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Cor ? Erva Doce
Juliana Sfair

Cidade, querida cidade de sol intenso, de calmaria, de bailes e moças que desfilam por suas ruas impecavelmente vestidas.
Abri minha sombrinha, olhei ao redor, empinei o nariz e caminhei pelo jardim até a porta principal da minha casa. Voltas e retornos á velha casa,saudades até do cheiro das cortinas da sala,aquela escrivaninha na biblioteca,a cadeira de balanço,tantas lembranças ao olhar para aqueles móveis e objetos.
Fui até a cozinha, a mesma fruteira ainda estava lá, o bule de café, xícaras de porcelanas com detalhes dourados, relíquias de mamãe.
Tudo milimetricamente em seus lugares, louças brilhando e ainda a deslumbrante toalha de renda que vovó trouxe de umas de suas andanças pelos paises Europeus.
Portugal era o preferido dela. Gostava das ruelas,da gastronomia,fez amigos eternos ali,do outro lado Atlântico.
Distância era um mero detalhe para aquela senhora de decisões firmes, sabedoria invejável e dona de uma postura elegante, cuja tamanha experiência em bons modos á tornou um referencial na cidade e muitas moças faziam aulas particulares com ela.
Tocava piano brilhantemente, apreciava a boa música, bons livros ainda mais quando acompanhada de um homem culto e gentil.
Vovô faleceu cedo, uma pneumonia crônica; e assim ficamos órfãos de todos seus conhecimentos de filosofia e sua maior paixão: Vinhos. Digo sem modéstia,mas um somelliere conceituado e respeitado.
Coleciono inúmeras lembranças e em cada passo e olhar por estes cômodos e corredores, passa um filme preto e branco de uma família clássica.
Requinte, minha querida!Essa é uma frase da qual nunca esquecerei. E não quero,tranquei no meu peito cada minuto,cada semana e ano que vivi aqui.
Agora que recordei uma pequena parte das alegrias, preciso subir as escadas que dão acesso aos quartos, quero surpreender mamãe com minha volta.
Uma mulher expcional de traços finos, cabelos castanhos claros, voz doce. Durante toda minha infância eu quis ser igual á ela e secretamente até melhor que ela.
Posso confessar que era uma obsessão em superá-la, mas felizmente fui adquirindo minha personalidade, meu estilo, gostos e desejos.
Papai é um homem ocupado, amante dos números e investimentos, atravessa madrugadas refazendo cálculos, preocupado com as oscilações do dólar, euros, libras. Um gênio, eu diria das ações e bolsas de valores.
E foi por causa das noites em claros dele, que viajei o mundo, conheci teatros, museus e castelos.
Aprendi línguas, costumes e dialetos. Morri,morri lentamente,após sentir meu coração bater descompassado,depois de flores nos nossos caminhos,cartas,encontros e um amor raro.
Quero esse sentimento raro para os meus dias de luto. Luto do amor,saudades da voz,do toque,do colo e das palavras poéticas que acariciavam meus ouvidos enquanto a chuva caía do lado de fora.
Quando essa vida mostra seu lado bruto e dolorido eu quero gritar, quero calar,preciso,preciso, nem sei do que preciso.
Preciso da minha sombrinha porque essa tempestade ameaça minha sanidade e não terá piedade dos meus sentimentos, me deixará louca vagando por estes paralelepípedos.
Ficarei submetida à bondade humana acolher em uma donzela, cujo requinte foi roubado pela cólera do amor cansado.
Estou afundando cada vez mais, tem lama nos meus sapatos, vejo rostos e corpos perdidos neste vale sombrio.
Procuro aquele homem, aquela voz das poesias que me encantava. Será que até a poesia essa lama conseguiu destruir?
Mãe vem me salvar! Está frio aqui, me perdi nos caminhos, não encontrei a paz que você dizia sobre os romances.
O romance arruinou com minhas alegrias, destruiu tudo o que de mais belo havia na minha imaginação.
E desta vez, percebo que não há quem possa me ouvir , me ajudar a levantar ou esquecer que um dia estive tão lúcida por fora, enquanto minha mente insistia em devaneios sem hora para acabar.

O jardim de inverno continua bem cuidado e charmoso, sigo em passos lentos em direção ao meu antigo quarto: paredes cor erva doce, e se não existir a cor erva doce, não vejo problema, porque se eu crio minhas cóleras e afundo nas minhas lamas, eu também descarto dores e invento cores.







Biografia:
Escritora de Gaveta/Blogueira/Atriz
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Publicações de número 1 até 4 de um total de 4.


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