A tempestade do dia 24 de agosto de 1954.
Fixei a vista no calendário postado ao lado do notebook, a memória reteve o ano de 1954 e de imediato comecei a digitar: senti uma sensação de tempestade chegando, mas não tinha sentido, a noite estava linda e na orla de Copacabana havia bastante gente curtindo a vida noturna.
No entanto, aquele sentimento permanecia de que algo iminente estava próximo de acontecer, e que não abalaria só a mim, como também todo o nosso país.
Fiquei de sobreaviso e aguardei pelo destino.
Como de hábito, estava jantando na inesquecível Cantina Sorrento localizada ali no cantinho do Leme, bem no início da Av. Atlântica, acompanhado do meu amor.
A frequência da Sorrento era seleta, composta por artistas, políticos, jogadores famosos, escritores, patentes militares e de jornalistas sempre a procura de notícias.
Eles tinham um time de garçons poliglotas, cardápio variado e um preço salgado, inclusive daí surgiu a expressão famosa do ”bife de ouro." O maître notando que a minha acompanhante acabara de degustar os drinks sofisticados que ele lhe havia sugerido, aproximou-se para oferecer seu serviço. Deixou o cardápio e ficou de longe aguardando o meu sinal. Ela, descontraída, vira-se para mim e solta a bomba. Sabe, amor, estou pensando que devo dar um tempo no nosso relacionamento. Estou sendo sincera contigo porque não gosto de traição. Caso não dê certo, o que desejo, quem sabe a gente não volte a se relacionar. Fiz os pedidos, jantamos, a deixei em casa e retornei ao Leme, mas dessa vez procurei a boate Sacha's onde fui afogar minhas mágoas no whisky escocês 12 anos e ao som do piano do velho amigo. Pela manhã, recebemos a notícia do suicídio do companheiro Getúlio Vargas, no Palácio do Catete, criando uma comoção nacional na população de quase 60 milhões de brasileiros.
Isso ocorreu há mais de 70 anos, mudou a minha vida e de todo o Brasil.
Saí dali e nunca mais quis saber de política e nem do amor.
Quanto a você, escritor, penso que talvez nem tivesse nascido ou quem sabe estivesse chegando nesse mundo de tempestade íntima e coletiva.
Autor: Jonas Vasconcelos.
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