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DOM COMETA, DE PERNA CAMBETA
Emil de Castro

Dom Cometa, de perna cambeta

Pai do Tempo amanheceu doente, naquele dia, e havia um disse-me-disse pelos corredores do Palácio de Cristal. Ninguém acreditava. Tanto que tia Estrelita, uma estrela de mais de 100 milhões de anos de idade, diz sempre que quando nasceu, Pai do Tempo já era daquela idade.
Acontece que a notícia tinha vindo do Palácio, e explodira como uma bomba no meio dos astros. Estrela Vésper estava num desassossego tremendo, não parava no lugar, correndo dum lado para o outro, dando saltos estranhos e acabou escorregando num mergulho interminável.
Os outros astros ficaram admirados com a proeza da estrela, mas não ligaram para o fato. É que hoje em dia se vê de tudo: até discos-voadores vinham da Terra incomodar a tranqüilidade do infinito.
Mas, afinal, que é que tinha sucedido no Palácio de Cristal, de tão grave, que ninguém podia passar pelo seu portão de entrada.
Que é que estava acontecendo?
- O senhor sabe, Dom Cometa, de perna cambeta?
Dom Cometa ficou vermelho com a intimidade do Vento-Sopro.
-     Não sei nada não! Olha aqui, exijo respeito comigo.
-     Deixa disso, Dom Cometa. É só brincadeira minha, não leve a mal.
Não gosto disso não, mas está bem. - Dom Cometa sacudiu a cabeça.
Vento-Sopro ventou de fininho e embarafustou-se pelo jardim afora, de costas, como era sua mania. Estrela Afobadinha, que vinha no mesmo caminho, quebrou o corpo para o lado, não adiantou. Vento-Sopro chocou-se contra ela, caiu, levantou-se assustado e soltou um grito.
Estrela Afobadinha nem acabou de chegar, foi falando, foi falando, repetindo:
-     Dom Cometa, Dom Cometa, que horas são? Que horas são?
Dom Cometa olhou o relógio do Palácio de Cristal, lá no alto da torre.
-     Sete horas!? – exclamou e perguntou ao mesmo tempo.
-     Sete horas? – indagou a Estrela.
-     Não, não é possível. Sete horas eu mandei os cometinhas para a escola.
Nisto que acabou de falar, os cometinhas entraram voando pela casa adentro, pisca-piscando as antenas de cometa. Dom Cometa nem pôde falar de tamanha surpresa.
-     O tempo parou!!!
-     O tempo parou!
-     Os três exclamaram ao mesmo tempo.
Pois bem, foi num fração de segundo que a casa levou para ficar cheia de dezenas de astros de muitas grandezas. Uma chuva de luz por todo lado, como se o jardim estivesse pegando fogo. Uma luz mais intensa no meio, se destacando das outras, na sua nobreza: Dom Cometa, de perna cambeta.
Pergunta daqui, pergunta de lá, pergunta de cima, de baixo de cabeça para baixo, de cabeça para cima, em pé, deitada, de lado, inclinada, às avessas, que todos os astros não podiam viver sem tempo no espaço.
Dom Cometa era o conselheiro do jardim, tinha que saber de tudo, senão para que conselheiro?
-     Isto mesmo, para que conselheiro?
-     Para que conselheiro?
-     Para que conselheiro?
Dom Cometa coçou a cabeleira, meio sério, remexeu-se na poltrona, transparente, de pó de prata, não disse a nem b, muito menos c ou d . Pensou um segundo. Pensou. Parou de pensar e decidiu:
-     Vou ao Palácio de Cristal!
Houve um movimento geral. Os representantes da classe celeste consultaram seus botões. Houve um alívio. Os cometas se acomodaram nos lugares. As estrelas sentaram-se no chão do jardim. Estavam resolvidos a esperar a resposta de Dom Cometa.
Dom Cometa entrou no Palácio de Cristal duma só vez. Não deu nem tempo aos sentinelas do portão de falarem. Na entrada do grande salão de diamante, foi recebido por Mãe do Tempo, que estava sentada num ponta de algodão de nuvem, muito calma, já à espera do conselheiro do jardim dos espelhos.
Dom Cometa contou tudo à Mãe do Tempo. Ela pegou o conselheiro pelo braço e o levou a um salão reservado somente aos sábios do espaço. Era um salão muito grande, de onde se via tudo que estava acontecendo no céu e nas milhares de terras que existiam no infinito.
Dom Cometa olhou para a Terra mais bonita. De lá via todos os países. Aí Mãe do Tempo apontou os países que não paravam de guerrear: parecia uma festa, onde se queimavam milhares de fogos de artifício.
Era noite. Dom Cometa, então, adivinhou o que estava acontecendo. O tempo tinha parado e a Terra não teve tempo de receber o novo dia. Por isso a guerra tinha virado uma festa, pois cada dia do espaço valia um mês do dia da Terra.
Dom Cometa, na sua humildade de cometa sábio do jardim dos espelhos, sorriu, e agradeceu bastante à Mãe do Tempo.
Pai do Tempo tinha resolvido acabar com todas as guerras do universo, e como a guerra na Terra não acabava nunca, inventou sua doença, para fazer o tempo parar por uns dias.
Como não tinha graça guerrear de noite, os países da Terra resolveram exterminar a guerra, e comemorar todos os dias, em cada país, o dia da paz universal.
No primeiro dia da festa, choveu ouro e prata e todo mundo ficou rico, até compreenderem que a riqueza era muito monótona.
Então, inventaram a brincadeira de ser pobre, pobre, rico, rico.
E tudo ficou em paz.



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