Certa vez, enquanto lia a Revista Action Hiken, descobri um shonen de traços bem legais. Mas quando comecei a ler, me deparei com uma linguagem formalista. Um português truncado e de leitura arrastada. Eu achei os diálogos engraçados. Juro, as vezes eu tinha que ler duas vezes para entender. Por um momento, levando em consideração o contexto da história e os personagens, achei que deveria ser um elemento narrativo.
Pesquisando um pouco mais sobre o mangá Demon Hunter, e o seu autor, o Diogo Cidades, descobri que se tratava de um jovem mangaká português. Aí sim ficou claro aquele modo de escrever tão distante de minha realidade. Convenhamos, salvo raras exceções, somos todos coloquiais. A península Ibérica é um celeiro de mangakás. Espanha e Portugal tem diversos talentos nesse estilo de desenho, o Diogo é um deles.
Demon Hunter possui caracter designer que se encaixa perfeitamente em sua proposta: entreter. Confesso que os traços me remeteram automaticamente ao autor Hiro Mashima. Um desenho simples, mas dinâmico, caricato e de expressão cômico. Mais que simpático, funcional. É um shonenzão, e isso é bem positivo, levando em consideração a antologia em que está sendo publicado e o público alvo.
A história se inicia com um acampamento de May Lionheart e um amigo, que estava cheio de más intenções. Infelizmente, naquela floresta e àquela hora da noite, eles acabam se separando. Para piorar de vez a noite de terror, acabam sendo atacados por um capeta dos zinfernos, ou como os portugueses dizem, um demónio. Nesse momento, surge nosso protagonista de cabelos prateados e salva a noite, Mike Seikatsu, o caçador de demónios.
Depois disso, a May é levada pelo Mike até o mosteiro onde vive. Lá, só habitam ele e o seu avô, o Mayuge Seikatsu, um velhote safado, pra variar. Ao longo dos cinco capítulos, vemos o desenvolvimento da amizade entre ambos os protagonistas. Uma relação cheia de química, com direito a alguns echis, nada exagerado, viu crianças! É um quadrinho sincero em sua violência, afinal, são demónios a serem combatidos.
Mas, se eu tivesse que tratar de um ladrão de cena, bem, esse é o Steve, o macaquinho cozinheiro. A cena da luta entre Steve e Mike é impagável, e provocaria elevação de ânimos entre ambientalistas. O autor desenvolve bem as personalidades ali presentes, lhes dando profundidade, sem cair na exposição desnecessária de muitos shonen. Ele vai com calma, sabe onde está indo, e isso te empolga a descobrir mais.
Pouco do universo foi apresentado no vol. 1, mas podemos ver ali uma série de mistérios, que, se bem desenvolvidos, trarão ótimas reviravoltas dentro de seu universo. Por exemplo: qual a origem dos poderes do Mike? Porque os demónios se transformam em pérolas ao morrerem? Quem controla esses seres? Enfim, teremos uma longa saga a ser acompanhada.
A decisão dos editores de adaptarem alguns termos da escrita do Diogo Cidades, foi uma ótima decisão. Ajudou muito. Os países lusófonos, como Brasil e Angola, falam português oficialmente, mas, possuem uma variação muito complexa. Deve ter dado trabalho adaptar a linguagem para ambos os leitores de ambos os países, deixou a escrita mais fluída sem perder o seu sotaque português.
Teve só uma coisa que me incomodou no mangá: onomatopeias. Em alguns quadros, são grafadas em caracteres latinos, em outros, em japonês, noutros, aparecem em japonês e latino! Tá meio bagunçado isso aí. Tem que padronizar. Isso gera uma cacofonia visual. Sem contar que deve ser difícil ficar mudando a editoração a cada página ou capítulo, perde-se muito tempo nisso. Embora, não atrapalhe a leitura de ninguém.
Sobre o desenho do Diogo Cidades, ele tem boas influências e vem de uma boa escola de estilo. Alguns desenhistas evoluem ao longo de anos, outros a cada obra, alguns ainda por capítulo, o Diogo evolui a cada quadro. Sério, o traço do cara evolui proporcionalmente a cada virada de página. Muitas vezes, quadrinistas como os da Action Hiken é o que não encontramos em algumas antologias japonesas semanais.
Fiquei mais que satisfeito em conhecer esse mangá luso-brasileiro — espero que o autor não veja problema nisso, afinal, é produzido em Portugal, mas é editado e publicado no Brasil. A obra tem mais de 140 páginas, orelhas, galeria de fanarts e curiosidades da produção. Senti falta das páginas coloridas, mas, entendi os motivos, encareceria a produção. E sobre a qualidade gráfica?
Olha, serei sincero com vocês, se outras editoras tivessem o mesmo esmero em suas publicações como o Estúdio Armon, teríamos HQs melhores produzidas na estante. O projeto gráfico e a impressão estão excelentes. Nada de off white xexelento. A capa, a lombada, a colorização, gente, tá tudo muito bom. O único defeito do negócio, é que ainda não temos previsão do volume 2. Parabéns ao Diogo Cidades e ao Estúdio Armon.
Para adquirir o mangá, acesse aqui:
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