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06/07 Discussões sobre o teatro grego antigo:
O teatro grego antigo: análise estrutural e considerações sobre métrica.
Carlos Eduardo da Silva Ferreira

Resumo:
Discutindo a organização no teatro grego antigo. Analisando a métrica nas tragédias.

Discussões sobre o teatro grego antigo:

O teatro foi uma das mais ricas formas de arte. A representação teatral originou-se e se desenvolveu a partir das Dionisíacas festas em honra ao Deus Dionísio, que incluiu o espetáculo de mímica, dança, música, poesia, etc.. Em Atenas, celebrava-se o culto de Dionísio, acontecimento muito apreciado pela população camponesa. Já as Grandes Dionisíacas eram as celebrações urbanas, quando se realizavam os famosos concursos entre autores dramáticos (cada participante concorria com três peças “Trilogia”).
A encenação das peças era feita exclusivamente por atores masculinos que usavam máscaras e representavam também personagens femininos, que deram origem às grandes obras do teatro ateniense. As Grandes Panateneias, em honra da Deusa Atena, eram celebradas de quatro em quatro anos, com concursos de música e canto, corridas de cavalos e outras competições desportivas; finalizavam com uma procissão que percorria a via sagrada, para oferecer à Deusa o manto luxuoso. Era a festa mais importante da Cidade-Estado de Atenas.
Do ponto de vista cultural, Atenas não era superada por nenhuma outra cidade grega. Lá viveram os maiores pensadores e artistas do mundo grego; alguns deles da própria humanidade. No período clássico, o teatro tornou-se uma manifestação artística independente, embora os principais temas permanecessem ligados à religião e à mitologia. Os dois gêneros básicos do drama teatral foram a tragédia e a comédia.

Mestres do espetáculo:
ÉSQUILO

Foi em Ésquilo que a tragédia
grega encontrou padrão e
qualidade literária. Árduo
defensor da democracia, lutou
na batalha de Maratona, perto de
Atenas. O dramaturgo era filho
de grande proprietário de terras e
teve acesso direto à vida cultural da cidade.
Escreveu 90 tragédias. Desse total, apenas seis foram conservadas.
Os Persas é uma desuas obras mais famosas.

SÓFOCLES
Filho de família rica, Sófocles
escreveu 123 espetáculos. A mais
conhecida de suas tragédias é
Édipo Rei. Trinta anos mais novo
que Ésquilo, Sófocles o derrotou
no festival de 418 antes de Cristo.
Mesmo com as disputas, os dois
poetas permaneceram amigos
até que Ésquilo deixou Atenas.
Para Sófocles, o sofrimento era
condição necessária para se
alcançar a nobreza.



EURÍPIDES

O teatro psicológico teve
origem em Eurípides. Instruído
pelos sofistas, o último dos
poetas trágicos era cético e
duvidava da verdade absoluta.
Ele explorava os pontos fracos
da mitologia. A relativização
dos valores éticos, a decepção
e as ambiguidades eram seus
     principais interesses. Escreveu
     78 tragédias, restaram 17 delas.
    Quatro foram premiadas.
              




O festival de teatro de Atenas e suas convenções
Tudo começou quando Pisístrato transferiu o antigo e rústico festival dionisíaco dos frutos para Atenas criando as Dionisíacas Urbanas. Outro festival mais antigo (Lenianas) também começou a incluir tanto concursos trágicos quanto cômicos.
As Dionisias Urbanas Começavam com vários rituais religiosos (procissões-cultos) até entrar na fase mais ligada propriamente ao teatro e aos concursos.
Dois dias eram reservados para as provas ditirâmbicas, um dia ás comédias, com cincos dramaturgos na competição; e três dias à tragédia. Seis dias eram devotados ao grande festival; cinco após 431 a.C. - com cincos apresentações diárias durante os últimos três dias - três tragédias e um "drama satírico" fálico pela manhã uma ou duas comédias à tarde. Três dramaturgos competiam pelo prêmio de tragédia, cada um com três tragédias e um drama satírico, sendo que as peças eram mais ou menos correlatas.
As peças eram cuidadosamente selecionadas por um funcionário público ou arconte que também escolhia o intérprete principal ou "protagonista”.
Imediatamente antes do concurso, a ordem dos concorrentes era determinada por sorteio e ao seu término, os vencedores, julgados por uma comissão também escolhida por sorteio, eram coroados com guirlandas de Hera.
Pesadamente paramentados, os movimentos dos atores trágicos, eram necessariamente lentos e seus gestos amplos.
Na verdade, devido as dimensões dos teatros, ao atores eram escolhidos por suas vozes. Os bons atores eram tão procurados que logo começaram exigir salários enormes e, quando o talento dramatúrgico se tornara escasso, a interpretação assumiu importância ainda maior que o próprio drama.
Tal como os atores, o coro apresentava-se com variados figurinos e usava máscaras apropriadas á idade, sexo e personalidade das personagens representadas. O coro também não cantava durante todo o tempo, pois algumas vezes usava a fala recitativa e até mesmo coloquial ao dirigir-se aos atores.
O uso do coro no teatro grego tinha por certo suas desvantagens, pois ralentava e interrompia as partes dramáticas da peça. Mas enriquecia as qualidades espetaculares do palco grego o que levou escritores a comparar a tragédia clássica com a ópera moderna.


