No processo civil, as tutelas provisórias dividem-se em:
• Tutelas de urgência: evitar os malefícios do tempo = periculum in mora + fumus boni iuris, Nela incluem-se a tutela cautelar, que tem fim conservativo ou assecuratório de assegurar a efetividade do processo (ex: sequestro e arresto de bens); e a tutela antecipada, que tem fim satisfativo de assegurar a satisfação da pretensão (ex: alimentos provisórios, fornecimento de medicamentos).
• Tutela de evidência: fim satisfativo – forte probabilidade do direito = fumus boni iuris qualificado (ex: sanção ao abuso do direito de defesa ou propósito protelatório; prova documental sólida, tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou súmula vinculante).
No processo penal, em tese são admitidas apenas tutelas (de urgência) cautelares, que devem ter necessariamente fim conservativo ou assecuratório em relação ao processo (garantir que eventual provimento futuro seja útil e eficaz), não podendo ser satisfativas, antecipando os efeitos do provimento, em razão da presunção de inocência (não pode antecipar a punição).
No processo civil, existem processos cautelares antecedentes ao processo principal, que instauram uma relação processual autônoma; e medidas cautelares incidentais, no curso do processo principal. No processo penal, não existem processos cautelares, mas apenas medidas cautelares incidentais.
Quanto à legalidade das medidas cautelares pessoais, consideram-se apenas aquelas taxativamente previstas em lei (cautelares típicas). No processo civil, há um poder geral de cautela que permite ao juiz adotar medidas cautelares não previstas em lei – cautelares atípicas.
• Art. 297 CPC: o juiz poderá determinar as medidas que considerar adequadas para efetivação da tutela provisória.
• Art. 301 CPC: a tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para assegurar o direito.
No processo penal, não são admitidas cautelares atípicas que afetem a pessoa do investigado ou réu – sobretudo medidas que afetam a liberdade de locomoção.
Art. 7.2 CADH: ninguém pode ser privado de sua liberdade física, salvo pelas causas e nas condições previamente fixadas pelas constituições políticas dos Estados Partes ou pelas leis de acordo com elas promulgadas.
Ademais, segue-se a mesma ratio da legalidade penal: na perspectiva do indivíduo, a restrição de direitos é idêntica, independentemente da prisão ser pena ou medida assecuratória.
1. Espécies de medidas cautelares no processo penal
• Medidas cautelares pessoais: intervêm sobre a pessoa do investigado ou réu. Ex: prisão em flagrante, prisão temporária, prisão preventiva e medidas alternativas. As prisões cautelares (flagrante, temporária e preventiva) integram o gênero denominado prisão provisória, que se distingue da prisão-pena.
• Medidas cautelares reais ou patrimoniais: intervêm sobre o patrimônio do investigado ou réu. Ex: sequestro de bens imóveis e móveis, hipoteca legal e arresto de bens imóveis e subsidiário de bens móveis.
2. Características das cautelares penais
• Instrumentalidade hipotética: a medida cautelar é um instrumento para assegurar o provimento final, que resolve a questão de direito material (no caso, os resultados de eventual condenação). O processo penal é um instrumento necessário para efetivação do direito material (condenação e imposição da pena), de modo que a medida cautelar é um instrumento do instrumento.
• Acessoriedade: o provimento cautelar não é um fim em si mesmo, mas antes um acessório ao provimento principal.
• Preventividade: a medida cautelar tem finalidade de prevenir a ocorrência de um dano irreparável ou de difícil reparação (ex: repasse do bem produto do crime, fuga para o exterior). Contudo, nem toda tutela preventiva é cautelar: por exemplo, o habeas corpus preventivo é uma tutela preventiva, mas não é cautelar.
• Provisoriedade: seus efeitos são necessariamente provisórios, perdurando por certo tempo, até a superveniência de um outro evento – no máximo, o trânsito em julgado da sentença condenatória. Uma medida cautelar nunca pode durar para sempre (não é definitiva).
• Cognição sumária: o provimento cautelar não exige um juízo de certeza sobre o direito material (com superação da dúvida razoável), mas apenas um juízo de probabilidade do direito material e do perigo de dano – há uma limitação vertical ou de profundidade da cognição. Requisitos para a decretação das cautelares: fumus boni iuris + periculum in mora.
• Referibilidade: a tutela cautelar se refere sempre a um direito específico a ser acautelado, isto é, busca assegurar a pretensão punitiva relacionada ao fato que é objeto do processo em que decretada. Ex: em um processo em que o réu é acusado de furto, não se pode decretar uma prisão preventiva, porque ele está ameaçando testemunha de outro processo em que é réu, por calúnia.
• Proporcionalidade: a constrição causada pela cautelar deve ser proporcional à que pode ser causada pelo provimento final em sua qualidade, duração e execução. Uma medida instrumental não pode ser mais grave do que aquela que objetiva assegurar (ex: não se pode prender preventivamente quem não poderá ser preso após a condenação).
3. Prisão em flagrante
A prisão em flagrante é apenas um momento inicial de imposição de medida cautelar de prisão, que a princípio tem natureza administrativa (Polícia Judiciária) e depois é jurisdicionalizada. Tem por finalidades:
• evitar a consumação ou exaurimento do crime
• evitar a fuga do autor
• tutelar a prova da materialidade do crime e da autoria
É um ato complexo que se divide em prisão-captura, lavratura do auto de prisão em flagrante e prisão-detenção. Subsiste apenas entre a prisão-captura e a análise pelo juízo acerca da legalidade da prisão e da necessidade de conversão em prisão preventiva ou aplicação de outra medida diversa da prisão, e embora seja considerada pela doutrina tradicional como uma medida cautelar, parte da doutrina mais recente a considera, pelas suas características, uma precautelar.
3.1 Espécies (art. 301 CPP)
• Flagrante obrigatório: “autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito”.
• Flagrante facultativo: “qualquer do povo (...) poderá prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito”.
3.2 Situações de flagrante (art. 302)
• Flagrante próprio – incs. I e II: “está cometendo a infração penal” (presente) ou “acaba de cometê la” (passado imediato).
• Flagrante impróprio ou quase-flagrante – inc. III: “é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração”. “Logo após” significa que não pode haver solução de continuidade entre o crime e o início da perseguição, independente do tempo que esta dure (horas, dias).
• Flagrante presumido – inc. IV: “é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração”.
