Tombos do Rio Carangola, jorrando suas águas sem cessar,
Meus pés ainda virgens, sem sentir vertigens, começam a caminhar,
Vou andando simplesmente, sem notar que à minha frente, o que é preciso está por lá,
Sempre estava, eu que não tive sentimentos pra notar.
Sobe morro, desce ladeira, segue trilha, corredeira, passa boi olhando a gente,
O chão duro vai queimando e machucado vou andando, eu só quero é ir em frente,
Na gruta da Pedra Santa, a emoção sentida é tanta que me ponho a rezar,
Com a alma aquecida, acendo a vela esquecida, abençoado este lugar.
Vejo flores no caminho, sinto odores de pertinho, sinto dores nos meus pés,
Me anima o riachinho, com seu toque tão “friinho”, vou chegando a Catuné,
Sigo pela rua estreita com seu povo na espreita vou entrando no lugar,
Um abraço me aperta sem cobrar se a hora é certa, se vou ter como pagar.
Um sorriso me recebe, acalenta a minha alma, me oferece pão e pousada,
Choro um choro de alegria, por ver tanta simpatia, dessa gente iluminada,
Me despeço ainda em prantos, mas levando o seu encanto, saio cedo a caminhar,
Com os pés cheios de dores, coração cheio de amores me impulsiona o andar.
Sobe morro novamente, na ladeira vou contente, já não sou pessoa estranha,
Boi agora vem bonzinho, por um trecho do caminho, bem no meio da montanha,
Sinto sede, me refresco e andando me confesso, com a natureza amada,
Sem dar conta da distância, atinando a minha ânsia, brilha longe Pedra Dourada.
Lá chegando já avisto suas águas cristalinas, as montanhas ao redor,
Me banhando em suas águas, na mais bela das cascatas, me tirando o suor,
Sigo em frente e confiante, encontrando bem adiante, as pessoas do lugar,
Também sou bem recebido e já fico comovido com vontade de ficar.
Nasce o dia novamente e já saio alegremente, minha mente a flutuar,
Apoiado no cajado, mesmo com pé calejado, dá vontade de cantar,
Pedras, pontes e porteiras, passo a passo na poeira, contemplando a natureza,
Passo serras verdejantes, desço firme e confiante, encontrar com a Surpresa.
Margeando suas águas, pela laje vou sem mágoas, o caminho vou abrindo,
Acompanho o rio maroto, me sentindo um garoto, para frente eu vou indo,
Mais ao longe me espera, bem acima, lá na serra, bem no meio deste trilho,
Uma árvore centenária, que recebe solitária, este humilde andarilho.
Três quilômetros de asfalto me aguardam de assalto, aumentando meus tormentos,
E por mais que desejemos, cadê Faria Lemos, pois só vejo os mandamentos?
O povo tão tranqüilo admira o andarilho ao chegar à estação,
Para o tempo de repente, até parece antigamente, até parece solidão.
Num caminho mais ameno, não me sinto tão pequeno entre morros e cascatas,
O rio cortando a terra, embrenhando pela serra, não esquecerei jamais,
A mais bela das fazendas, sua história e suas lendas, o frescor de suas matas,
O caminho iluminado segue o trilho bem trilhado pelo brilho dos cristais.
A princesa me espera sempre à luz ao pé da serra, que riqueza das Gerais,
Movimento de cidade e mostrando intensidade, sem saber se quero mais,
Vou andando devagar, vou entrando e renovado, vou chegando bem na hora,
O povo em burburinho olha o homem a caminho da singela Carangola.
No seu trecho mais bonito, na mente se ouve o apito, da velha locomotiva,
Que cruzava suas matas, em seus trilhos e dormentes de General a Ernestina,
Hoje se vê flores, montanhas no horizonte e os rastros de animais,
O silêncio que se impera, vou sozinho pela serra, vou vivendo, vou bem mais.
O viajante não se engana, quando ao longe vê Caiana, ouve forte a siriema,
No pasto com seu grasnado, ajudando o pobre gado, isso é coisa de cinema,
Chão de terra nos aguarda, já vai longe à madrugada, minha mente é quem me diz,
Não desisto do caminho, neste trecho vou sozinho, vou até Espera Feliz.
Cidade próspera e bonita, gente elegante e educada, carinho não falta ali,
Durmo tranqüilo e sossegado, me espera o café e o gado, pois logo vou partir,
Acordo na madrugada e ouço ao longe a passarada, ouço até o bem-te-vi,
Caminho por belas estradas, na mais longa das jornadas, um dia volto pra ti.
Pés que sofrem calados, mas nunca desanimados, vão até Caparaó,
Encontro criança faceira, vem de longe na poeira, do meu corpo tenho dó,
Passo rápido na cidade, mas sinto a felicidade deste povo do fundão.
Pois sei que a hora é esta, o povo fazendo festa, o povo do coração.
Finalmente mais um dia, que termina na alegria de missão que foi cumprida,
O povo que veio da lida, ganhando o sustendo da vida, me olha com espanto,
Por que o moço andarilho, com o rosto cheio de brilho, andou por este tanto?
Quem sabe um pouco da alma, percebe com fé e calma, a missão da minha vida.
Já na montanha sagrada, não se vê hora passada, o silencio nos preserva,
Uma prece é ouvida, um sinônimo de vida, um espírito se eleva,
Cada passo percorrido, não se deve ser medido, como se fosse fronteira,
O que importa é o presente, que não sai da minha mente, o Pico da Bandeira.
05/03/2008
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