As primeiras tragédias e a arte dramática de Ésquilo
As verdadeiras encenações do teatro ateniense estão irremediavelmente perdidas. Do trabalho de todos os dramaturgos que ganharam os prêmios anuais sobreviveram apenas as peças de Ésquilo, Sófocles, Eurípides e Aristófanes, e mesmo assim por apenas uma fração das suas obras.
Contudo, no caso de Ésquilo, as tragédias remanescentes estão bem distribuídas ao longo de toda a carreira e lançam luz suficiente sobre a evolução de seu estilo e pensamento.
Ésquilo é um mestre do pinturesco. Suas personagens são criaturas coloridas, muitas delas sobrenaturais, orientais ou bárbaras, e suas falas são abundantes em metáforas.
Sue progresso na arte deve ter sido extraordinariamente gradual, uma vez que as primeiras peças revelam grande preponderância de intervenções corais e apenas os últimos trabalhos mostram-se bem aquinhoados em ação dramática.
Seu primeiro trabalho remanescente, As Suplicantes, provavelmente a primeira peça de uma trilogia, ainda o mostra lutando com o drama coral.
Há maior interesse quanto ao segundo drama remanescente: Os Persas, escrito em 472 a.C. trata de um fato prático contemporâneo, e foi obviamente cunhada para despertar o fervor patriótico.
Ésquilo e o teatro grego
Ésquilo sustentava corretamente que suas tragédias eram apenas fatias do banquete de Homero. Com efeito a maioria das tragédias possui as qualidades homéricas no ímpeto de suas passagens narrativas e na estatura heróica dos caracteres.
Mesmo com os processos introduzidos por Téspis, as peças ainda não eram mais que oratórios animados, fortemente influenciados pela poesia mélica que exigia acompanhamento instrumental e pela poesia coral suplementada por expressivos movimentos de dança.
O teatro físico também se apresentava rudimentar e o palco tal como o conhecemos era praticamente inexistente.
Novamente no ponto em que os caminhos se dividem Ésquilo precisava escolher entre o quase ritual e o teatro, entre o coro e o drama. Mesmo tendo acentuada predileção pelo coro e pelas danças, Ésquilo trabalhou para aumentar as partes representadas: os "episódios" que, originariamente mereceram partes do drama mas simplesmente apêndices do mesmo. Um outro grande passo na evolução da tragédia foi a introdução do segundo ator.
É útil lembrar que as atores "multiplicavam-se" com o uso de máscaras além que efeitos de multidões podiam ser criados com o uso de participantes "mudos" ou do coro.
Ésquilo cuidava das danças, treinava os próprios coros, utilizava-se de recursos como as pausas demonstrando se excelente diretor e encenador, fazendo amplo uso de efeitos que atingiram um nível extremamente elevado considerando-se os escassos recursos técnicos da época.
Destaque merece o fato de Ésquilo criar os figurinos estabelecendo, para eles, caracteres fundamentais. Fiz de seus atores figuras mais impressionantes utilizando máscaras expressivamente pintadas e aperfeiçoando o uso do sapato de altas solas o coturno.
Chegar à introdução, mesmo que rudimental, de uma cenografia foi um passo que um gênio tão versátil deu com facilidade. A decoração do palco, ou seja a construção cênica tornou-se permanente junto a utilização de máquinas que conseguiram obtendo bons efeitos cênicos.

Sófocles, o Sereno
O dramaturgo feliz
Nascido em 495 a C, trinta anos após seu predecessor, desfrutou das comodidades de filho de um rico mercador e das vantagens de um belo corpo.
Era tão extraordinário por sua graça física que aos dezesseis anos foi escolhido para liderar o coro de meninos que celebrou a vitória de Salamina. Após doze anos mais despendidos no estudo e no treinamento, Sófocles estava pronto para competir com os dramaturgos já em exercício, e não foi outro senão Ésquilo quem perdeu para ele o primeiro prêmio. Esta primeira peça fio seguida por outras cem ou mais, dezoito das quais receberam o primeiro prêmio, sendo que as demais nunca ficaram abaixo do segundo.
Ator consumado, interpretava suas próprias peças. Apenas a relativa fraqueza de sua voz, levou-o a renunciar a profissão de ator. Foi também sacerdote ordenado, ligado ao serviço de dois heróis locais, Arconte e Esculápio: o deus da Medicina.
Em geral não associamos os artistas as altas finanças (Com exceção talvez de Ronald Reagan) mas Sófocles foi até mesmo diretor do Departamento do Tesouro.
Em suma, Sófocles foi o ídolo querido do povo de Atenas, pertencendo à longa linhagem de escritores que negam a teoria de que o gênio nunca pode ser reconhecido enquanto vivo.
Sua vida que durou por noventa anos, não revelou qualquer declínio de seus poderes.
            Sófocles era um poeta com uma pureza de expressão que não encontrou paralelo no teatro até que Racine começou a escrever peças para a corte francesa, vinte séculos mais tarde.
Uma narrativa afirma que Sófocles pretendia criar as pessoas tais como deviam ser, enquanto Eurípides as fazia tais como eram, mas devia referir-se a um período anterior que não é representado por qualquer das sete peças remanescentes nas quais nós fornece ampla evidência de possuir tanto a capacidade quanto o desejo de retratar as pessoas tais quais são.
Há dois tipos de sofrimento em suas tragédias - aquele que advém de um excesso de paixão e aquele que brota de um acidente. O mal produzido pelo homem é formado no molde fixo do caráter humano e o acidente decorre da natureza do universo. Embora Sófocles aceitasse oficialmente os deuses gregos, estes não afetavam sua filosofia.
No mundo sofocliano o homem deve esforçar-se para introduzir ordem em seu próprio espírito.
            Entretanto é acima de tudo na elaboração artística de suas tragédias que Sófocles cria a ordem, gosto e equilíbrio tão raramente encontráveis no mundo real.

A arte da dramaturgia de Sófocles
Como todo artista competente, é claro que Sófocles não chegou à sua estatura total repentinamente; experimento, tentou diferentes estilos e lutou diligentemente pela perfeição.
De início imitou a grandeza de Ésquilo, depois foi para o extremo oposto, adotando uma forma excessivamente lacônica e abrupta e, finalmente encontrou o meio-termo entre ao dois estilos, atingindo o método apaixonado e no entanto contido que caracteriza todas as suas últimas peças; as únicas que chegaram até a nós.
Seu progresso, porém, não ficou confinado ao estilo. Mesmo sendo verdade que não podia violar várias normas e/ou interdições como a eliminação do coro, Sófocles fez a melhor coisa que lhe restava, reduzindo-o ao mínimo e relegando-o ao segundo plano. Podia tomar estas liberdades e sentiu-se também livre para aumentar os limites das complicações dramáticas da peça.
Um primeiro passo dado por ele foi a adição de um terceiro ator interlocutor ao drama ático. Um segundo passo foi a abolição da forma trilógica.
Seu trabalho apresenta forte semelhança com a arquitetura e a escultura do seu tempo, que dava preferência a pequenos templos e estátuas de deuses não maiores que um ser humano bem proporcionado.
Nos detalhes de sua dramaturgia, Sófocles é igualmente um artesão difícil de contentar que calculava seus efeitos. Emprega ironia trágica ou contraste patético com grande habilidade e a efetividade do estratagema é mostrada no poderoso Édipo Rei. Mestre na nascente e difícil arte da caracterização, Sófocles é mestre consumado no artifício do suspense trágico do qual Édipo Rei é um exemplo supremo.

As peças de Sófocles
Através de vários léxicos e alusões, conhecemos os nomes de mais ou menos cem peças perdidas, atribuídas a Sófocles. A sobrevivência de uma legião de títulos e fragmentos também indicam que Sófocles escreveu algumas peças satíricas ou cômicas muito populares. A partir dos fragmentos recuperados, vários dos quais são de extraordinária beleza, vemos com nitidez absoluta que sua profundidade e lucidez quanto aos problemas do momento em que viveu não estavam restritos ao simples punhado de peças que permaneceu intacto.
A extensão dos poderes dramáticos de Sófocles só pode ser medida completamente nas tragédias integrais de que dispomos. Embora a caracterização das personagens seja sempre um traço primordial, sua obra remanescente pode ser convenientemente dividida em: três peças de caracteres - As Traquinianas, Ajax e Electra; um drama social - Antígona; um idílio - Filoctetes; duas tragédias do destino - Édipo Rei e Édipo em Colono.