3.3 Classes de prisão em flagrante
• Flagrante preparado/provocado: a pessoa comete um crime porque foi induzida ou instigada por alguém (o agente provocador – normalmente um policial) a praticá-lo, para poder prendê-lo. Trata-se de crime impossível, o que corrobora a súmula 145 do STF: “Não há crime, quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível sua consumação”. Há ainda a súmula 567 STJ: “Sistema de vigilância realizado por monitoramento eletrônico ou por existência de segurança no interior de estabelecimento comercial, por si só, não torna impossível a configuração do crime de furto.”
• Flagrante esperado: a polícia, diante da informação de que um crime poderá ser praticado, toma providências e aguarda (comportamento passivo) para prender aquele que irá cometer o crime. Constitui crime – a polícia vigia, mas não provoca, o crime é praticado espontaneamente.
• Flagrante diferido/retardado: é uma autorização legal para que a polícia, com prévia autorização judicial, possa retardar a prisão, visando maior eficácia da investigação. Art. 8º, L. 12.850/2013: “Consiste a ação controlada em retardar a intervenção policial ou administrativa relativa à ação praticada por organização criminosa ou a ela vinculada, desde que mantida sob observação e acompanhamento para que a medida legal se concretize no momento mais eficaz à formação de provas e obtenção de informações.”. Semelhante é a entrega vigiada na Lei de Drogas (art. 53, II, da L. 11.343/2006).
• Flagrante forjado: é um falso flagrante, em que o policial forja elementos para realizar a prisão em flagrante (ex: plantar armas ou drogas). Constitui crime do agente policial: art. 23, L. 13.869/2019: Inovar artificiosamente, no curso de diligência, de investigação ou de processo, o estado de lugar, de coisa ou de pessoa, com o fim de (...) responsabilizar criminalmente alguém ou agravar-lhe a responsabilidade: Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. / Art. 339 CP: Dar causa à instauração de inquérito policial (...) contra alguém, imputando-lhe crime, infração ético-disciplinar ou ato ímprobo de que o sabe inocente: Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa.
3.4 Situações especiais de flagrante
• Flagrante em crimes permanentes: “Nas infrações penais permanentes, entende-se o agente em flagrante enquanto não cessar a permanência” (art. 303 CPP).
• Flagrante em crimes habituais: há posições distintas na doutrina e na jurisprudência, prevalecendo em precedentes antigos dos tribunais superiores de que é possível o flagrante.
• Flagrante em crimes continuados: o flagrante é admitido em relação a cada fato isolado, uma vez que o crime continuado é uma ficção jurídica (art. 71 CP).
• Prisão em flagrante nos crimes de ação pública condicionada e de ação privada: nessas hipóteses o inquérito não pode iniciar sem representação ou requerimento da vítima, respectivamente. A polícia não pode realizar prisão em flagrante sem representação (condicionada) ou requerimento (privada) do ofendido. O leigo, como não se lhe exige conhecimentos jurídicos, poderá efetuar a prisão-captura, mas o auto de prisão em flagrante não será lavrado e nem haverá prisão-detenção sem manifestação da vítima.
3.5 Procedimento e formalidades
A atribuição para a lavratura do auto de prisão em flagrante é da autoridade do local em que ocorreu a prisão-captura, ainda que o crime tenha ocorrido em local diverso. Art. 308: “Não havendo autoridade no lugar em que se tiver efetuado a prisão, o preso será logo apresentado à do lugar mais próximo”.
3.5.1 Lavratura do auto de prisão em flagrante:
Art. 304: “Apresentado o preso à autoridade competente, ouvirá esta o condutor e colherá, desde logo, sua assinatura, entregando a este cópia do termo e recibo de entrega do preso. Em seguida, procederá à oitiva das testemunhas [= da infração] que o acompanharem e ao interrogatório do acusado sobre a imputação que lhe é feita, colhendo, após cada oitiva suas respectivas assinaturas, lavrando, a autoridade, afinal, o auto”.
§ 2º “A falta de testemunhas da infração não impedirá o auto de prisão em flagrante; mas, nesse caso, com o condutor, deverão assiná-lo pelo menos duas pessoas que hajam testemunhado a apresentação do preso à autoridade”. [= testemunhas da apresentação]
§ 3º “Quando o acusado se recusar a assinar, não souber ou não puder fazê-lo, o auto de prisão em flagrante será assinado por duas testemunhas, que tenham ouvido sua leitura na presença deste”. [= testemunhas da leitura]
3.5.2 Apreciação pela autoridade policial:
Art. 304, § 1º: “Resultando das respostas fundada a suspeita contra o conduzido, a autoridade mandará recolhê-lo à prisão, exceto no caso de livrar-se solto ou de prestar fiança, e prosseguirá nos atos do inquérito ou processo, se para isso for competente; se não o for, enviará os autos à autoridade que o seja”. (se não houver fundada suspeita, lavrará o auto de prisão em flagrante, mas o autuado será solto).
Art. 304, § 4º: “Da lavratura do auto de prisão em flagrante deverá constar a informação sobre a existência de filhos, respectivas idades e se possuem alguma deficiência e o nome e o contato de eventual responsável pelos cuidados dos filhos, indicado pela pessoa presa”.
Art. 305: “Na falta ou no impedimento do escrivão, qualquer pessoa designada pela autoridade lavrará o auto, depois de prestado o compromisso legal”.
A não observância de qualquer formalidade torna o auto de prisão em flagrante nulo e, por consequência, a prisão é ilegal. Não gera nulidade, contudo, no processo dele decorrente.
3.5.3 Comunicação da prisão:
Art. 306: “A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada”.
§ 1º “Em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública”.
§ 2º “No mesmo prazo, será entregue ao preso, mediante recibo, a nota de culpa, assinada pela autoridade, com o motivo da prisão, o nome do condutor e os das testemunhas”.
Art. 309. “Se o réu se livrar solto, deverá ser posto em liberdade, depois de lavrado o auto de prisão em flagrante”.
3.5.4 Fato praticado na presença de autoridade:
Art. 307: “Quando o fato for praticado em presença da autoridade [=juiz ou delegado], ou contra esta, no exercício de suas funções, constarão do auto a narração deste fato, a voz de prisão, as declarações que fizer o preso e os depoimentos das testemunhas, sendo tudo assinado pela autoridade, pelo preso e pelas testemunhas e remetido imediatamente ao juiz a quem couber tomar conhecimento do fato delituoso, se não o for a autoridade que houver presidido o auto”.
