O FAZENDEIRO LOBISOMEM
João Carlos de Oliveira
Noite de Agosto, lua nova, céu límpido, sentados num banco de madeira no terreiro da nossa casa, café com biscoitos a vontade, entre um gole de café e outro, eu e meus irmãos mais novos, ouvíamos com atenção, o desfile de causos contados pelo nosso velho amigo e vaqueiro, Zé de Tiririca. Contava ele, que lá pelas bandas da Bahia, na região que ele havia nascido, era bastante conhecido de todos, a história de um fato verdadeiramente acontecido, que segundo relatos dos mais velhos, tudo acontecera numa fazenda de criação de gado daquelas cercanias. Pelo que soube, em certa fazenda da região, havia uma família de fazendeiros muito religiosos, composto pelo casal, mais três filhos, dentre os quais, dois filhos homens já refeitos. Ocorria entretanto, que todos os anos naquela fazenda, por época da semana santa, especialmente, no período da quaresma, o curral da fazenda era atacado por um cachorro preto, de tamanho enorme, visto por algumas vezes pelos membros da família, que acabava por atacar e pegar um dos bezerros das vacas de leite. Sabiam tratar-se de um lobisomem, entretanto, até aquela data, ninguém havia tido a coragem de enfrentá-lo. Geralmente, no dia seguinte aos fatos ocorridos, ainda bem cedinho, era contabilizado o prejuízo, a morte do bezerro era muito lamentada pelos membros da família, à exceção do dono da fazenda, que normalmente, se mantinha calado. Imediatamente ao fato ocorrido, a família não observava, más geralmente o dono da fazenda se apresentava doente, de cor amarelada, em estado febril, diarréias, etc, más recusava sempre ser levado aos médicos. Foi assim, de prejuízos em prejuízos, que o segundo filho mais velho da família, prometeu a si próprio, que os fatos ocorridos, não mais voltariam a acontecer na fazenda sem a sua intervenção - custasse o que custasse. O tempo ia passando, durante todo o ano, nada de novo acontecia, tudo caminhava sem novidades, as noites eram de calmaria. Entretanto o rapaz, preparava seus planos reservadamente, e não os revelava para ninguém. Uma das suas primeiras iniciativas , foi a compra de uma boa espingarda de dois canos. Assim, o tempo foi passando, Janeiro, Fevereiro, Márço....., o rapaz mantinha se coeso quanto ao seu planejamento, haveria desta vez, de surpreender ao lobisomem. Veio novamente a época da semana santa, e com ela o período de quaresma, ele estava preparado mentalmente, e mobilizava as forças e coragem do arrojo da sua juventude, para enfrentamento daquela fera. Foi assim, que uma vez iniciado a semana de quaresma, que todos os dias à noite, dando uma desculpa qualquer, se ausentava de casa, permanecendo até altas horas da madrugada a espera do lobisomem. Passou um dia - nada, passou o segundo dia - nada, ele não desistiu, sabia que a fera poderia atacar o curral de bezerros a qualquer noite daquelas. Permanecia armado com duas balas na agulha da espingarda, estava de tocaia, e não podia ser visto do ponto em que estava. No terceiro dia veio a surpresa, lá por volta da meia noite, ouviu o canto de uma ave de hábito noturno chamada de Rasga mortalha – seu coração bateu forte, podia-se ouvir também, o piado das galinhas nos poleiros, os cachorros da fazenda latiam, ele sentiu seu corpo tremer, más se manteve firme nos seus propósitos. De fato não tardou, logo após a visível inquietação das aves e animais, ele pode ver um enorme cachorro preto que se aproximava da sede da fazenda, cujos olhos vermelhos brilhavam como duas brasas de fogo, seguia na direção do curral dos bezerros. Retomado do susto inicial, reassumindo o seu auto controle, preparou-se para o pior. Empunhou a sua arma, e a posicionou para condição de tiro - já haviam duas balas na agulha. Não deu outra, quando o lobisomem tentava saltar a porteira do curral para atacar os bezerros, ele certeiramente, lhe desferiu o primeiro tiro, observando em seguida, que ao ser atingido, o animal deu um enorme pulo para cima, e ao cair no chão, quando já preparava para lhe desferir o segundo tiro, ouviu gritos e gemidos humanos, e ao aproximar-se da fera que agonizava, apesar da escuridão da noite, pode observar, para a sua grande surpresa e ao mesmo tempo, enorme tristeza, que na verdade, o lobisomem atingido, era o seu próprio pai. Encerrando a história, o velho Zé de Tiririca ainda nos contou, que ao socorrer o pai duramente ferido, o rapaz foi censurado sem piedade pelo próprio pai, que lhe reclamava, de lhe ter quebrado o seu encanto, prometendo-lhe ainda, diante das circunstâncias, até em matá-lo se caso sobrevivesse. Observei ao final da história, que meus dois irmãos mais novos tremiam de medo. Nesta mesma noite, dormimos os três na mesma cama.
Montes Claros, MG, 27/03/2010
João carlos de oliveira
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