Pulei de um despenhadeiro.
Enquanto caía fui pensando em como criar asas,
ou penas, ou sensações Ícaras,
mas eu era só um homem em voo livre,
filosofia nenhuma bastaria nesse momento,
nenhum deus me ensinaria a planar,
pássaros apenas espiavam minha queda,
pensei, o homem é só um amontoado de suposições,
daqui a pouco estarei abraçado às pedras,
a lua não saiu do lugar,
o sol não deixou de esquentar,
o homem da padaria perguntará por meus centavos,
o dublê não saberá da minha existência,
provavelmente apagarão meu nome dos livros,
ao menos não terei problemas,
só dá tempo de pensar que a existência é fugaz,
o homem não dura o que dura um oceano,
não tenho saudades do futuro,
nem me lembro do passado,
estou em movimento a favor da gravidade,
não há hotéis no céu,
nem redes na varanda do Éden,
sinto o vento vasculhar minha pele,
olho o céu se desmanchando em palidez,
só me lembro das pedras,
só me lembro das pedras,
só me lembro,
só me lembro,
das pedras,
das pedras,
das pedras,
pedras...
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