3.5.5 Apreciação judicial da prisão:
Art. 310. Após receber o auto de prisão em flagrante, no prazo máximo de até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, o juiz deverá promover audiência de custódia com a presença do acusado, seu advogado constituído ou membro da Defensoria Pública e o membro do Ministério Público, e, nessa audiência, o juiz deverá, fundamentadamente:
I - relaxar a prisão ilegal (art. 5º, LXV, CF - a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária).
II - converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão.
III - conceder liberdade provisória, com ou sem fiança.
Art. 310, § 1º Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato em qualquer das condições constantes dos incisos I, II ou III do caput do art. 23 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento obrigatório a todos os atos processuais, sob pena de revogação.
Excludentes de ilicitude: estado de necessidade, legítima defesa e estrito cumprimento de dever legal ou exercício regular de direito.
Art. 310, § 2º Se o juiz verificar que o agente é reincidente ou que integra organização criminosa armada ou milícia, ou que porta arma de fogo de uso restrito, deverá denegar a liberdade provisória, com ou sem medidas cautelares - dúvida sobre a constitucionalidade: Presunção de inocência: “Insusceptibilidade de liberdade provisória quanto aos delitos elencados nos arts. 16, 17 e 18 [do Est. Desarmamento]. Inconstitucionalidade reconhecida, visto que o texto magno não autoriza a prisão ex lege, em face dos princípios da presunção de inocência e da obrigatoriedade de fundamentação dos mandados de prisão pela autoridade judiciária competente.” (ADI 3.112, 2007). Não há fundamento assecuratório concreto para decretação de cautelar: “não admite que a prisão preventiva seja amparada na mera gravidade abstrata do delito” (STJ, HC 616.535, 2020).
4. Prisão temporária
A prisão temporária está regulada pela L. 7.960/1989. Tem por finalidade evitar que o investigado dificulte a investigação em relação a crimes de maior gravidade, para que possam ser colhidos os elementos de informação necessários ao oferecimento da denúncia. Quanto ao momento da decretação, a prisão temporária só é cabível durante a fase de investigação, oferecida a denúncia, não será mais possível. Depois disso, se ainda for necessária a segregação cautelar, o MP deve requerer a prisão preventiva, que substituirá a temporária.
Há um rol taxativo de crimes que admitem a prisão temporária no art. 1º, III da L. 7.960/1989: a) homicídio doloso; b) seqüestro ou cárcere privado; c) roubo; d) extorsão; e) extorsão mediante seqüestro; f) estupro; g) atentado violento ao pudor; h) rapto violento; i) epidemia com resultado de morte; j) envenenamento de água potável ou substância alimentícia ou medicinal qualificado pela morte; l) quadrilha ou bando; m) genocídio (arts. 1°, 2° e 3° da Lei 2.889/1956); n) tráfico de drogas; o) crimes contra o sistema financeiro (Lei n° 7.492/1986); p) crimes previstos na Lei de Terrorismo.
4.1 Hipóteses de cabimento (art. 1º da L. 7.960/1989):
Para a prisão ser admitida, é preciso conjugar: inciso I ou II + inciso III
• Periculum libertatis: uma das seguintes hipóteses é necessária: imprescindibilidade para as investigações do inquérito policial (inc. I) - existência de risco de destruição de provas, ameaça a testemunhas, vítimas etc, ou se o indiciado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade (inc. II) - dificuldade de identificar do autor, localizar o investigado para participar de ato de investigação, risco de fuga etc.
• Fumus comissi delicti: é requisito necessário - houver fundadas razões de autoria ou participação do indiciado nos crimes do rol legal (inc. III).
4.2 Legitimados (art. 2º, caput):
A prisão temporária será decretada pelo Juiz com base na representação da autoridade policial, com prévia oitiva do MP ou no requerimento do Ministério Público. Se o juiz decretá-la de ofício ou a pedido da autoridade policial, sem oitiva do MP, a prisão será ilegal.
4.3 Separação do preso
Art. 3° “Os presos temporários deverão permanecer, obrigatoriamente, separados dos demais detentos”.
4.4 Prazo da prisão temporária:
A duração máxima da prisão temporária é de 5 dias, prorrogável por mais 5 (art. 2º), ou de 30 dias, prorrogável por mais 30, nos crimes hediondos e equiparados (art. 2º, § 4º, L. 8.072/1990). A prorrogação pode ocorrer uma vez, pelo mesmo período, “em caso de extrema e comprovada necessidade”. A decretação pode ser por menos do que 5 dias e a autoridade pode, considerando que a prisão se tornou desnecessária, solicitar a revogação (hipótese muito rara na prática).
Prazo de direito material (art. 2º, § 8º): inclui-se o dia de início (cumprimento do mandado), com soltura imediata pelo vencimento do prazo: § 7º “Decorrido o prazo contido no mandado de prisão, a autoridade responsável pela custódia deverá, independentemente de nova ordem da autoridade judicial, pôr imediatamente o preso em liberdade, salvo se já tiver sido comunicada da prorrogação da prisão temporária ou da decretação da prisão preventiva”.
4.5 Fundamentação da decretação:
A decretação de prisão temporária ocorrerá por decisão devidamente fundamentada (art. 93, IX, CF), em que será verificadas as hipóteses de cabimento: § 2° O despacho [= decisão] que decretar a prisão temporária deverá ser fundamentado e prolatado dentro do prazo de 24 (vinte e quatro) horas, contadas a partir do recebimento da representação ou do requerimento.
A decisão deverá indicar:
• O crime, que deve constar no rol do art. 1º, III
• As “fundadas razões” que o convenceram (em cognição sumária) da autoria e da materialidade
• A ocorrência de uma das situações de periculum libertatis constantes no art. 1º, I e II: justificar com base nos elementos de informação por que a prisão é imprescindível para a investigação ou de que o indiciado não tem residência fixa ou não esclareceu a identidade.
A decisão de prorrogação da prisão temporária exige demonstração de “extrema e comprovada necessidade” (art. 2º). Isso significa que a regra é a libertação após o término do prazo inicial, e apenas em hipóteses excepcionalíssimas, com reforço da fundamentação, poderá ser prorrogada.
4.6 Características da prisão preventiva e das medidas alternativas:
• Necessidade e adequação (art. 282): “As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a: I - necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais; II - adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado”.
Deve-se verificar se uma medida é, com base em elementos dos autos, efetivamente necessária em relação a um fim cautelar - a medida deve ser adequada (proporcional) à gravidade do fato e às condições pessoais. Havendo necessidade, deve ser utilizada sempre a medida menos gravosa capaz de atingir tal fim (a prisão é a ultima ratio), em uma “progressão aflitiva” (Cordero).
