BAIXA A MÃO... Crônica Amazônica
O calor da tarde entrou pela noite com maior intensidade. Era um calor sufocante. Não soprava nenhuma brisa e, mesmo parado, ficávamos ensopados de suor. Todo mundo achava que ia chover. Estávamos no inverno amazônico e esse tempo quente e abafado era, quase sem erro, o anunciador de chuvas pesadas. E a chuva era, no geral, bem vinda porque, com ela, viria o alívio do calor que nos impedia de conciliar o sono. Por outro lado, se a chuva demorasse e rompesse só pela manhã do outro dia, não poderíamos sair para o campo onde, diariamente, estávamos fazendo um trabalho de abertura de picadas e de amostragem de solo. Alguns peões torciam para que a água só desabasse pela madrugada, já que isso significaria um dia no barraco, descansando, jogando baralho, ouvindo rádio...
A noite prosseguia longa, mal dormida, calorenta e sem chuva. Por volta das 4 horas da manhã começou, bruscamente, uma série incessante de relâmpagos e trovões. A noite ficava, por instantes, toda iluminada e, quase imediatamente, parecia que o céu ia desabar sobre nossas cabeças. Uma ventania muito forte acompanhou esse cortejo atmosférico o que nos obrigou a levantar das redes com medo da queda de galhos ou mesmo de árvores sobre o barraco. A chuva ou o temporal era, agora, iminente. Uma parte dos peões sentindo a chance provável de um dia de folga torcia pela queda da água e aos gritos incentivava São Pedro: “Baixa a mão Pedrinho!”; “Manda água meu São Pedro”...
Os relâmpagos, os trovões e a ventania continuaram fortes por um bom tempo, atingiram um pique e, depois, foram amenizando até parar no alvorecer do dia. A chuva anunciada não veio. Todos, enfadados por uma noite intranqüila, foram se preparando para enfrentar mais um dia de trabalho. Mais tarde, por volta das 7:00 da manhã, iniciamos a nossa caminhada em direção da mata. Nesse instante, ouvimos um trovão não muito forte, mas bastante nítido. Um dos peões, que participara da torcida da noite anterior, parou momentaneamente de andar, olhou para cima e bradou: “Cala boca, seu mentiroso!”.
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