Seus lábios têm a sede de uma gazela no cio,
garras que sempre se postam em pé de guerra,
laços que toda hora preparam o próximo bote.

Não dá mais vontade de morder, bagunçar o seu contorno sem dó,
nem tampouco fazer uma algazarra nos fios do seu cabelo sem fim,
ou mergulhar tudo que é de você nas fronhas de gozos eternos.

Não fico mais tentado a levar sua pernas para dentro de mim,
numa dança entorpecida pelas gotículas do que tinha de mais safado,
mais hibernado, mais fugido, mais condenado.

Não fico mais tentado a agarrar as rebarbas da sua alma com a ponta dos dedos, como tantas vezes repeti e repeti,
e, sem folga, sem escudo e sem remendo,
traduzir cada poro do seu corpo da forma como nunca foi untado antes.

Mas você está em outro tempo, outro mundo, outra vida,
o seu coração bate num idioma que não sei falar nem escrever,
os seus olhos parecem que enxergam tudo passando por mim,
tudo passando por mim.

Nem lembro mais do cheiro da sua pele, ou do gosto do seu suor,
estou esquecendo as nuances da sua boca, que tanto decantei,
desnudei e me embebedei sem fim, até depois de me fartar,
estou esquecendo aquela vontade mundana, rampeira e sórdida que tanto nos fez gargalhar e explodir os nossos desejos mais sagrados.

Assim vamos caminhando para o cadafalso que já se mostra rente, como nunca esteve antes. Ele nos acena num irresistível "vem pra mim, vem...!

Assim vamos desprezando o tempo que nos foi precioso, e que hoje está se tornando lixo que nem para reciclar serve mais,
que hoje está se prostrando numa barraca de feira, onde tudo está vencido, detonado, não vale mais nada. Nem para os abutres.

Dessa forma, aqueles gozos eternos vão escorrendo pelos ralos da nossa indiferença sem falar tchau, sem olhar para trás.

Nunca mais vamos olhar para trás, que grande pena, querida.

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