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O país das cestas básicas
(necrológio nacional)
Roberto Queiroz

Somos babacas? Olha... Eu prefiro não responder esta. Posso ser agredido na rua.

Somos sadomasoquistas? Eu também tenho me feito esta pergunta nos últimos anos. E prefiro que vocês, leitores, respondam.

Somos patriotas? Se somos, não deveríamos. Na prática, pelo menos, não. O que há de tão majestoso em ser patriota numa nação como o Brasil? Digo: patriota mesmo.

Somos os quê, então? Boa pergunta. Quando eu souber, respondo a vocês.

O Brasil afunda. Afunda mesmo. A olhos vistos e encobertos (pois é... Tem gente que prefere afundar a cabeça na areia, como avestruz, e fingir que tudo é lindo). E o povo? O que é que tem? O povo, você sabe, nada faz. E não é de hoje.

Acompanhamos durante todo o ano de 2017 o sofrimento daqueles que deram tudo, a própria vida, para ter uma vida melhor e sequer recebem em dia seus salários. Acompanhamos os disparates de um bando de ladrões, de um desgoverno sem fim, de uma tentativa macabra de destruir a classe trabalhadora. Acompanhamos o fim de um país e o surgimento de um outro, pior, maquiaválico, tendencioso, injusto. E acompanhamos tudo isso de braços cruzados, enquanto assistimos o próximo capítulo da novela (quer dizer: a grande maioria).

Até quando?, diz a música do Gabriel, o pensador, diz a minha vizinha que viu os dois filhos terem de trancar a faculdade por falta de pagamento, diz o professor que largou o magistério para vender sanduíche natural na praia, diz o bailarino do Teatro Municipal que, para pagar as contas do mês, agora dirige para o Uber, dizem os seus amigos, parentes e conhecidos, os meus, os dos nossos vizinhos, e os de quem mais estiver ouvindo ou lendo este artigo. "Estamos fodidos e não pagos", diz o mendigo de rua que segura um cartaz com as duas mãos no meio da Avenida Brasil, a ponto de ser atropelado a qualquer momento.

Viramos o país das cestas básicas, da esmola por piedade, da expressão "eu tô na merda, mas pelo menos tenho comida em casa", da falta de respeito, do abuso político, da retirada de direitos básicos. da falta de caráter, do "os outros que se danem, eu quero me dar, ser famoso, ser celebridade, ser seguido no twitter e no facebook, e coisa e tal".

Viramos sombras. Sombras de um nada existencial e coletivo que já perdura quase quatro anos. E nada. Eles pararam o país, inventaram a máxima de que o impechment de uns era o começo do recomeço. E agora? O pobre José, do poema do Drummond, morreu de inanição esperando dias melhores que nunca vêm. E mais: uma sensação perturbadora, de que o pior está por vir me persegue, nos persegue, cutucando nossa esperança, quem sabe tentando nos fazer desistir de nossa própria fé. Não. Não podermos. Desistir. Não agora.

Precisamos, isso sim, acordar. Como fênix renascida das cinzas, e avançar. Olhar dentro do olho do furacão, antes que seja tarde demais. Enfrentar. Duelas. Combater. Alguns dirão: metralhar, exterminar, dizimar... Quem sabe! Pode ser uma solução. Mas precisamos. Reagir. Não diz a lei da física que toda ação gera uma reação? Pois então: eles, os desalmados, agiram. E mais de uma vez. E nós? Quando?

Viramos o país do quando sem nenhum verbete a seguir, um quando vagando no espaço-tempo, sem lenço, sem documento, sem culhões, sem vontade própria, sem alma. Um quando fantasma, que acha que a vida se resume a rir, gargalhar, festejar, carnaval, futebol, cerveja, Rock in Rio, dez mulheres para cada homem, responsabilidade zero. Como o outrora mal-sucedido fome zero.

Sobrará algo de nós em 2018? Aguardemos. Aguardemos o cacete! Já não basta aguardar as cenas do próximo capítulo da novela das seis, das sete, das nove, das 11 (o que virá a seguir: a novela de uma da manhã? Meu Deus! Perdoai-nos, por sermos tão levianos...). O que sobrará? O que esperar? Devemos esperar? Esperar é um bom verbo para quem parece ter perdido tudo, inclusive o direito a opinar?

Tantas perguntas. Respostas? Zero. Como a responsabilidade e a fome. E amanhã está chegando.

Acaba logo, ano filho da puta!!!


Biografia:
Crítico cultural, morador da Leopoldina, amante do cinema, da literatura, do teatro e da música e sempre cheio de novas ideias.
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