• Excepcionalidade da prisão preventiva: art. 282, § 6º: “A prisão preventiva somente será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar, observado o art. 319 deste Código, e o não cabimento da substituição por outra medida cautelar deverá ser justificado de forma fundamentada nos elementos presentes do caso concreto, de forma individualizada”.
• Proporcionalidade em relação à pena provável: a constrição causada pela tutela cautelar deve ser proporcional à que pode ser causada pelo provimento final em sua qualidade, duração e execução. Ou seja, a medida cautelar penal não pode ser mais grave do que a pena aplicável. A prisão cautelar somente poderá ser decretada se houver possibilidade de aplicação de pena privativa de liberdade (e sua execução deve observar o regime passível de aplicação).
O STJ denomina princípio da homogeneidade: “o condenado à pena privativa de liberdade, a ser cumprida em regime semiaberto, é assegurado, senão o recurso em liberdade, ao menos o direito de ser colocado de imediato no regime intermediário. Trata-se de ideia-força decorrente do princípio constitucional da proporcionalidade, visto que a prisão provisória, medida cautelar, nas circunstâncias, é mais gravosa que a reprimenda, finalidade precípua do processo penal.” (STJ, RHC 34226, 2012; recente RHC 134976, 2021). Em decisões recentes, o STJ entende que deve ter por base uma sentença em primeira instância ou a análise das penas cominadas em abstrato, não em um prognóstico da pena a ser concretamente aplicada (p. ex., AgRg no RHC 154705, 2021).
• Jurisdicionalidade e acusatoriedade:
Art. 283: “Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de prisão cautelar ou em virtude de condenação criminal transitada em julgado.
Art. 282, § 2º. “As medidas cautelares serão decretadas pelo juiz a requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público”.
• Contrariedade: em regra, deve haver contraditório prévio à decretação da medida cautelar. Aplica-se também em caso de revogação, substituição, reforço (ou acréscimo) e atenuação - art. 282, § 3º: “Ressalvados os casos de urgência ou de perigo de ineficácia da medida, o juiz, ao receber o pedido de medida cautelar, determinará a intimação da parte contrária, para se manifestar no prazo de 5 (cinco) dias, acompanhada de cópia do requerimento e das peças necessárias, permanecendo os autos em juízo, e os casos de urgência ou de perigo deverão ser justificados e fundamentados em decisão que contenha elementos do caso concreto que justifiquem essa medida excepcional”.
4.7 Momento para decretação (art. 311 CPP):
Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal. Badaró considera um contrassenso a prisão preventiva na investigação, pois se há prova da materialidade e indícios de autoria para a prisão preventiva (fumus comissi delicti), é porque há também justa causa para propor a ação penal.
4.8 Legitimidade para requerimento:
• Requerimento das partes: Ministério Público, querelante ou assistente de acusação.
• Representação da autoridade policial ao juiz: se o MP se opuser, o juiz não pode decretá-la.
4.9 Legitimidade para decretação:
Somente o juiz (ou relator, nos casos de competência originária dos tribunais) pode decretar a prisão preventiva, sempre a requerimento das partes, não podendo decretá-la de ofício (art. 311 e art. 282, § 2º).
4.10 Hipóteses em que pode ser decretada prisão preventiva
Deve ser realizada a análise de diversos elementos:
• Pressupostos (positivos) da prisão preventiva – art. 312, caput
Fumus comissi delicti (boni iuris): “prova da existência do crime e indício suficiente de autoria”. A lei exige certeza da materialidade e probabilidade de autoria.
Periculum libertatis (in mora): a decretação só pode ocorrer para “garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal (...), quando houver prova (...) de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado”.
Garantia da ordem pública: conceito indeterminado e muito controverso na doutrina e na jurisprudência. É comum encontrar decretações com base em critérios como “clamor público”, “comoção social”, “periculosidade do réu”, “insensibilidade moral do acusado”, “credibilidade da justiça”, “repercussão na mídia”, “preservação da integridade física do acusado”. Posição 1: entende que é inconstitucional, porque em verdade não tem finalidade cautelar, mas antecipatória da pena (PRADO, SANGUINÉ). / Posição 2: interpreta de forma ampla, entendendo que é cabível prisão preventiva para proteger o meio social, preservar a credibilidade das instituições e a crimes que geram clamor público. / Posição 3: interpretação restritiva, de modo que só é cabível em caso de “necessidade para (...) evitar a prática de infrações penais” (art. 282, I, in fine, CPP) – dominante nos tribunais superiores. Há precedentes do STJ entendendo que o risco de reiteração pode ser constatado com base (1) nos processos e inquéritos em andamento, em atos infracionais cometidos no passado pelo imputado (2) da gravidade em concreto do crime (modus operandi, quantidade e diversidade da droga apreendida). O STJ não admite, em geral, a consideração da gravidade em abstrato do crime e do clamor público.
Garantia da ordem econômica: conceito também indeterminado e muito controverso, foi adicionado pela L. 8.884/1994. Posição 1: defende a inconstitucionalidade, por não ter fundamento cautelar. / Posição 2: interpreta de modo semelhante ao conceito de “ordem pública”, dizendo respeito ao risco de reiteração de crimes que lesam a ordem econômica (“dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros” – art. 173, § 4º, CF). Crimes contra a ordem econômica: ordem tributária, sistema financeiro nacional, economia popular, propriedade imaterial, falimentares, lavagem de dinheiro etc. Art. 30, L. 7.492/1986: “Sem prejuízo do disposto no art. 312 do Código de Processo Penal (...) a prisão preventiva do acusado da prática de crime previsto nesta lei [Crimes contra o Sistema Financeiro] poderá ser decretada em razão da magnitude da lesão causada. O STF já decidiu que “o vulto da lesão estimada, por si só, não constitui fundamento cautelar válido” (HC 82.909, 2003); portanto, à magnitude deveria somar-se outros pressupostos do art. 312 CPP (HC 80.717, 2001).
Conveniência da instrução criminal: para quando o indiciado ou acusado atua de modo indevido em relação à obtenção de provas, p. ex., ameaça ou suborna testemunhas ou peritos, oculta ou destrói provas etc. – “necessidade (...) para a investigação ou a instrução criminal” (art. 282, I, segunda parte). É uma cautelar instrumental, que busca conservar os meios (provas) para obter o provimento final. O exercício de direitos não pode ser utilizado como justificativa (ex: postura não colaborativa, uso do direito ao silêncio, não comparecer a ato processual, recusar-se a fazer reconstituição etc).