Peças de caracteres
Uma das peças tardias, As Traquinianas é a mais fraca de todas pela falta de unidade desde que o interesse é dividido entre Dejanira e seu marido, e a peça usa mais do recurso narrativo do que costumamos encontrar na obra de Sófocles.
Mas a tragédia comporta um poderoso e comovente estudo da mulher ciumenta. Esta peça é desprovida de indagações cósmicas e sociais, deve muito de seu interesse exclusivamente à lúcida analisa das personagens de meia idade.
Mais eficaz é Ajax, uma tragédia anterior, penetrante análise de um soldado corajoso mas hipersensível, que é destruído pelo excesso de suas melhores qualidades. Rematando esse drama de caracteres, Sófocles cria outra de suas bem realizadas mulheres, a escrava Tecmessa. Sófocles revela assim terna visão e compreensão pela condição feminina.
Mas a maior contribuição de Sófocles ao drama de caracteres está em sua Electra, na qual trata o tema de As Coéforas de Ésquilo unicamente em termos da personalidade humana. Para Ésquilo o problema era ético, Sófocles resolve o problema moral e aceita o assassinato materno colocando-o na distante antiguidade. Tendo solucionado a questão ética, volta-se inteiro ao problema da personagem.
A caracterização nessa tragédia á parte de uma trama cuidadosamente elaborada girando ao redor da forma pela qual Orestes obtém acesso a Clitemnestra e Egisto. Dor e alegria alternam-se por toda a peça.

Um idílio grego
Filoctetes exibe o lado mais ameno de sua mestria artística, é uma tragédia apenas no sentido grego (devido à exaltada dramáticidade) ; não faz uso de catástrofe ao final e o espírito da obra é pastoral.
Frases cortantes sublinham os comentários de Sófocles sobre os caminhos do mundo: "A guerra jamais massacra o homem mau", e "Aos saqueadores jamais sopra um vento adverso". Mas a atmosfera dominante é de loucura e luz e o poeta nos assegura que a perversidade do mundo é compensada algumas vezes pela imaculada humanidade.
Entretanto, é significativo que Sófocles apenas tenha atingido sua plena estatura quando, ao invés de contentar-se com simples estudos de personagens e observações mais ou menos fugidas sobre o gênero humano, voltou-se para temas maiores, bem definidos. Há dois deles em sua obra remanescente: as relações do homem com a sociedade e os labirintos do destino.
Antígona e o drama social
Uma das mais grandes tragédias da literatura dramática é Antígona, escrita em 442, antes de qualquer dos textos de caracteres remanescentes. Sófocles dedica-se aqui a um conflito básico, as pretensões rivais do Estado e da consciência individual.
A questão fundamental á descobrir como estabelecer um termo médio entre esses princípios e evitar a catástrofe quer para o grupo quer para o indivíduo. Afora isso, a oposição ainda mais geral entre amor e ódio lança sua magia sobre toda a peça.
Sófocles não procura desviar o drama em favor de sua heroína, pois reconhece os direitos do Estado e do interesse público.
Embora Sófocles não se incline a resolver a disputa entre o Estado e a consciência individual, contentando-se simplesmente em observar que as consequências do conflito tendam a ser trágicas, o ímpeto de sua piedade e de sua caracterização de Antígona lança o peso da simpatia, ao menos quantos aos leitores modernos, para o lado da nobre moça.
Esta deslumbrante tragédia deixa em suspenso diversos problemas que não entregam com facilidade seu significado ao leitor casual.


A tragédia do destino - Édipo
A mesma batalha com um tema importante e difícil distingue as duas grandes peças que colocam o problema do destino.Usualmente o acidental é considerado um artifício barato e fácil na literatura dramática. Mas não é barato nem fácil em Édipo Rei. O acidente ocorre antes do início da peça e amarra as circunstâncias num nó que só poderá ser desatado após prolongada batalha. Além disso, felizmente, Sófocles estava à altura da tarefa. Es não podia esperar resolver o enigma do destino, ao menos conseguiu uma das incontestáveis obras-primas do mundo. E é novamente seu soberbo Dom para a caracterização que enriquece a simples mecânica da dramaturgia com vida, agonia e plausibilidade.
Como alguém que viu a vida "equilibradamente", segundo suas luzes pagãs recusou-se a codificar a existência do acidente na tragédia. Édipo é uma personagem superlativamente ativa, como se o dramaturgo ático tentasse nos dizer que o destino trabalha através do caráter da vítima. Com efeito o fado encontra forte aliado neste homem corajoso, nobre a de ótimas intenções, cuja única é o temperamento inflamável. Tanto suas virtudes quanto defeitos conspiram contra ele.
Sem ser moralmente responsável, Édipo é psicologicamente responsável pelos tormentos. Consequentemente é uma personagem dinâmica e um sofredor ativo; na verdade, é uma das figuras trágicas da literatura.
A estória de Édipo nos convida a descer às profundezas da antropologia e psicanálise modernas que foram intuitivamente perscrutadas pelos poetas desde tempos imemoriais. Somos relembrados dos impulsos anárquicos e incestuosos que complicam a vida do homem e se exprimiram em tantos tabus primitivos e neuroses civilizadas. Como toda obra de arte superior, esta tragédia tem uma vida dupla: aquela que expressa e aquela que provoca.
A sequência a esta tragédia, o sereno e encantador Édipo em Colono, escrito muitos anos mais tarde, é o Purgatório e Paraíso do Inferno de Sófocles. O problema do destino inexplicável colocado pelo Édipo Rei não é respondido no trabalho posterior. Mas pelo menos uma solução é indicada: O que o homem não pode controlar, ao menos pode aceitar; o infortúnio pode ser suportado com fortaleza e enfrentado sem sentimento de culpa. Édipo está purgado e curado. E com ele, nós que o seguimos aos abismos imergimos liberados e fortificados.
Logo após a apresentação de Édipo em Colono, em 405 Sófocles foi juntar-se à sombra de Ésquilo. No mesmo ano fatídico falecera também Eurípides e morreria a glória que era a Grécia, pois Atenas sucumbiria ao poderio militar de Esparta. Nenhum mestre da alta arte da tragédia floresceu em Atenas após a morte de Sófocles.

