Copa do Mundo, e contra os elefantes brancos já é um pouco tarde. O dinheiro já escoou pelo ralo.
A foto dos fantasmas no Congresso Nacional é emblemática. Acho ser necessário bem mais que fantasmas para assustar o corporativismo que habita ali. Talvez, entre o se espreguiçar e o acordar haverá uma eleição em 2014. O resultado dela será importante para sabermos se a multidão das ruas, além de saber protestar é também politizada.
|