Assegurar a aplicação da lei penal: no caso de o indiciado ou acusado tentar frustrar eventual condenação por meio de fuga. É uma cautelar final, pois objetiva assegurar a utilidade e eficácia do provimento. Deve haver elemento concreto que revele o propósito de fuga: diálogo interceptado, compra de passagem aérea para o exterior, desfazimento de bens imóveis, preparação para deixar o domicílio etc. Não basta morar na fronteira, dispor de fácil mobilidade para o exterior, ser estrangeiro regular etc. Não é suficiente a evasão do domicílio da culpa para evitar a prisão em flagrante ou para contestar uma prisão ilegal (STF, HC 89.501, 2006).
• Hipóteses de cabimento ou admissibilidade – art. 313
• Hipóteses de vedação (pressupostos negativos) – art. 313, § 2º e art. 314
Não pode ser decretada prisão preventiva “com a finalidade de antecipação de cumprimento de pena” ou “como decorrência imediata de investigação criminal ou da apresentação ou recebimento de denúncia”. Não será decretada se houver prova de que incide ao caso excludente de ilicitude (art. 23, I, II ou II, CP) – art. 314 CPP. Quanto às excludentes de culpabilidade, não há posição consolidada.
4.11 Periculum libertatis subsidiário:
A prisão preventiva que, a princípio era desnecessária, torna-se necessária pelo descumprimento de medida alternativa.
Art. 312, § 1º: “A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4º)”.
Controvérsia 1: mero descumprimento x progressividade (reforço pode ser suficiente) / Controvérsia 2: não é necessário observar as hipóteses de cabimento x é necessário
No tocante à fundamentação do periculum libertatis em fatos contemporâneos: o perigo à ordem pública, à ordem econômica, à instrução criminal ou à aplicação da lei penal deve ser deve ser fundamentado em fatos novos ou contemporâneos e devem haver elementos concretos, não bastam menção à gravidade abstrata do crime ou conjecturas.
Art. 312, § 2º. “A decisão que decretar a prisão preventiva deve ser motivada e fundamentada em receio de perigo e existência concreta de fatos novos ou contemporâneos que justifiquem a aplicação da medida adotada”.
4.12 Prisão domiciliar:
A prisão domiciliar é uma forma especial de cumprimento da prisão preventiva aplicável a determinadas situações regradas por lei.
Art. 317. “A prisão domiciliar consiste no recolhimento do indiciado ou acusado em sua residência, só podendo dela ausentar-se com autorização judicial”.
Art. 318. “Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for:
I - maior de 80 (oitenta) anos;
II - extremamente debilitado por motivo de doença grave;
III - imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 (seis) anos de idade ou com deficiência;
IV - gestante;
V - mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos;
VI - homem, caso seja o único responsável pelos cuidados do filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos.
Parágrafo único. Para a substituição, o juiz exigirá prova idônea dos requisitos estabelecidos neste artigo (o ônus da prova é do investigado ou acusado).
Prisão domiciliar às mulheres responsáveis por crianças ou deficientes – teve origem em decisão proferida pelo STF em julgamento de HC coletivo (HC 143.641, 2018):
Art. 318-A. A prisão preventiva imposta à mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência será substituída por prisão domiciliar, desde que:
I - não tenha cometido crime com violência ou grave ameaça à pessoa;
II - não tenha cometido o crime contra seu filho ou dependente.
Possibilidade de aplicação de medidas alternativas em conjunto com a prisão domiciliar: art. 318-B: “A substituição de que tratam os arts. 318 e 318-A poderá ser efetuada sem prejuízo da aplicação concomitante das medidas alternativas previstas no art. 319 deste Código”.
4.13 Revogação da prisão preventiva
Se deixarem de existir as razões que tornaram a prisão preventiva necessária, ela deverá ser revogada (ex: oitiva da testemunha cujo receio de ameaça motivou a prisão).
Art. 316: “O juiz poderá, de ofício ou a pedido das partes, revogar a prisão preventiva se, no correr da investigação ou do processo, verificar a falta de motivo para que ela subsista, bem como novamente decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem”.
É diferente do relaxamento, que se refere à prisão preventiva ilegal (art. 5 º, LXV): que não observa algum dos requisitos legais (ex: crime culposo ou com base na gravidade abstrata do crime). Mas pode haver relaxamento por ilegalidade superveniente, p. ex., por excesso de prazo.
4.14 Revisão periódica:
A prisão deve ser revisada a cada 90 dias para que se verifique se permanece necessária - art. 316, par. único: “Decretada a prisão preventiva, deverá o órgão emissor da decisão revisar a necessidade de sua manutenção a cada 90 (noventa) dias, mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal”.
4.15 - Mandado de prisão e seu cumprimento (arts. 285 a 300).
5. Audiência de custódia
5.1 Fundamento convencional:
• Art. 7.5 CADH. Toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercer funções judiciais e tem direito a ser julgada dentro de um prazo razoável ou a ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo.
• Art. 9.3 PIDCP. Qualquer pessoa presa ou encarcerada em virtude de infração penal deverá ser conduzida, sem demora, à presença do juiz ou de outra autoridade habilitada por lei a exercer funções judiciais e terá o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade. (...)
5.2 Decisão do STF na ADPF 347, 2015:
Estado de coisas inconstitucional do Sist. Penitenciário - AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA – OBSERVÂNCIA OBRIGATÓRIA. Estão obrigados juízes e tribunais, observados os artigos 9.3 do Pacto dos Direitos Civis e Políticos e 7.5 da Convenção Interamericana de Direitos Humanos, a realizarem, em até noventa dias, audiências de custódia, viabilizando o comparecimento do preso perante a autoridade judiciária no prazo máximo de 24 horas, contado do momento da prisão.
5.3 Fundamento legal:
Redação dada pela L. 13.964/2019 - art. 310: Após receber o auto de prisão em flagrante, no prazo máximo de até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, o juiz deverá promover audiência de custódia com a presença do acusado, seu advogado constituído ou membro da Defensoria Pública e o membro do Ministério Público (...)
5.4 Finalidades da audiência:
A audiência objetiva propiciar controle jurisdicional, pessoal e célere (“sem demora”) sobre a legalidade e necessidade da prisão e eventual violação de direitos do preso (especialmente violência policial ou tortura). Não se presta à produção de provas em relação ao crime (art. 8º, VIII, Res. 213/2015 CNJ).