Eurípides, o Moderno
O homem barbado que vivia com seus livros numa caverna na ilha de Salamina era um estranho entre os homens de seu tempo. Dizia-se de Eurípides que passava dias inteiros sentado, a meditar, desprezava o lugar comum e era melancólico, reservado e insociável.
Nos cinquenta anos de teatro, durante os quais escreveu noventa e duas peças, conquistou apenas cinco prêmios, sendo o quinto concedido após sua morte. Permanente alvo dos poetas cômicos, especialmente de Aristófanes, tornou-se objeto das mais desenfreadas calúnias e zombarias.
Julgado por impiedade deixou Atenas totalmente desacreditado. A corte macedônica do rei Arquelau honrou-o. Mas apenas uns dezoito meses depois veio tragicamente a falecer. Eurípides é o exemplo clássico do artista incompreendido.
Sócrates colocava-o acima de todos os outros dramaturgos e jamais ia ao teatro senão quando Eurípides tinha uma de suas peças encenadas. Sófocles respeitava seu colega-dramaturgo, ainda que não aprovasse seu realismo.
A estória de Eurípides é a de um homem que estava fora de sintonia com a maioria. Era um livre-pensador, humanitário e pacifista num período que se tornou cada vez mais intolerante e enlouquecido pela guerra.
Se Eurípides era um acirrado crítico de seu tempo, podia contudo, assinalar com justiça que não fora ele quem mudara e sim Atenas. Rica, poderosa e cosmopolita em virtude de seu comércio e imperialismo, a Atenas de sua juventude ofereceu o solo adequado para a filosofia liberal que mais tarde experimentou dias tão negros.
Eurípides esteve estreitamente ligado à religião que mais tarde questionaria com tão ingrata perseverança. Foi um dos muitos livres-pensadores da Europa, criados numa atmosfera religiosa. Talvez uma certa ligação com religião seja sempre pré-requisito para o agnosticismo ativo.
Eurípides permaneceu suscetível aos valores estéticos da adoração religiosa até o fim de seus dias. Seu fascínio como dramaturgo está nesse dualismo entre o pensamento e a fantasia, entre emoção e a razão.
Os sofistas, que questionavam todas as doutrinas e ensinavam a hábil arte do raciocínio, o enfeitiçaram para sempre. Vários pensadores não convencionais que expunham diversas doutrinas racionalistas e humanistas imbuíram Eurípides de um apaixonado amor pela verdade racional. Foi a partir deles que o primeiro dramaturgo "moderno" desenvolveu o hábito do sofisma em seu diálogo e adotou uma perspectiva social que sustentava a igualdade de escravos e senhores, homens e mulheres, cidadãos e estrangeiros.
Quando Atenas se empenhou na luta de vida ou morte com a Esparta anti-intelectual, provinciana e militarista, acorreu em sua defesa não apenas como soldado mas também como propagandista que exaltava seus ideais.
Prolongando-se a guerra com Esparta e sofrendo Atenas derrota após derrota, o povo perdeu a predisposição para a razão e tolerância. Péricles, o estadista liberal, viu sua influência desaparecer, foi obrigado a permitir o exílio de Anaxágoras e Fídias e chegou mesmo a sofrer um impeachment. Um a um, Eurípides viu seus amigos e mestres silenciados ou expulsos da cidade.
Em meio a esses acontecimentos, Eurípides continuou a escrever peças que mantiam em solução os ensinamentos dos exilados, sendo pessoalmente salvo do banimento em parte porque suas heresias eram mais expressas por suas personagens que por ele mesmo e em parte porque o dramaturgo apresentava sua filosofia num molde tradicional. Em aparência era mais formal que o próprio Ésquilo.
O ateniense comum era abrandado por um final convencional, as sutilezas da peça podiam escorregar por suas mãos e seus sentidos exitavam-se com as doces canções e músicas. Eurípides pôde continuar em Atenas por longo tempo mesmo sendo considerado com suspeita e suas peças recebendo normalmente o segundo ou terceiro lugar dos vigilantes juizes do festival de teatro.
A estrutura artística desigual e muitas vezes enigmática de seu trabalho prova que foi grandemente cerceado por essa necessidade de estabelecer um compromisso com o público inamistoso. Suas peças frequentemente têm dois finais: um inconvencional, ditado pela lógica do drama e outro convencional, para o povo, violando a lógica dramática.
Se algumas vezes Eurípides comprou sua liberdade intelectual às custas da perfeição, a compra foi uma barganha em termos de evolução dramática. Enquanto brincava de cabra-cega com seu público, conseguiu criar o mais vigoroso realismo e a crítica social da cena clássica. O povo simples começou a aparecer em suas peças e seus heróis homéricos eram frequentemente personagens anônimos ou desagradáveis. Outras personagens homéricas como Electra e Orestes são até hoje casos caros à clinica psiquiátrica. Eurípides e o primeiro dramaturgo a dramatizar os conflitos internos do indivíduo sem atribuir a vitória final aos impulsos mais nobres.
A obra de Eurípides constitui, sem dúvida alguma, o protótipo do moderno drama realista e psicológico.
Eurípides poderia sem dúvida ter continuado a criar poderosos dramas pessoais ad infinitium. Mas a vida tornava-se cada vez mais complicada para um pensador humanista. Em 431, ano de Medeia, Atenas entrou em sua longa e desastrosa guerra com Esparta. Não era momento para um homem como Eurípides preocupar-se com problemas predominantemente pessoais.
Por certo, ao envelhecer, Eurípides pouco fez para granjear a favor de seus concidadãos. Na verdade, atormentavam-no ainda mais do que ao tempo em que escrevia seus mais amargos dramas sociais. Foi declarado blasfemo e sofista. Segundo o poeta cômico Filodemo, Eurípides deixou Atenas porque quase toda a cidade "divertia-se às suas custas".

Espaço teatral
Representações cênicas na Grécia antiga e clássica. Era apresentado num espaço circular que continha o altar de Dionísio, chamado de orquestra, onde o coro cantava e dançava e os atores representavam.
Os palcos (skene) eram no início muito simples; o público sentava-se em degraus de pedra em volta da orquestra. As apresentações tinham lugar durante o dia, ao ar livre. Uma notável tradição teatral cresceu em Atenas, onde tanto comédias quanto tragédias eram freqüentemente representadas nos ritos religiosos do festival de Dionísio. Os poetas apresentavam três tragédias (geralmente sobre temas diferentes) e uma peça satírica, mais leve. Ofereciam-se prêmios ao melhor poeta e o vitorioso recebia uma coroa de hera. Os relatos iniciais são obscuros, mas conta-se que o poeta ático Téspis (c.534 a.C.) deu o passo decisivo ao colocar em cena um ator cujo papel era conduzir o diálogo com o coro. O ateniense Ésquilo teria introduzido o segundo ator e Sófocles, o terceiro. Na comédia 'antiga' (por volta do século 5 a.C.), que só pode ser analisada através da obra de Aristófanes, constituída por paródias políticas, literárias e filosóficas intercaladas com sátiras pessoais, o coro volta a ter um papel importante. Depois do período de transição da comédia (c.400-320 a.C.) chega-se à comédia 'nova', que tem início no final do século 4 a.C., já então com características mais definidas graças à peça de Menandro (c.342-290 a.C.). O Homem Mal-Humorado, descoberta no século 20.










