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POR UMA UTOPIA DO AFETO.
OU O AFETO COMO SUBVERSÃO.
Marcelo Alario Ennes

Subversão é uma daquelas palavras gastas pelo tempo. Afeto parece ir pelo mesmo caminho. Então resolvi juntar os dois nesse momento em que nos encontramos na difícil travessia de um ano eleitoral que parece não apresentar grandes perspectivas ... digamos, em todos os sentidos.
Imaginei uma sociedade regida pelo afeto. Assim como o mundo é hoje regido pelo consumo. O afeto seria o parâmetro objetivo (isso mesmo, com toda a contradição que merece) e básico para orientar e normatizar nossas relações no trabalho, em casa, no amor, enfim, na sociedade como um todo.
Vejamos algumas situações comuns em nosso dia-a-dia nas quais o afeto não tem peso em nossas decisões e escolhas.
Deixar um filho ou uma filha em casa doente por sermos obrigado pelo dever do trabalho, pelo medo de demissão ou do dinheiro que faltaria pelo desconto no dia do trabalho?
Internar seu pai ou sua mãe em um asilo por não ter tempo de cuidar de quem cuidou de você quando era pequeno?
Perder a paciência e explodir em casa com a esposa, com os filhos em razão dos problemas e das tensões trazidas do trabalho?
Dizer ou ouvir que infelizmente, apesar de ser uma ótima pessoa e um ótimo profissional, a empresa não poderia mantê-lo?
Derrubar árvores, matar animais e humilhar pessoas (mesmo sem querer) em nome do progresso e do desenvolvimento?
Perder um amigo em nome de uma ideia, de uma verdade que julga ser melhor do que daquela pessoa com a qual dividiu momentos preciosos de sua infância e juventude?
Façamos prevalecer a máxima segundo a qual nenhuma ideia vale uma vida.
Pois, na sociedade do afeto não seria permitido deixar um filho, uma filha, o pai, a mãe, o irmão, a irmã ou qualquer uma pessoa querida doente em casa para ir trabalhar. Nem mataríamos e nem destruiríamos em nome do progresso e nem perderíamos amigos por discordar deles.
Viraríamos as costas e deixaríamos falando sozinho, como faziam indígenas da América do Sul e da América Norte quando seus chefes os envolviam em guerras por interesse próprio, quem nos dissesse que não se pode fazer uma omelete sem quebrar os ovos, ao fazer alusão ao desenvolvimento tão necessário à humanidade. Isso quando os ovos são nossos laços afetivos ou as pessoas que gostamos e admiramos.
O princípio do afeto também serviria para pessoas desconhecidas.
- Precisamos construir uma nova rodovia. Diria um governante.
- Sim, mas com esse trajeto vamos passar sobre esse pequeno vilarejo onde vivem pessoas há muito tempo e onde construíram suas vidas.
E ao invés da famosa frase “... esse é preço do progresso”, ouviríamos:
- É mesmo? Isso não pode ser. Vejamos uma outra possibilidade!
Para quem pensa que esse princípio do afeto só nos levaria à inércia e à indolência proponho imaginar a seguinte situação. Nossos vizinhos, nossos conterrâneos, nossos irmãos estão a passar fome, estão mergulhados na ignorância, na falta de escolarização, na pobreza.
- Então vamos acordar mais cedo, vamos trabalhar algumas horas a mais, seremos mais produtivos em nome de nossos vínculos cimentados pelo afeto.
Esse mesmo princípio nos faria abandonar o caminho da destruição, nos levaria a optar pela construção. O afeto teria o poder de deixar de fazer coisas e, ao mesmo, o poder de nos fazer construir outras.
A sociedade baseada no afeto não prescinde da riqueza e do desenvolvimento tecnológico. Ao contrário deles necessitam. Aparelhos domésticos para substituir o trabalho doméstico quando esse pesar como um fardo. Máquinas, computadores e softwares para livrar do trabalho bruto e desumanizador, seja ele físico ou intelectual. Se o trabalho é repetitivo e embrutecedor, máquina nele.
Quantas dores seriam evitadas, quantas vidas seriam poupadas, quanta destruição inútil deixaria de ocorrer se pelo o afeto nos guiássemos?
Usemos o afeto para subverter o mundo.


Biografia:
Nasci em Santo André/SP em 1966. Muito cedo mudei para Ilha Solteira/SP onde vivi até os 17 anos. Conclui meu ensino médio em Bauru/SP, em parte bancado por bolsa por nadar no Clube Luso Brasileiro. Estudei na UNESP de Araraquara entre 1985 e 1998. Período em que fiz minha graduação, mestrado e doutorado na área das Ciências Sociais. Hoje vivo em Aracaju/SE. Sou professor do Departamento de Educação da Universidade Federal de Sergipe no Campus de Itabaiana. Sou casado com Sandra Archila Ennes e pais de Isabela Túbero Ennes, Arthur Archila Ennes e Felipe Archila Ennes.
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