5.5 Âmbito de aplicação:
O art. 310 CPP faz menção apenas à “prisão em flagrante”, enquanto que o art. 7.5 CADH: “toda pessoa detida ou retida”; art. 9.3 PIDCP: “qualquer pessoa presa ou encarcerada”. No art. 13 da Res. 213/2015 CNJ consta que se aplica a “pessoas presas em decorrência de cumprimento de mandados de prisão cautelar ou definitiva”. O STF determinou que se realize “no prazo de 24 horas, audiência de custódia em todas as modalidades prisionais, inclusive prisões temporárias, preventivas e definitivas” (Rcl 29303 AgR, 2023).
5.6 Ilegalidade da prisão pela não realização da audiência:
A prisão será ilegal se não houver realização em 48h (24h + 24h) e se não houver motivação idônea - art. 310, § 4º: “Transcorridas 24 (vinte e quatro) horas após o decurso do prazo estabelecido no caput deste artigo, a não realização de audiência de custódia sem motivação idônea ensejará também a ilegalidade da prisão, a ser relaxada pela autoridade competente, sem prejuízo da possibilidade de imediata decretação de prisão preventiva.” (Dispositivo flexibilizado no julgamento pelo STF da ADI 6.298, 2023).
5.7 Procedimento:
• O CPP não disciplinou de modo detalhado, continua aplicável a Resolução 213/2015 CNJ.
Autoridade responsável: juiz que atua no inquérito ou no processo em que decretada a prisão – será o juiz de garantias (art. 3º-B, II, CPP). Quando a competência originária for dos tribunais, pode ser por juiz designado pelo relator ou presidente.
• A audiência ocorrerá com presença obrigatória do preso, do membro do MP e de defensor, sendo vedada a presença de policiais responsáveis pela prisão ou investigação (art. 4º, caput e § único). O preso tem direito a contato prévio e reservado com defensor, sem a presença de policiais (art. 6º, caput e § único).
• Na audiência ocorrerá uma entrevista (não é chamado “interrogatório”) do preso pelo juiz e posteriormente será dada palavra às partes (MP e depois defesa, nesta ordem) para formulação de perguntas relacionadas ao objeto da audiência (art. 8º).
• Após a entrevista, as partes poderão requerer: relaxamento da prisão; concessão de liberdade provisória sem ou com aplicação de medida cautelar diversa; decretação de prisão preventiva; e adoção de outras medidas necessárias à preservação de direitos da pessoa do preso.
5.8 Decisão do juiz:
• Legalidade da prisão: o juiz avaliará se a prisão foi legal e, caso se trate de prisão em flagrante, a homologará. Se a prisão tiver ocorrido de forma ilegal, haverá relaxamento.
• Necessidade de prisão preventiva ou outra medida cautelar: o juiz avaliará, mediante pedido do MP, a necessidade de aplicação de tutela cautelar e decidirá pela prisão preventiva ou pela liberdade provisória com aplicação de medida diversa da prisão. Caso considere desnecessária, concederá liberdade provisória sem aplicação de qualquer medida.
• Se houver declaração ou entendimento do juiz de que ocorreu tortura ou maus-tratos: serão registradas as informações e adotadas as providências cabíveis para investigação (identificação dos potenciais agressores, fotos das lesões, possíveis testemunhas etc.) e para preservação da segurança física e psicológica do preso, que será encaminhado para atendimento médico e psicossocial. Poderão ser aplicadas medidas protetivas para a proteção da integridade física.
6. Medidas cautelares alternativas à prisão:
Aplicam-se sempre que forem suficientes para o fim cautelar (por serem menos restritivas aos direitos fundamentais) e em hipóteses em que a prisão preventiva não é cabível. São preferíveis em relação à prisão preventiva (excepcionalidade da prisão).
Art. 282, § 6º: “A prisão preventiva somente será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar, observado o art. 319 deste Código, e o não cabimento da substituição por outra medida cautelar deverá ser justificado de forma fundamentada nos elementos presentes do caso concreto, de forma individualizada” - crítica ao termo “substituição”: as cautelares diversas da prisão não são substitutivas, diferentemente da prisão domiciliar, caso em que a prisão preventiva seria cabível, mas é substituída por outra medida.
Suas espécies estão previstas no art. 319 do CPP e podem ser aplicadas mesmo quando não verificadas as hipóteses de cabimento da prisão preventiva (art. 313 CPP): crime doloso com pena máx. superior a 4 anos, reincidência, violência doméstica ou familiar. Art. 283, § 1º: “As medidas cautelares previstas neste Título não se aplicam à infração a que não for isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade”.
6.1 Cumulatividade das medidas alternativas à prisão:
As medidas distintas da prisão podem ser aplicadas cumulativamente (mas não podem ser aplicadas em conjunto com a prisão preventiva) - art. 282, § 1º.
6.2 Taxatividade das medidas alternativas à prisão:
Discute-se se é possível aplicação de medidas distintas das previstas nos arts. 319 e 320 CPP (cautelares atípicas), mediante aplicação por analogia do poder geral de cautela do Processo Civil:
• Posição 1: é possível, pois o art. 2º do CPP admite analogia e se trata de solução benéfica ao réu, pois permite aplicação de medidas menos gravosas do que a prisão preventiva.
• Posição 2: não é possível, porque toda intervenção sobre direito fundamental está submetida a reserva legal (princípio da legalidade geral) e não é realmente benéfica, porque se nenhuma medida típica é adequada, o imputado deve ser solto sem qualquer restrição.
6.3 Pressupostos positivos:
• Fumus comissi delicti: prova da existência do crime e indício suficiente de autoria (analogia ao art. 312, caput, CPP).
• Periculum in mora: perigo à instrução ou investigação, à eficácia do provimento e de prática de crimes • Disposição geral do art. 282, I, CPP: constatação, com base em elementos concretos dos autos, de “necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais” • Fins específicos: algumas medidas estabelecem fins específicos para os quais podem ser aplicadas, de modo que a necessidade só pode ser dar em relação de perigo que lhes comprometam Ex: “proibição de acesso ou frequência a determinados lugares (...) para evitar o risco de novas infrações”.
Disposição geral do art. 282, I, CPP: constatação, com base em elementos concretos dos autos, de “necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais”.
Fins específicos: algumas medidas estabelecem fins específicos para os quais podem ser aplicadas, de modo que a necessidade só pode ser dar em relação de perigo que lhes comprometam Ex: “proibição de acesso ou frequência a determinados lugares (...) para evitar o risco de novas infrações”.
