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16/09 O que é literatura e tem ela importância?
Carlos Eduardo da Silva Ferreira

Resumo:
Reflexão: CULLER, J. Teoria literária: uma introdução. São Paulo: Beca Produções Culturais LTDA, 1999.

“Obras de literatura vêm em todos os formatos e tamanhos e a maioria delas parece ter mais em comum com obrar que não são geralmente chamadas de literatura do que com algumas obras reconhecidas como literatura.
     Durante vinte e cinco séculos as pessoas escrevem obras que hoje chamamos de literatura, mas o sentido moderno de literatura mal tem dois séculos de idade. Antes de 1800, literatura e termos análogos em outras línguas européias significavam “textos escritos” ou “conhecimento de livros”.

Certo tipo de atenção que poderia-se chamar de literária é o interesse pelas palavras.
Quando a linguagem é removida de outros contextos, destacada de outros propósitos, ela pode ser interpretada como literatura. Se a literatura é linguagem descontextualizada, cortada de outras funções e propósitos é também ela própria, um contexto, que promove ou suscita tipos especiais de atenção. Por exemplo, os leitores atentam para potenciais complexidades e procuram sentidos implícitos, sem supor, digamos, que a elocução está ordenando que façam algo.
Descrever “literatura” seria analisar um conjunto de suposições e operações interpretativas que os leitores podem colocar em ação em tais textos.
As narrativas literárias podem ser vistas como membros de “textos de demonstração narrativa”, elocuções cuja relevância para os ouvintes não reside na informação que comunicam, mas em sua “narratividade”. O que diferencia as obras literárias dos outros textos de demonstração narrativa é que eles passaram por um processo de seleção: foram publicados, resenhados e reimpressos, para que os leitores se aproximassem deles cm certeza de que outros os haviam considerado bem construídos e “de valor”. Os leitores presumem que, na literatura, as complicações da linguagem têm, em ultima analise, um propósito comunicativo e, ao invés de imaginar que o falante ou escritor não está sendo cooperativo, como poderiam ser em outros contextos de fala, eles lutam para interpretar elementos que zombam dos princípios de comunicação eficiente no interesse de alguma outra meta comunicativa.
A “Literatura” nos dá motivo para esperar que nossos esforços de leitura “valham a pena”
Os leitores tratam algo como literatura, quando eles encontram num contexto que a identifica como literatura: num livro de poemas ou numa seção de uma revista, biblioteca ou livraria.
Às vezes o objeto tem traços que o tornam literário, mas às vezes é o contexto literário que nos faz tratá-lo como literatura. Não podemos transformar em literatura qualquer fragmento de linguagem chamando-o de literatura. Nem toda sentença se tornará literária se registrada na página como um poema.
Podemos pensar as obras literárias como linguagem com propriedades ou trações específicas e podemos pensar a literatura como o produto de convenções e certo tipo de atenção.”

1. A literatura como a “colocação em primeiro plano” da linguagem

“Literatura é linguagem que “coloca em primeiro plano” a própria linguagem: torna-a estranha, atira-a em você- “Veja! Sou eu a linguagem!”.
A rima, marca convencional da literariedade, faz com que você repare no ritmo que estava ali desde o começo. Quando um texto é enquadrado como literatura, ficamos dispostos a atentar para o desenho sonoro ou para outros tipos de organização lingüística que, em geral, ignoramos.

2. Literatura como integração da linguagem

Em literatura há relações entre as estruturas de diferentes níveis lingüísticos: entre some sentido, entre organização gramatical e padrões temáticos.
Nem toda literatura coloca linguagem em primeiro plano, e a linguagem colocada em primeiro plano não é necessariamente literatura. Nela, é mais provável que procuremos e exploremos as relações entre forma e sentido ou tema e gramática e, tentando entender a contribuição que cada elemento traz para o efeito do todo, encontremos integração, harmonia, tensão ou dissonância.
Estudar algo como literatura é olhar, sobretudo a organização de sua linguagem, não lê-la como a expressão da psique de seu autor ou como o reflexo da sociedade que a produziu.”