Entendamos a tragédia grega

No tempo em que os deuses do Olimpo assombravam o berço da civilização ocidental, a maior festa dos gregos era um grande concurso anual de teatro. As apresentações ocorriam no final do inverno, depois que as colônias de Atenas – a maior cidade-estado da Grécia – traziam a arrecadação dos impostos de guerra.
Três dramaturgos apresentavam peças, com duração de uma hora e meia cada, a uma plateia de 20 mil pessoas. A festa começava de madrugada, por volta das 5h, com a benção do sacerdote de Dionísio, deus do vinho e do teatro.
Os festivais trágicos ocorreram em 180 anos e tiveram três autores principais: Ésquilo, Sófocles e Eurípides. Cada um inaugurou um padrão estético para a tragédia, apesar de      apresentarem o mesmo viés contestador: alguns textos criticávamos ideais democráticos e belicistas de Atenas.
Os espetáculos abordavam assuntos de interesse coletivo. Havia riqueza de sons, mas pobreza em termos visuais. O figurino era uma adaptação das roupas de religiosos. O coro tinha de 12 a 15 componentes, que contracenavam com até três atores que se revezavam entre várias personagens. Os músicos do show ficavam ao lado do palco.
A apresentação era marcada também pela
disputa entre os produtores – famílias ricas que batalhavam para bancar o festival e ganhar prestígio na cidade. Muitas vezes, o espetáculo vencedor não era o melhor, mas o que tinha o produtor mais engajado. (Ideia: junção de futebol, missa e parlamento).











O Núcleo da Tragédia
Os elementos básicos da tragédia eram:
Coro
Composto por 12 ou 15 elementos, os coreutas. Após entrarem na orquestra, a área de dança no teatro, cantam e dançam nesse espaço. Estes dançarinos-cantores eram em geral homens jovens que estavam a ponto de entrar para o serviço militar após alguns anos de treinamento. Não eram portanto profissionais do teatro e daí a importância do tragediógrafo também como ensaiador do coro, muito embora os atenienses desde crianças fossem ensinados a cantar e dançar, cena representando uma parte do coro
O coro trágico quase não participa da ação, limintando-se apenas a comentá-la e expressando compaixão ou outros sentimentos pelos personagens. Algumas vezes também destaca o sentido religioso da ação e a intercalá-la com preces. Por outro lado, simboliza o grupo - cidade ou exército - cuja sorte está ligada aos personagens.
O movimento do coro possivelmente eram usados também artisticamente pelo tragediógrafo, que era ao mesmo tempo coreógrafo, para mostrar ao público as flutuações de relações de poder e as interações entre os caracteres.
De todos os elementos do teatro grego, o coro é sem dúvida o mais estranho para o público moderno. Foi na verdade o núcleo inicial do teatro grego, embora percebamos que sua função se enfraquece aos poucos durante todo o séc. V a.C. e seguinte, na exata medida em que os atores no palco tornam-se cada vez mais o centro da ação. Na evolução do teatro ocidental se transformará posteriormente em mero interlúdio musical entre os atos e finalmente desaparecerá, sendo ressuscitado modernamente pela ópera e sua descendente, a comédia musical.

Corifeu
É um membro destacado do coro que pode cantar sozinho.
Em geral temos 3 tipos de funções principais:
a)     exortar o coro à ação, a começar o canto;
b)     antecipar, ou resumir, as palavras do coro;
c)     representar o coro, dialogando com os atores.



Atores: representam deuses ou heróis. São em número muito reduzido. Na verdade, pode-se dizer que o teatro surge quando Téspis cria a figura do ator e ele passa a dialogar com o coro. Seu número sobe para dois e em seguida três, mantendo-se nesse patamar, mas podemos observar que a estruturação dos diálogos nas tragédias tende a se concentrar em dois atores apenas, sendo raras as cenas que apresentam um verdadeiro diálogo a três. É no diálogo entre atores que se concentra quase a totalidade da ação dramática.

Os três atores tinham nomes que revelam uma relação hierárquica:
protagonista: primeiro ator
deuteragonista: segundo ator
tritagonista: terceiro ator
Estrutura Formal da Tragédia grega
Passaremos agora a examinar a tragédia grega do ponto de vista da sua forma, quer na sua divisão em partes principais, que na ocorrência de cenas típicas, quer na sua estrutura métrica.
Antes de procedermos à exposição da tragédia enquanto uma estrutura formal, seria bom ressaltar que essa estrutura surge das peças que chegaram até nós e portanto a análise se ressente da maioria das tragédias que foram encenadas de fato em Atenas e das quais temos apenas informações indiretas. Portanto é extremamente problemática a proposição de uma estrutura geral que desse conta de todos os fenômenos observáveis. Exatamente por esse motivo é que há discordâncias entre os especialistas em como analisar formalmente tragédias concretas.
Por outro lado, essa é uma estrutura puramente abstrata. Nem sempre todos os seus elementos serão encontráveis em todas as tragédias conhecidas. Trata-se mais de um repertório de recursos formais que ou já estavam a disposição dos principais autores trágicos ou eles mesmos os criaram. É extremamente importante não esquecermos o aspecto criativo e inovador dos autores trágicos. Diferentemente da idéia que uma leitura equivocada da Poética de Aristóteles disseminou desde o Renascimento, não havia uma norma que não podia ser quebrada. O compromisso dos tragediógrafos, como dissemos antes, era vencer a competição agradando seu público e para isso usavam tanto o recurso da tradição quanto o da inovação.


As Partes Principais da Tragédia:
Prólogo
É a primeira cena antes da entrada do coro ou antes da primeira intervenção do coro. Trata-se de uma narrativa preliminar que visava introduzir o tema.
Pode estar ou não presente. Os dramas antigos (séc. VI a.C.) e alguns de Ésquilo começavam sem prólogo. ex: Os Persas, As Suplicantes.
No entanto, depois d'As Suplicantes não temos nenhum outro exemplo de introdução puramente musical nas tragédias, como deveria ser em seu princípio.