6.4 Hipóteses de cabimento/admissibilidade:
A hipótese de cabimento é bastante genérica, dada pelo art. 283, § 1º: “As medidas cautelares previstas neste Título não se aplicam à infração a que não for isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade”. São cabíveis mesmo fora das hipóteses do art. 313: crime doloso com pena máx. superior a 4 anos, reincidência, violência doméstica ou familia.
6.5 Hipóteses de vedação: aplicam-se analogicamente as vedações relativas à prisão preventiva:
• Art. 313, § 2º: antecipar o cumprimento de pena ou decorrência direta da investigação ou denúncia.
• Art. 314: prova de incidência de excludente de ilicitude
7. Liberdade provisória
A liberdade provisória é, grosso modo, a soltura de alguém que foi preso em flagrante. Originalmente, o CPP/1941 estabelecia que a pessoa detida em flagrante em regra ficaria presa até a sentença, e excepcionalmente, seria concedida a liberdade, por isso chamada “provisória”. Essa sistemática mudou, principalmente após a CF/1988, que estabeleceu a liberdade como regra e a prisão como exceção (art. 5º, LVII, LXI e LXVI).
A liberdade provisória atualmente é a regra, por expressa dicção constitucional - art. 5º, LXVI - “ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança”. Não se confunde com a liberdade pura e simples, porque implica vínculos do imputado com a persecução penal, os quais, se descumpridos, podem acarretar aplicação de outras medidas cautelares (máxime a prisão preventiva). Tais vínculos são sobretudo a obrigação de comparecer em todos os atos da investigação ou processo e a proibição de mudar ou se ausentar da residência sem comunicar o juízo. Existem duas modalidades de liberdade provisória: com fiança e sem fiança.
7.1 Liberdade provisória obrigatória - “livrar-se solto”
Não se imporá prisão em flagrante nem se exigirá fiança nos seguintes casos:
• Infração de menor potencial ofensivo – suspeito for encaminhado imediatamente ao JECrim ou assumir compromisso de nele comparecer (art. 69 L. 9.099/1990).
• Prestar pronto e integral socorro à vítima em crimes de trânsito (art. 301 CTB).
• Porte de drogas para consumo pessoal (art. 48, § 2º, c/c art. 28 L. 11.343/2006)
7.2 Liberdade provisória vedada - inconstitucional:
São hipóteses em que o legislador proíbe completamente a concessão de liberdade provisória, exigindo que o imputado seja mantido preso. Essas hipóteses são atualmente consideradas inconstitucionais pelo STF (p. ex., art. 21 do Est. do Desarmamento – ADI 3112, 2007; art. 44 L. 11.343/2006 – HC 104.339, 2012).
Atualmente: Art. 310, § 2º CPP: Se o juiz verificar que o agente é reincidente ou que integra organização criminosa armada ou milícia, ou que porta arma de fogo de uso restrito, deverá denegar a liberdade provisória, com ou sem medidas cautelares”. [Inserido pela Lei 13.964/2019]
7.3 Liberdade provisória sem fiança
Além das hipóteses de liberdade provisória obrigatória, há outras em que a liberdade provisória deve ser concedida e isso pode ocorrer sem fiança:
• Excludentes de ilicitude (art. 310, § 1º, CPP) – não poderá aplicar cautelares.
• Ausência de motivos que autorizem a prisão preventiva (art. 321 CPP) – a liberdade provisória, nesse caso, pode ser concedida com imposição de medidas cautelares (inclusive a fiança).
• Réu sem condições financeiras de pagar fiança (art. 350 CPP) – poderá aplicar cautelares.
7.4 Liberdade provisória com fiança:
Finalidade da fiança: garantia real de que o comparecerá aos atos do processo/investigação, pagará custas processuais, reparará o dano e pagará multa; é também uma medida cautelar alternativa.
• Crimes inafiançáveis – art. 5º, XLII, XLIII, XLIV, CF + art. 323 CPP.
• Situações de inafiançabilidade – art. 324 CPP.
• Legitimidade para conceder e arbitrar a fiança – art. 322, caput e § único, CPP (Delegado: infração com pena máxima não superior a 4 anos / Juiz: nos demais casos será concedida ao juiz, que decidirá em 48h).
• Fixação do valor da fiança – art. 325 (infração com pena máxima não superior a 4 anos: 1 a 100 s.m. / infração com pena máxima superior a 4 anos: 10 a 200 s.m.). Fatores a serem considerados (art. 326 CPP): natureza da infração, condições pessoais de fortuna e vida pregressa do acusado, circunstâncias indicativas de sua periculosidade, bem como a importância provável das custas do processo até final julgamento.
• Modificações do valor em razão da situação econômica do preso (art. 325, § 1º, CPP) - Dispensa na forma do art. 350 CPP (hipossuficiência), redução de 2/3 e aumento em até mil vezes.
• Procedimento (art. 333) - havendo requerimento de liberdade provisória com fiança pela defesa, o juiz decidirá sobre ela em 48h, sem oitiva prévia do MP. Se houver outros pedidos subsidiários, como relaxamento ou revogação da prisão, ou pedido de concessão de liberdade provisória sem fiança, haverá oitiva prévia do MP.
• Vicissitudes da fiança: reforço (necessidade de aumento do valor da fiança - art. 340), perda (é o fato de privar o réu do valor total da fiança - arts. 344 e 345), quebra (resultado do descumprimento de dever ou prática de ilícito relacionado à fiança - arts. 341 a 343), cassação (revogação por erro ou por constatação superveniente sobre o não cabimento - arts. 338 e 339), restituição (devolução ao imputado do valor da fiança - arts. 336 e 337) - quando o valor exigido a título de fiança for aportado por terceiro, a restituição será feita ao terceiro.
• O STJ tem posição consolidada de que o não pagamento da fiança não resulta, automaticamente, na manutenção da prisão.
8. Medidas cautelares patrimoniais
As medidas cautelares patrimoniais ou reais estão previstas nos arts. 125 a 144-A do CPP e buscam assegurar os efeitos patrimoniais da condenação criminal. O sequestro (bens imóveis e móveis) objetiva assegurar o cumprimento do efeito de perda do produto do crime (impede o lucro ilícito). A hipoteca legal (bens imóveis) e o arresto (bens móveis) objetivam assegurar a reparação do dano causado pelo crime (reparação da vítima) e, subsidiariamente, o pagamento de pena de multa e de despesas processuais. Excepcionalmente caberá arresto de bens imóveis, como fase preparatória para a hipoteca legal.
