Que a Igreja Espanhola é símbolo de retrocesso na aproximação entre a conduta cristã e a sociedade moderna, todo mundo sabe. Porém, a maneira como fatos isolados são tratados pelas dioceses desse país ainda pode causar – além de algumas boas piadas – surpresa e indignação.
A bola da vez é a história do padre espanhol Andreas García Torres, de 46 anos. Ele foi afastado de sua paróquia em uma cidade perto de Madri, Fuenlabrada, sob suspeita de ser homossexual. Uma foto sua abraçado ao seminarista de 28 anos Yannick Delgado (abaixo), ambos sem camisa, circula pela internet e despertou a ira preconceituosa e arcaica da Diocese de Getafe. Até aí, nada muito diferente dos constantes escândalos sexuais que envolvem membros da Igreja Católica em várias partes do mundo.
As peculiaridades espanholas, porém, aparecem nos detalhes “sórdidos”. Lançando mão da ideia ultrapassada de que existem grupos de risco entre os infectados pelo HIV (homossexuais seriam mais propensos à doença, por sua conduta supostamente promíscua), a diocese exigiu que fossem feitos exames que verificassem se o padre é portador do vírus, como uma forma de provar sua homossexualidade. Além disso, o padre foi imediatamente encaminhado para tratamento psiquiátrico (vocês se lembram de que dias atrás os clérigos espanhóis propuseram ensinar nas escolas que homossexualismo é vício?).
Alguém se esqueceu de avisá-los que qualquer um pode ser promíscuo, independentemente de sua hétero ou homossexualidade. Esqueceram-se também de alertá-los sobre as outras vias de infecção pelo vírus, que não a sexual. E mais coisas foram esquecidas: algumas noções de direitos humanos, de cidadania, de respeito ao próximo… Ao longo da História, a Igreja Espanhola tem se esquecido de muitas coisas, oportunamente.
Mas bizarrice se combate com bizarrice, e a história vai por esse caminho. O padre Torres, além de afirmar que tudo isso é calúnia (“Tenho uma amizade normal com este menino. Este foi o único dia que eu estive com ele. Tiramos uma foto de nós mesmos, sem camisas, e foi isso que deu origem à confusão.”), propôs uma solução no mínimo estranha aos seus superiores: para provar que não é gay, ele pediu que a circunferência de seu ânus fosse medida, “para ver se está dilatado”. Argumentou que isso é uma prática comum na terapia de pessoas que deixaram de ser gays. Fico aqui me perguntando se a Igreja Espanhola merecia resposta melhor… provavelmente não.
Imagina se a moda pega? Sendo já famosa pela invenção de aparatos para regular o comportamento das pessoas (Inquisição Espanhola, oi?), a Igreja da Espanha bem que poderia lançar agora uma nova ferramenta, especializada em medir o ânus de suspeitos do crime da homossexualidade. Sim, a invenção contraria todo o bom senso e todos os preceitos defendidos pela ONU. Mas convenhamos: não seria a primeira vez que o bom senso seria ignorado em se tratando de fé, gays e celibato.
Enquanto esperamos pelo desfecho dessa história, vale lembrar que os fiéis mantêm-se ao lado do controverso padre Torres e seu seminarista, tendo feito inclusive um abaixo-assinado para que Torres volte à paróquia.
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