Tipos de Prólogo
Com apenas um ator, na forma de solilóquio ou monólogo
Agamêmnon, onde o solilóquio do vigia, que durante a noite espera o sinal da vitória em Tróia, nos antecipa tanto as circunstâncias da como o próprio clima ansioso e opressivo da tragédia.
Com mais de um ator
Cena aberta com diálogo e ação.
Prometeu Acorrentado, onde a peça abre pelo encadeamento de Prometeu por Hefesto, Poder e Violêcia e onde situa-se a peça espacialmente e nas suas circunstâncias. Também em Medéia ocorre esse tipo de prólogo com mais ação, no caso, através do diálogo entre a ama e o preceptor.

Párodo
Inicialmente era a entrada do coro cantando e dançando na orquestra, o espaço cênico em frente e abaixo do palco, como vimos. ex.: As Coéforas. Pode ser também a primeira ode do coro, pois este já estaria presente, em silêncio, desde o início da peça, mas é raro. ex.: As Eumênides.

Pode ser executado:
 por todo o coro, o caso mais freqüente; ex.: Agamêmnon
 por dois semi-coros em sucessão; ex: As Suplicantes, de Eurípides,
 pelos membros individuais do coro em falas rápidas, ex.: Eumênides.

Em lugar de um párodo cantado exclusivamente pelo coro, podemos encontrar em vários dramas um "diálogo lírico", isto é, musical, entre coro e atores. Por exemplo, no Prometeu Acorrentado, de Ésquilo.

Em outros autores também observamos esta escolha:

Sófocles
Electra, Filoctetes e Édipo em Colono.
Eurípides
Reso, Medeia, Troianas, Héracles, Helena, Electra, e Ifigênia em Áulis.

Depois de sua entrada, o coro, em geral, fica presente durante toda a peça. São poucos os casos de saída de cena. Apenas nas Eumênides, Ájax, Helena, Alceste e Reso. O canto de retorno da orquestra é chamado epipárodo.

Episódios ou Partes
São cenas no palco, entre os cantos corais, sejam estásimos ou diálogos líricos, em que participa no mínimo um ator.
Podiam variar muito de tamanho e importância. Além dos atores podem participar figurantes também. O figurante distingue-se do ator por não possuir falas.
Podem ocorrer diálogos de tipo ator-corifeu ou ator-ator em que predominam as narrativas. Os solilóquios, diferentemente do teatro posterior, são pouco freqüentes, pois o coro em geral está sempre presente depois do párodo. Um exemplo de solilóquio ocorre durante um episódio encontramos no Ájax, de Sófocles.
Em geral as falas dos atores durante os episódios são recitadas, não cantadas.
Em certos momentos, porém, as personagens podem ser levadas por suas paixões a uma performance musical, cantada. As partes cantadas nas tragédias podem ser percebidas pelas mudanças da métrica do verso em grego, com veremos mais a frente. Em traduções em geral são imperceptíveis.




A performance musical dos atores podia se dar de duas maneiras:

1.ª) com o coro, esses são os chamados "diálogos líricos ou musicais", em cenas de profunda emoção.
O "diálogo lírico" pode apresentar uma grande variedade de estrutura.

Quanto ao número de atores:
1 ator + coro: são em geral os mais antigos, em especial em Ésquilo, por exemplo no 1.º estásimo d'Os Persas, onde ocorre um diálogo lírico entre o mensageiro e o coro;
2 ou 3 atores + coro. ex.: Coéforas, Ájax.
Quanto a extensão da parte cantada
Diálogo lírico-epirremático: o coro canta, mas o ator recita. É o mais comum em Ésquilo; diálogo lírico propriamente dito: coro e atores cantam. É o mais comum em Sófocles e Eurípides.

2ª) sozinhos ("stage lirics"), na forma de solos ("monodias"), duetos, etc.
Com a diminuição do papel do coro aumentou seu espaço no drama, havendo uma transferência do interesse da "orquestra" para o palco.

Quanto ao nº de atores:

1 ator
"monodias" (= solos). É uma das mais salientes características nas cenas de violenta paixão de Eurípides;
2 ou mais atores
Diálogos musicais entre 2 ("duetos") ou 3 atores. Também muito freqüentes em Eurípides.

Quanto a extensão da parte cantada:
Completamente musicais;
parcialmente musicais, um ator canta e o outro responde recitando.
O coro pode também fazer uma intervenção musical isolada dentro de um episódio, mas não temos certeza se o coro inteiro cantava ou apenas uma parte dele. ex.: Prometeu Acorrentado, 4º episódio. Nestes casos a extensão do coro é pequena dentro do episódio.
O número dos episódios não era fixo, variava de 4 (ex.: Persas) a 7 (ex.: Édipo em Colono), mas frequentemente eram 5.

Estásimos
Eram os cantos e danças do coro na "orquestra" que separam os episódios, marcando pausas na ação. Seu número é variável, de 2 a 5, em geral. A "dança" podia se restringir a uma gesticulação enfática e era de caráter grave e trágico.
Às vezes o coro podia apresentar um canto e dança mais vivaz, o hipôrquema, em geral colocado antes da cena de catástrofe, para intensificá-la.
Em lugar do estásimo cantado exclusivamente pelo coro poderiam ocorrer "diálogos líricos" com atores, como definidos acima no caso do párodo. No final de um episódio é muito comum a saída de atores para a skene, de forma a trocar de roupas e máscaras durante o estásimo, aproveitando esta pausa na ação.

Êxodo
Inicialmente, como indica o seu nome, era simplesmente a saída do coro cantando e dançando ao final da peça, como por exemplo n´As Suplicantes e n´As Eumênides. Posteriormente, com a diminuição gradual do papel do coro, passou a ser a última cena depois do último estásimo e que termina o drama. ex.: Agamêmnon.
Esta diminuição do papel do coro no êxodo pode ser de 2 formas: em primeiro lugar podia terminar o drama em um "diálogo lírico" entre coro e atores (ex.: Persas), ou em alguns versos finais do corifeu. Poderia haver nesta última cena uma fala final de um deus que seria o epílogo, mais comum em Eurípides.
Assim teríamos a seguinte arquitetura geral, mais comum, da tragédias gregas principalmente no séc. V a.C.:
PRÓLOGO (que faltava nas tragédias mais antigas)

