Login
E-mail
Senha
|Esqueceu a senha?|

  Editora


www.komedi.com.br
tel.:(19)3234.4864
 
  Texto selecionado
Polêmica
(R.I.P Fernanda Young)
Roberto Queiroz

Fiquei pasmo com a notícia do falecimento da escritora e atriz Fernanda Young. E pior: ela faleceu aos 49 anos, praticamente no auge da sua vida e carreira. A princípio fiquei matutando se ela merecia um artigo aqui na minha série de obituários pelo fato de não conhecer tanto assim de sua obra e não considero ela um pilar indispensável na minha formação cultural. Entretanto, ela possuía algo em sua identidade cultural que me agradava: escrevia sobre o nonsense, o submundo, sobre pessoas que normalmente não vemos com frequência na programação televisiva e mesmo nas ruas.

Então pensei de novo e disse: por que não?

Muito do que conheço a respeito do trabalho e da carreira de Fernanda está registrado em sua série mais famosa, Os normais, que fez muita gente ficar acordada até de madrugada na frente da tv. Seus protagonistas, Rui (Luíz Fernando Guimarães) e Vani (Fernanda Torres), são o estereótipo do casal brasileiro classe média que finge estar na boa, mas na verdade, está cheio de dilemas morais e conflitos povoando a sua cabeça - e também suas decisões.

Foi por causa da série que procurei seus livros e logo de cara fiquei interessado por dois deles: Aritmética, provavelmente seu romance mais desafiador, e Tudo o que você não soube, que praticamente caiu na minha frente de uma das prateleiras da biblioteca pública da qual era sócio quando morava no Méier. E imediatamente entendi que ela era gosto adquirido (ou você gosta ou odeia, com a mesma intensidade) e não uma ficcionista best-seller, dessas de quem se fala em todos os lugares, outdoors, sites na internet, banners em ônibus, etc, o tempo todo.

Ainda tem muita coisa dela que eu quero ler (aqui mesmo, em casa, estou com um exemplar de Pós-F: para além do masculino e do feminino, que encontrei na promoção numa das lojas da saraiva outro dia desses, mas ainda não abri), mas desde já adianto: é preciso ter coragem para lê-la. Fernanda não agrada a moralistas e religiosos enfadonhos.

Vejo muita gente falando sobre ela nos sites que anunciam sua morte, se referindo a sua persona criadora como "polêmica", "de humor ácido", "extrovertida", "anticonvencional". São excelentes interpretações para uma mulher que sempre deixou claro que preferia andar na contramão do sistema. Fernanda não escrevia sobre o óbvio, porque isso não lhe interessava (aliás: a mim também não).

Até mesmo quando posou nua para a Playboy polemizou, seja por seu corpo repleto de tatuagens, seja por seu discurso forte, sem rodeios, sem a intenção de agradar a todo mundo. Quando apresentava na tv a cabo o programa Irritando Fernanda Young nunca perdia a chance de colocar seus entrevistados contra a parede, de forma extremamente inteligente e versátil. Em outras palavras: rompeu com o padrão do que conhecemos como talk show e certos entrevistadores monótonos.

Vocês devem estar pensando: "para quem disse que não conhecia tanto a respeito do trabalho dela, você a viu fazendo muita coisa, não é mesmo? À primeira vista pode parecer exatamente isso, mas na verdade isso reflete a força e a intensidade de seu trabalho, na tv e no cinema. Fernanda não enfeitava o pavão (como costumo dizer a respeito de certos "escritores" que andam na moda atualmente). Ela era direta, sabia escrachar quando necessário e não era devota do discurso politicamente correto tão em voga na nossa arte e cultura atualmente.

Chego ao fim deste texto mais uma vez triste porque nosso mercado editorial perde uma de suas figuras mais loucas, ímpares, autênticas, espontâneas. E isso num país que vem encaretando de forma agressiva nos últimos anos é quase um tapa na cara dos verdadeiros leitores e amantes de boas histórias!

Fica em paz, minha querida! E continue produzindo suas "polêmicas" aí em cima. O país e o mundo anda precisando MUITO delas.


Biografia:
Crítico cultural, morador da Leopoldina, amante do cinema, da literatura, do teatro e da música e sempre cheio de novas ideias.
Número de vezes que este texto foi lido: 53055


Outros títulos do mesmo autor

Artigos Cicatrizes não têm prazo de validade Roberto Queiroz
Artigos A revolução impressa Roberto Queiroz
Artigos O passado nunca foi tão presente Roberto Queiroz
Artigos Sinônimo de cinema Roberto Queiroz
Artigos A rainha do pop declara guerra à tudo e todos Roberto Queiroz
Artigos Obsessivo Roberto Queiroz
Artigos O corredor polonês Roberto Queiroz
Artigos A semente da dúvida Roberto Queiroz
Artigos O hércules do rock Roberto Queiroz
Artigos Nem tudo é o que parece Roberto Queiroz

Páginas: Primeira Anterior Próxima Última

Publicações de número 21 até 30 de um total de 188.


escrita@komedi.com.br © 2024
 
  Textos mais lidos
O Senhor dos Sonhos - Sérgio Vale 54089 Visitas
Desabafo - 54080 Visitas
Depressivo - PauloRockCesar 54027 Visitas
Jornada pela falha - José Raphael Daher 53986 Visitas
Cansei de modinha - Roberto Queiroz 53982 Visitas
Saudações Evangélicas (Romanos 16) - Silvio Dutra 53950 Visitas
Novidade no Céu - Teresa Vignoli 53945 Visitas
A menina e o desenho - 53939 Visitas
MENINA - 53918 Visitas
sei quem sou? - 53900 Visitas

Páginas: Primeira Anterior Próxima Última