3. Literatura como ficção

“A obra literária é um evento lingüístico que projeta um mundo ficcional que inclui falante, atores, acontecimentos e um público implícito ( um público que toma forma através de decisões da obra sobre o que deve ser explicado e o que se supõe que o público saiba).
As obras literárias se referem a indivíduos imaginários e não históricos ( Emma Bovary, Huckleberry Finn), mas a ficcionalidade não se limita a personagens e acontecimentos.
Pode ser que haja fortes ligações entre o que acontece com o falante ou narrador do poema [...]. Mas um poema escrito por um homem velho pode ter um falante jovem e vice-versa. E, notoriamente, os narradores de romances, os personagens que dizem “ eu” quando narram a história, podem ter experiências e emitir juízos que são bastante diferentes daqueles de seus autores.
Na ficção, a relação entre o que os falantes dizem e o que pensa o autor é sempre uma questão de interpretação. O mesmo ocorre com a relação entre os acontecimentos narrados e as situações do mundo. O discurso não-ficcional geralmente está inserido num contexto que diz a você como considerá-lo: um manual de instrução, uma notícia de jornal, uma carta de uma instituição de caridade. O contexto da ficção, entretanto, explicitamente deixa aberta a questão do que trata realmente a ficção.
A ficcionalidade da literatura separa a linguagem de outros contextos nos quais ela poderia ser usada e deixa a relação da obra com o mundo aberta à interpretação.”

4. Literatura como objeto estético

“Estética é historicamente o nome dado à teoria da arte e envolve os debates a respeito de se a beleza é ou não uma propriedade objetiva das obras de arte ou uma resposta subjetiva dos espectadores.
Para Immanuel Kant, o principal teórico da estética ocidental moderna, [...] objetos estéticos, tais como as pinturas ou as obras literárias, com sua combinação de forma sensorial (cores, sons) e conteúdo espiritual (idéias), ilustram a possibilidade de juntar o material e o espiritual. Uma obra literária é um objeto estético porque, com outras funções comunicativas inicialmente postas em parênteses ou suspensas, exorta os leitores a considerar a inter-relação entre forma e conteúdo.
      Os objetos estéticos, para Kant e outros teóricos, têm ” uma finalidade sem fim”. Há uma finalidade em sua construção: são feitos de modo que suas partes operem conjuntamente para algum fim. Mas o fim é a própria obra de arte, o prazer ocasionado pela obra, não algum propósito externo. Em termos práticos, isso significa que considerar um texto como literatura é indagar sobre a contribuição de suas partes para o efeito do todo mas não considerar a obra como sendo principalmente destinada a atingir algum fim, tal como nos informar ou persuadir.



5. Literatura como construção intertextual ou auto-reflexiva

Teóricos recentes argumentaram que as obras são feitas a partir de outras obras: tornadas possíveis pelas obras anteriores que elas retomam, repetem, contestam, transformam. Essa noção às vezes é conhecida pelo nome imaginoso de” intertextualidade “. Uma obra existe em meio a outros textos, através de suas relações com eles. Ler algo como literatura é considerá-lo como um evento lingüístico que tem significado em relação a outros discursos: por exemplo, como um poema que joga com as possibilidades criadas por poemas anteriores ou como um romance que encena e critica a retórica política de seu tempo.
O poema tem significado em relação à tradição que o torna possível.
[...] uma outra noção que é importante na teoria recente: a da”auto-reflexividade” da literatura. Os romances são, em algum nível, sobre os romances, sobre os problemas e possibilidades de representar e dar forma e sentido à experiência.
A intertextualidade e auto-reflexividade da literatura não são, finalmente, um traço definidor mas uma colocação em primeiro plano de aspectos do uso da linguagem e de questões sobre representação que podem também ser observados em outros lugares.
Quando tratamos algo como literatura, quando procuramos padrão e coerência, há resistência na linguagem; temos que trabalhar em cima disso, trabalhar com isso. Finalmente, a “literariedade” da literatura pode residir na tensão da interação entre o material lingüístico e as expectativas convencionais do leitor a respeito do que é literatura.
Na Inglaterra do século XIX, a literatura surgiu como uma idéia extremamente importante, um tipo especial de escrita encarregada de diversas funções. Transformada em matéria de instrução nas colônias do Império Britânico, ela encarregou-se de dar aos nativos uma apreciação da grandeza da Inglaterra e de envolvê-los como participantes agradecidos num empreendimento civilizador histórico. No plano doméstico, ela podia se contrapor ao egoísmo e materialismo fomentados pela nova economia capitalista, oferecendo às classes médias e aos aristocratas valores alternativos e dando aos trabalhadores uma baliza na cultura que, materialmente, os relegava a uma posição subordinada. Ela iria ao mesmo tempo ensinar apreciação desinteressada, proporcionar um senso de grandeza nacional, criar um sentimento de camaradagem entre as classes e, em última análise, funcionar como um substituto da religião, que parecia não mais ser capaz de manter a sociedade unida.
Em sua particularidade, os romances, os poemas e as peças se recusam a explorar aquilo de que são exemplares, ao mesmo tempo que convidam todos os leitores a se envolverem nas situações e pensamentos de seus narradores e personagens.”


Biografia:
Estudante de LETRAS na UNESP em Araraquara. Prof. no Cursinho Pré-Vestibular em Franca na Escola Estadual Torquato Caleiro.
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