PÁRODO
1º EPISÓDIO
1º ESTÁSIMO
2º EPISÓDIO
2º ESTÁSIMO
3º EPISÓDIO
3º ESTÁSIMO
4º EPISÓDIO
4º ESTÁSIMO
5º EPISÓDIO
ÊXODO

As Cenas Típicas na Tragédia
Por sua recorrência, algumas cenas se destacam nas tragédias gregas e são tão típicas do gênero quanto o é uma cena de perseguição em um filme de ação.
São elas:
Catástrofes: cenas de violência, em geral oculta dos olhos da platéia e narrada posteriormente por um ator, como Os Persas, que narra a destruição da expedição contra os gregos. Representa a reviravolta para pior no destino de uma personagem. Na peça Agamêmnon, por exemplo, o seu assassinato por Clitemnestra. Em Édipo, a cena final, onde o protagonista aparece em cena com os olhos perfurados e sangrando.
Cenas patéticas: cenas de explicitação de sofrimento, dor, em cena. Por exemplo, as cenas em que Electra dá vazão a sua dor pela morte do pai e pela situação humilhante a que a obriga a própria mãe.
Agón ou cenas de enfrentamento: cenas onde, por ações ou por palavras entre personagens, se explicita o conflito trágico no palco. Exemplos seriam o diálogo entre Clitemnestra e Orestes antes da cena de catástrofe, onde Clitemnestra é morta pelo próprio filho n'As Coéforas, ou em Édipo Rei, na cena que Édipo discute violentamente com o adivinho Tirésias anagnórisis ou cenas de reconhecimento: é a passagem da ignorância para o conhecimento. Uma personagem descobre-se parente, amigo ou inimigo de outro. Pode ser também a descoberta de algo que se fez ou não. O exemplo clássico de cena de reconhecimento é a descoberta de Édipo como assassino do pai e esposo da mãe em Édipo Rei. O reconhecimento em si pode se dar por várias formas, uma muito usada é a através de sinais exteriores, como quando Electra reconhece seu irmão.
Orestes por uma roupa que usa. Observe-se que não se trata de uma cena em que o público toma conhecimento de algo. É a personagem que toma consciência de algo, que não é trivial, mas significativo para o seu destino.
Essas diferentes cenas integram a estrutura da tragédia grega, como que recheando a arquitetura básica das partes.
A seguir veremos como esta estrutura se mostra em um exemplo concreto, a tragédia Édipo Rei, de Sófocles. As partes cantadas estarão em verde para que se torne mais visível a dinâmica das recitações e cantos. As cenas típicas estarão em vermelho.

PARTES DIÁLOGOS CENAS
PRÓLOGO
diálogo Édipo-sacerdote
diálogoCreonte-Édipo
PÁRODO entrada do coro, constituído por anciãos
1º EPISÓDIO diálogo Édipo-corifeu diálogo Édipo-Tirésias  cena de enfrentamento
1º ESTÁSIMO coro canta
2º EPISÓDIO diálogo Creonte-corifeu
diálogo Édipo-Creonte
diálogos Jocasta-Creonte-Édipo-corifeu
diálogo corifeu-Jocasta
diálogo Jocasta-Édipo -> cena de enfrentamento

Cena de reconhecimento (parcial)
2º ESTÁSIMO coro canta
3º EPISÓDIO diálogo mensageiro-Jocasta diálogo Édipo-Jocasta-mensageiro
3º ESTÁSIMO hipôrquema
4º EPISÓDIO diálogo Édipo-corifeu-pastor
diálogo Édipo-pastor
diálogo mensageiro-pastor -> cena de reconhecimento (total)
ÊXODO diálogo criado-corifeu
suicídio de Jocasta e auto-flagelamento de Édipo
diálogo corifeu-Édipo
intervenção musical do coro
diálogo Édipo-Creonte -> cena de catástrofe



A Versificação na Tragédia:
As formas métricas nas tragédias gregas são mais numerosas e intrincadas do que em qualquer outra literatura dramática, o que torna impossível reproduzi-las em qualquer língua moderna.
Podemos dividir os versos nas tragédias segundo apresentem ou não estrutura estrófica.
Vejamos em primeiro lugar os versos não-estróficos, o chamado padrão esticométrico.
A esticometria ocorre também em outros gêneros literários, como por exemplo na poesia épica de Homero e Hesíodo, onde sucede-se de forma ininterrupta, do início ao fim dos poemas, o mesmo tipo de verso, no caso, o hexâmetro datílico. Na tragédia o padrão esticométrico se restringe a certas partes como no diálogo entre personagens. É a versificação mais simples que aparece.
No drama primitivo o tipo de verso nessas passagens era o tetrâmetro trocaico, um verso livre e rápido que apresenta a seguinte estrutura:
Tetrâmetro trocaico:
Observação: quanto à notação utilizada:
_ = sílaba longa
U = sílaba breve
x = sílaba longa ou breve

Em geral, _ = UU
Ou seja, uma sílaba longa equivale a duas breves.
A medida que o tema da tragédia foi ficando mais sério, foi menos empregado. Nas peças que chegaram até nós ele é utilizado em duas cenas Os Persas, de Ésquilo, e às vezes nas conclusões. Eurípides em suas últimas peças, procurando novidades, ressuscita este tipo de verso, especialmente em discussões violentas. Sófocles, talvez por influência de Eurípides, também o utiliza em suas últimas peças.
Com o desuso dos tetrâmetros, eles foram substituídos pelos trímetros iâmbicos, o verso mais usual do diálogo falado.
Segundo Aristóteles, o trímetro iâmbico era o verso que mais se aproximava da fala comum.
Sua estrutura é a seguinte:
Trímetro iâmbico
Observamos um uso mais regular desse verso em Ésquilo. Sófocles começa já a relaxar, evitando a monotonia do ritmo e introduz a divisão do verso entre dois atores:
Quebra de verso
Eurípides por sua vez levou a irregularidade quase até a prosa. Em suas peças os versos são repetidamente quebrados.
Também podemos observar o padrão esticométrico nos recitativos. Neles o tipo de verso utilizado era o dímetro anapéstico ou anapesto, ritmo de marcha usado pelos autores mais antigos para a entrada do coro. Sua estrutura é a seguinte:
Dímetro anapéstico
Observação: o sinal longo sobre 2 sílabas breves indica que poderia ocorrer nesta posição ou uma sílaba longa ou duas breves.
Eram muito usados nos "diálogos líricos" para contrastar duas emoções, por exemplo em um diálogo coro-ator em que o coro canta e o ator recita anapestos. Este tipo de combinação entre parte cantada e parte recitada pode ser observada na tragédia
Medéia, onde aos cantos dolorosos do coro, Medéia contrapõe um recitativo em anapestos comentando seus gritos.
Passemos agora a examinar a versificação na porção musical da tragédia. Devido a íntima conexão entre música e poesia para os antigos, há uma maior variedade de versos em cenas, que em geral são de intensa emoção. Via de regra, temos a correspondência entre uma sílaba e uma nota musical.
Na poesia grega, já havia uma grande tradição de música coral, na forma de hinos, odes de procissões, etc., especialmente entre os dórios e por isso o dialeto dórico se tornou o dialeto literário por exelência do canto coral. Essa tradição passou à tragédia grega especialmente nas partes cantadas pelo coro, mas houve uma adaptação no sentido da redução da extensão dos versos, simplificação das estrofes e menor correspondência entre estrofe e antístrofe.
A estrutura estrófica, do grego strophé, "volta", seria o caso em que determinada combinação de diferentes versos se repete.
Assim, por exemplo, se utilizarmos letras minúsculas para identificar um tipo de verso, a seguinte sequência de versos apresentaria um padrão estrófico:
a
b
b
a
b
b
a
b
b

