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MINHA QUERIDA DAMA DA NOITE
Gladyston costa


Comum em cidades barroquistas por ai a fora, ladeiras com piso de pedra são uma marca. Lá em cima sempre uma igreja, aqui mais para baixo sempre algum pecado. A marcar cada pedra, os pés na procissão seguem ladeira acima em busca de salvar as almas de seus donos com seus cânticos e orações, pois por serem de carne e osso são atormentados por pecados capitais, a luxuria, ah essa luxuria! Meus pés de criança em certo momento no passado, movidos por curiosa atenção ia logo atrás do cortejo em marcha muito lenta e olhos atentos, houvesse um caixão logo à frente seria como um típico enterro desses de interior. As casas antigas perfiladas nos dois lados da rua, com suas portas e janelas compridas, tinham paredes que de tão antigas remetiam o pensamento aos mortos de longa data; onde estariam suas almas? Procissões ao fim da tarde como as que aconteciam na semana santa eram sempre muito comuns, nestas as pessoas caminhavam ladeira acima e o sino da igreja lá no alto anunciava a hora da “ave Maria”, sempre às seis, sempre à luz quase de vela, de um sol escondido atrás dos montes. Sim, a luxúria! Aquele pecado cujos pés carregavam corpos ladeira acima em busca do perdão, corpos possuídos por libido a entorpecer almas e cegar os olhos. Desejos ocultos que ardem no corpo. A Ave Maria anunciada no badalar dos sinos também anunciava a hora da dama da noite, aquela cujos pecados haveria de um dia ser confessado junto ao espírito santo. O perfume dessa dama era doce e profundo e sempre se expunha ao anoitecer quando se despia de seu delicado vestido branco, a noite todos os demônios saem de suas tocas. E das fissuras das paredes das casas perfiladas, tais demônios se materializavam em pequenos répteis a percorrerem verticalmente essas taipas. Mente e olhos de criança em uma inocência de anjo, dizem que crianças são anjos na terra! Lagartixas, bichos de hábitos noturnos que atendendo ao chamado dos sinos brotavam das fissuras e se confundiam com o perfume doce e profundo dessa dama tão cobiçada. Crianças como anjos, cabeça de moleque pequeno cujos pés curiosos sempre subiam a ladeira ao entardecer. “Por muito tempo achei que o doce perfume provinha desses repteis”. O tempo passou como sempre passa, e a confusão foi desfeita, nossa dama da noite tem nome, minha linda Cestrum nocturnum... O seu perfume é só seu. Quanto aos pecados, os joelhos dos ascéticos postos aos pés do confessionário sempre darão ao corpo o direito de pecar e ser perdoado e à alma o acesso ao paraíso eterno. Pois, como disse Gregório de Mattos, braços abertos, cravados na cruz e olhos eclipsados que vertem sangue estão despertos para perdoar e se fecham por não condenar.
Gladyston Costa
Comum em cidades barroquistas por ai a fora, ladeiras com piso de pedra são uma marca. Lá em cima sempre uma igreja, aqui mais para baixo sempre algum pecado. A marcar cada pedra, os pés na procissão seguem ladeira acima em busca de salvar as almas de seus donos com seus cânticos e orações, pois por serem de carne e osso são atormentados por pecados capitais, a luxuria, ah essa luxuria! Meus pés de criança em certo momento no passado, movidos por curiosa atenção ia logo atrás do cortejo em marcha muito lenta e olhos atentos, houvesse um caixão logo à frente seria como um típico enterro desses de interior. As casas antigas perfiladas nos dois lados da rua, com suas portas e janelas compridas, tinham paredes que de tão antigas remetiam o pensamento aos mortos de longa data; onde estariam suas almas? Procissões ao fim da tarde como as que aconteciam na semana santa eram sempre muito comuns, nestas as pessoas caminhavam ladeira acima e o sino da igreja lá no alto anunciava a hora da “ave Maria”, sempre às seis, sempre à luz quase de vela, de um sol escondido atrás dos montes. Sim, a luxúria! Aquele pecado cujos pés carregavam corpos ladeira acima em busca do perdão, corpos possuídos por libido a entorpecer almas e cegar os olhos. Desejos ocultos que ardem no corpo. A Ave Maria anunciada no badalar dos sinos também anunciava a hora da dama da noite, aquela cujos pecados haveria de um dia ser confessado junto ao espírito santo. O perfume dessa dama era doce e profundo e sempre se expunha ao anoitecer quando se despia de seu delicado vestido branco, a noite todos os demônios saem de suas tocas. E das fissuras das paredes das casas perfiladas, tais demônios se materializavam em pequenos répteis a percorrerem verticalmente essas taipas. Mente e olhos de criança em uma inocência de anjo, dizem que crianças são anjos na terra! Lagartixas, bichos de hábitos noturnos que atendendo ao chamado dos sinos brotavam das fissuras e se confundiam com o perfume doce e profundo dessa dama tão cobiçada. Crianças como anjos, cabeça de moleque pequeno cujos pés curiosos sempre subiam a ladeira ao entardecer. “Por muito tempo achei que o doce perfume provinha desses repteis”. O tempo passou como sempre passa, e a confusão foi desfeita, nossa dama da noite tem nome, minha linda Cestrum nocturnum... O seu perfume é só seu. Quanto aos pecados, os joelhos dos ascéticos postos aos pés do confessionário sempre darão ao corpo o direito de pecar e ser perdoado e à alma o acesso ao paraíso eterno. Pois, como disse Gregório de Mattos, braços abertos, cravados na cruz e olhos eclipsados que vertem sangue estão despertos para perdoar e se fecham por não condenar.
Gladyston Costa


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