8.1 Sequestro de bens
Se relacionado com o efeito de perdimento e pode abranger bens móveis ou imóveis.
Art. 91 - São efeitos da condenação:
(...)
II - a perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé:
a) dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito;
b) do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso.
§ 1º Poderá ser decretada a perda de bens ou valores equivalentes ao produto ou proveito do crime quando estes não forem encontrados ou quando se localizarem no exterior.
§ 2º Na hipótese do § 1º, as medidas assecuratórias previstas na legislação processual poderão abranger bens ou valores equivalentes do investigado ou acusado para posterior decretação de perda.
Art. 91-A. Na hipótese de condenação por infrações às quais a lei comine pena máxima superior a 6 (seis) anos de reclusão, poderá ser decretada a perda, como produto ou proveito do crime, dos bens correspondentes à diferença entre o valor do patrimônio do condenado e aquele que seja compatível com o seu rendimento lícito.
8.1.1 Sequestro de bens imóveis
• Objeto: bens imóveis que sejam produto direto ou indireto do crime, ainda que já tenham sido transferidos para terceiro (art. 125).
• Referibilidade: somente pode incidir sobre bens que tenham relação direta com o crime objeto de investigação (exceto no sequestro subsidiário).
• Requisito: “indícios veementes da proveniência ilícita dos bens” (art. 126) – juízo de probabilidade.
• Legitimados: MP, ofendido, autoridade policial (durante o inquérito).
• Momento: “em qualquer fase do processo ou ainda antes de oferecida a denúncia” (art. 127).
• Finalidade: assegurar o efeito de perda do produto do crime e, subsidiariamente, reparação do dano causado pelo delito ao lesado ou terceiro do boa-fé (art. 133).
• Formalidade: haverá registro na matrícula junto ao Cartório de Registro de Imóveis (art. 128).
• Hipóteses de levantamento do sequestro (art. 131): quanto ao inciso I, a jurisprudência tem flexibilizado o prazo.
8.1.2 Sequestro de bens móveis
• Objeto: bens móveis que sejam produto indireto do crime.
• Requisitos: os mesmos do sequestro de bens imóveis, mais um requisito específico: não ser cabível a busca e apreensão – o produto direto do crime, como a coisa furtada ou o dinheiro obtido pelo estelionatário, deverão ser apreendidos por se tratarem de coisas obtidas por meio criminoso e por serem necessários à prova da infração.
• Formalidade: deverão ser depositados, ficando sob responsabilidade do depositário ou
administrador judicial.
8.1.3 Sequestro subsidiário
• Objeto: “bens ou valores equivalentes ao produto do crime” (art. 91, § 1º, CP) (Ex: lavagem de dinheiro).
• Subsidiário: somente se aplica quando não for encontrado ou quando estiver no exterior o produto do crime – sequestra-se patrimônio lícito equivalente ao ilicitamente obtido.
• Requisitos: mesmos do sequestro de bens móveis e imóveis, com a especificidade de que se indique no requerimento qual foi o produto do crime e se estime seu valor.
8.2 Hipoteca legal
• Finalidade: resguardar patrimônio do acusado para reparação do dano causado pelo delito e, subsidiariamente, para pagamento da pena de multa e despesas processuais (art. 140, CPP) – o proprietário não perderá a posse de seu bem imóvel.
• Objeto: todos os bens imóveis que integrem licitamente o patrimônio do acusado.
• Requisito: “certeza da infração e indícios suficientes da autoria” (art. 134).
• Legitimados: ofendido (art. 134) – seu representante ou herdeiros – e o Ministério Público se o ofendido for a Fazenda Pública (art. 142).
• Momento: “em qualquer fase do processo” – após o oferecimento da denúncia.
• A absolvição ou extinção da punibilidade cancela a hipoteca legal.
• Requerimento de especialização: a parte estimará o valor da responsabilidade civil, e designará e estimará o imóvel ou imóveis específicos (especialização) que terão de ficar hipotecados.
• Petição será instruída com as provas ou indicação das provas em que se fundar a estimação da responsabilidade, com a relação dos imóveis que o responsável possuir e com os documentos comprobatórios do domínio.
• O arbitramento do valor da responsabilidade e a avaliação dos imóveis designados será feito por avaliador judicial ou por perito nomeado pelo juiz, onde não houver avaliador judicial.
• O juiz, ouvidas as partes no prazo de dois dias, poderá corrigir o arbitramento do valor da responsabilidade, se lhe parecer excessivo ou deficiente, e autorizará somente a inscrição da hipoteca de imóveis necessários à garantia da responsabilidade.
• O valor da responsabilidade será liquidado definitivamente após a condenação, podendo ser requerido novo arbitramento se qualquer das partes não se conformar com o arbitramento anterior à sentença condenatória.
• Se o réu oferecer caução suficiente, o juiz poderá deixar de mandar proceder à inscrição da hipoteca.
8.3 Arresto
Há duas espécies de arresto:
a) de bens imóveis, prévio à hipoteca legal
b) subsidiário de bens móveis
8.3.1 Arresto de bens imóveis prévio à hipoteca legal (art. 136)
• Finalidade: assegurar que um bem imóvel não seja alienado enquanto não se tem elementos suficientes para requerer a hipoteca legal, que exige certeza da infração e indícios suficientes de autoria, além de início do processo (acautela a cautelar).
• Objeto: bens imóveis lícitos do investigado/acusado.
• Prazo de eficácia: 15 dias, se não for promovido o processo de registro da hipoteca legal.
• Requisito: estimar o valor da responsabilidade e o valor dos imóveis.
• Momento: qualquer fase do processo e mesmo no inquérito policial.
8.3.2 Arresto subsidiário de bens móveis (art. 137)
• Finalidade: resguardar patrimônio do acusado para reparação do dano causado pelo delito e, subsidiariamente, para pagamento da pena de multa e despesas processuais.
• Objeto: bens móveis lícitos do investigado/acusado suscetíveis de penhora.
• Requisito: “não possuir bens imóveis ou possuir de valor insuficiente”. Trata-se de medida subsidiária e complementar.
• Consequência: o proprietário é desapossado da coisa, que deverá ficar com depositário ou administrador judicial, pode ficar com o proprietário, na qualidade de depositário.
8.4 Alienação antecipada - art. 144-A CPP.
Disciplina: Processo Penal I
Resumo feito com base no material produzido e disponibilizado pelo Prof. Felipe da Costa de Lorenzi.
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