Na estrutura estrófica não só observamos padrões dentro de cada estrofe, mas as próprias estrofes podem se organizar de diferentes formas. No exemplo acima poderíamos chamar de estrofe A a sequência de versos abb. Logo teríamos uma estrutura de tipo A A A.
Na tragédia grega o padrão estrófico mais usual era haver a repetição da estrofe de um tipo e depois uma sequência de estrofes da mesma forma, como no esquema abaixo:
AA BB CC ...
Sendo que em cada grupo idêntico, AA por exemplo, o primeiro elemento era chamado de "estrofe", e o segundo, que a repetia, era chamado de "antístrofe".
Um exemplo da combinação de versos em estrofes seria:
Estrofe A: 2 trímetros iâmbicos
Antístrofe A: 2 trímetros iâmbicos
Estrofe B: 2 tetrâmetros trocaicos + 1 trímetro iâmbico
Antístrofe B: 2 tetrâmetros trocaicos + 1 trímetro iâmbico
Alguns tradutores indicam por símbolos na margem do texto as estrofes e antístrofes.
Vejamos agora que versos podiam ocorrer nos coros trágicos.
O tipo mais antigo de párodo começava com uma marcha solene cantada em anapestos. Este párodo anapéstico é encontrado nas tragédias Os Persas, As Suplicantes e Agamêmnon de Ésquilo, e Ájax de Sófocles. Foi posteriormente abandonado por uma estrutura mais lírica, mas pode reaparecer incluído, como na tragédia Antígona, de Sófocles. Como dissemos antes os anapestos podem também aparecer em diálogos líricos no recitativo do ator. Este caso é observado em Prometeu Acorrentado, de Ésquilo, Filoctetes e Édipo em Colono, de Sófocles, e Medeia de Eurípides.
Os anapestos podiam também começar os estásimos, como ocorre Os Persas, Sete contra Tebas e As Suplicantes, de Ésquilo, e também no Agamêmnon e na Medeia.
Os estásimos entretanto são o lugar previlegiado da forma antistrófica que apresenta a estrutura : estrofe - antístrofe - (epodo).
O epodo, que podia ou não ocorrer, era a terceira estrofe em uma tríade ou grupo de três estrofes, variando em construção métrica das duas primeiras, a estrofe e a antístrofe, mas sempre mantendo a sua própria forma. Se indicarmos o epodo por um E teríamos o seguinte exemplo: AAE BBE CCE DDE
No párodo da Medeia, podemos ver como em um diálogo lírico que envolve o Coro, Medeia e a Ama, Eurípides combina a estrutura estrófica com o recitativo.
Canto Coral na Medeia, de Eurípides
Párodo:
1ª estrofe (A): 12 versos cantados pelo coro
recitação de Medeia em 8 anapestos
1ª antístrofe (A): 12 versos cantados pelo coro
recitação da Ama em 8 anapestos
Epodo (E): 9 versos cantados pelo coro
Já no primeiro estásimo temos uma estrutura antistrófica muito mais simples cantada pelo coro sem epodo:                                           1ª estrofe (A): 7 versos
1ª antístrofe (A): 7 versos
1ª estrofe (B): 7 versos
1ª antístrofe (B): 7 versos
Mas aqui embora o número de versos seja o mesmo, o tipo de verso utilizado é diferente.
Além do epodo, outro enriquecimento da estrutura estrófica era o "efímnio", uma espécie de refrão que seguia estrofes e antístrofes.
Em Ésquilo em suas primeiras odes corais observamos até 10 pares de estrofes, já nas últimas apenas 3 pares compõe o canto coral, índice formal da diminuição da sua importância na arquitetura da tragédia.
Nestas estruturas estróficas eram utilizados os mais diferentes tipos de versos: dáctilos, iambos, troqueus, anapestos líricos, crético-peônio, docmíaco, eólico, jônico, etc., constituindo um todo ritmicamente complexo e variado que dava ao autor trágico infinitas possibilidades de combinação de modo a que o conteúdo de cada uma das partes alcançasse maior expressividade.
Infelizmente, toda essa riqueza formal, que constituia uma das partes mais importantes da carpintaria trágica é praticamente impossível de ser percebida. E mesmo que lêssemos as tragédias no original e escandindo os versos, isto é, obedecendo à métrica, ainda assim nos faltaria um dos elementos mais importantes da performance dramática, a música, que o tragediógrafo compunha, pois o coro verdadeiramente canta, não recita apenas, e como vimos os próprios atores em momentos de grande emoção tem partes cantadas.
O componente musical das tragédias gregas está praticamente todo perdido. Resta-nos apenas um pequeno fragmento de um estásimo da tragédia Orestes de Eurípides.
Esse conjunto de coro e atores, cantando e recitando, em um teatro com milhares de pessoas, cidadãos e estrangeiros, à luz do dia e dentro de um grande festival em honra a Dioniso que durava 6 dias, infelizmente para nós está completamente perdido. Mas a beleza e profundidade dos textos que chegaram até nós já nos dão uma idéia do que estas representações teriam sido.



Referências:

ANTUNES, C. L. B. Ritmo e sonoridade na poesia grega antiga. Uma tradução comentada de 23 poemas. São Paulo: FFLCH-USP, 2009 (dissertação inédita de mestrado em Letras Clássicas).

BAILLY, A. Dictionnaire Grec-Français. Paris: Chantraine, 1950.


LIDDEL, H. G.; SCOTT, R. A Greek-English Lexicon. Oxford: University Press, 1996.

MALHADAS, D.; NEVES, M. H. M. Antologia de poetas gregos: de Homero a Píndaro. Araraquara: Unesp, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Araraquara, 1976.

POUND, E. A arte da poesia. São Paulo: Cultrix, 1976. WEST, M. L. Introduction to Greek Metre. Oxford: Clarendon Press, 1987.

RAGON, E. Gramática latina: curso elementar. Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte: Livraria Francisco Alves, 1926. 208p.Tradução de Mário Bachelet.



Biografia:
Estudante de LETRAS na UNESP em Araraquara. Prof. no Cursinho Pré-Vestibular em Franca na Escola Estadual Torquato Caleiro.
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