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Ontem e hoje
Conversa (des)afinada.
Alexandru Solomon

Resumo:
Os leitores perspicazes podem imaginar como, para os demais, é solicitado um esforço de imaginação.

Todo mundo conhece ou deveria conhecer a saga da volta de Napoleão do exílio da ilha de Elba, para dar início ao episódio final do seu reinado, conhecido como os 100 dias. Não é o caso de voltar ao assunto, a não ser contar duas anedotas, que tem algo a ver com os dias de hoje.
É comum ouvir a expressão: “Foi assim que Napoleão perdeu a guerra”, aludindo a uma postura esteticamente pobre, que não cabe descrever. O que é menos sabido é que naquele fatídico 18 de junho de 1815 – dia da batalha de Waterloo –, o imperador amanheceu com uma violenta , digamos assim, indisposição estomacal. E à la guerre, comme à la guerre – como diria Jerôme Valcke, autor de uma frase cheia de conteúdo, mas chega de divagações – Napoleão teve de resolver esse incômodo problema. Os leitores perspicazes podem imaginar como, para os demais, é solicitado um esforço de imaginação. Como a batalha não poderia ser adiada, mediante apresentação de certificado medical, com direito a afastamento a mando de um médico do INSS, coube ao ‘bravo entre os bravos’ como Napoleão chamava o marechal Ney, chefiar as operações. Não tendo o talento do chefe, sendo em relação a Napoleão apenas o que o Vacarezza representa em relação ao Nosso Guia Luminoso, comprometeu – e não por falta de bravura – o destino da batalha. Quando Napoleão retomou as rédeas da operação, já era tarde. O atraso da chegada das unidades do marechal Grouchy foi fatal. Quem chegou foi o exército prussiano de Blücher e a sorte pendeu para o lado dos aliados. A expressão esperar Grouchy e encontrar Blücher ainda faz fortuna nas fileiras da zelite francesa. Algo como esperar uma CPMI obliteradora de mensalão e ter pela frente... bem, chega disso.
A outra anedota prometida, tenho certeza que falei em duas, se prende à repercussão na imprensa francesa de então, fiel aos Bourbons – nada a ver com o nosso PIG – da volta de Napoleão.
Foi possível ler à medida que, sem dar um único tiro, o imperador chegou à capital.
O ogro corso desembarcou no golfo Juan.
O devorador de homens está em Grasse.
O usurpador chegou a Grenoble.
Bonaparte está em Lyon.
Napoleão aproxima-se de Fontainebleau.
Sua Majestade Imperial está sendo aguardada na sua Paris fiel.
O que tem a ver isso com nossa atualidade? Prestem atenção que por aqui se deu o caminho inverso. As manchetes seguiram mais ou menos esse roteiro:
CPMI investigará as atividades do empresário ligado ao jogo do bicho Carlos Augusto Ramos...
Novas denúncias cercam o bicheiro Carlinhos Cachoeira.
Na CPMI o contraventor Carlinhos Cachoeira se cala e irrita os participantes.
Ontem e hoje... se non è vero...


Biografia:
Alexandru Solomon nasceu em Bucareste (1943), mas vive no Brasil desde os 17 anos. Ao lado de uma sólida carreira empresarial, de uns tempos para cá passou a se dedicar a uma nova paixão: a literatura. Através da sua escrita nunca deixa o leitor indiferente. Um contador de histórias na velha tradição, empregando recursos que vão mostrar ao mundo em que vivemos, algo que pudesse estar perdido. Preparem-se, portanto, para uma surpresa que virá atrás da outra. Pois, Alexandru Solomon, além de humor, vai mais fundo. Autor de ´Almanaque Anacrônico`, ´Versos Anacrônicos`, ´Apetite Famélico`, ´Mãos Outonais`, ´Sessão da Tarde`, ´Desespero Provisório` , ´Não basta sonhar`, ´Um Triângulo de Bermudas`, ´O Desmonte de Vênus`, ´Bucareste` (contos e crônicas) e ´Plataforma G`, além de vários prêmios nacionais e internacionais por sua escrita.

Este texto é administrado por: Celso Fernandes
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