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LIRA EA NOITE DE NATAL
Donária Salomon

Na noite de Natal estava sozinha com o pequeno, caminhou até o portão. Logo que a senhora que morava em frente a viu, correu ao seu encontro, aflita, desejosa assim como esperasse aquele momento todos os dias e a agraciou com um abraço terno de mãe que valoriza filhos e os netos, sendo as criaturas mais importantes da vida. Foi um abraço gordo, cheio de colo onde Lira desabou, chorou sem constrangimento enquanto D. Isaura pegava o pequenino e o beijava com doçura e   alegria, pedindo a Papai Noel que trouxesse o pai dele de presente de Natal.
Lira arrastada por imensa tristeza, descobriu que para continuar a viver teria que se solidarizar, na menor das hipóteses sair daquela clausura que por si havia sido submetida.


Não dormiu nem um instante sequer, mas teimou em fechar os olhos. No entanto, à medida que as horas passavam, uma imagem surgia em sua mente... A menina sozinha vestida de combinação, exibindo na cabeça um rabo de cavalo e franja na testa, pé no chão sentindo o frescor da areia úmida. Capaz de Transformar, quantas vezes fosse preciso, o sapo em lindo príncipe.
Deitada, com a mão encostada na parede fria do quarto lembra-se do frio das rãs. Seu pensamento a transporta para junto do poço do quintal da casa do Caminho do Rio, de água clara e quente. Curiosa se debruça para ver as rãs enamorando-se para o acasalamento. Sente necessidade de mergulhar no fundo do poço, juntar-se aos girinos e assistir às imagens que os raios de sol iluminavam, os encontros das rãs que se moviam na quietude da água do poço. Na sonolência, vigilante, ouvia o trepidar da janela com o vento, os olhos grudados no relógio, o contorno do guarda-roupa destacando-se na penumbra do quarto, o ventilador diretamente sobre ela, mas estava banhada de suor, revolvia-se na cama sem conseguir dormir. Seu ímpeto de pular da cama era contido para não denunciar que estava acordada, mantinha-se quieta, junto ao silêncio que se estabeleceu entre ela e o filho que dormia. Negava-se a aceitar a estagnação de suas vontades. Aniquilava-se temendo os apelos da carne e muitas obrigações diárias, sabendo o quanto seria difícil conciliar trabalho braçal com sentimentos, emoções mal resolvidas. Encolhia-se na cama pensando no tormento. Como não havia uma linha fluída, clara, das idéias o raciocínio num abrir e fechar não permitindo que a solução escapasse para tirar o peso da sua cabeça, sabedora teria que carregar esse peso ou deitar-se sobre ele, mergulhar cada vez mais no enigma de sua existência procurando entender o que estava sendo feito dela, prestes a ser esmagada pelos sentimentos, amor e a paixão. Contava três anos essa aproximação envolvente que trouxe muita ansiedade, sabia que sentia alguma coisa que lhe doía à alma, e que ele havia de sentir com a mesma intensidade.


Noite longa, agitada, somada ao calor do verão, o cansaço do duro dia de trabalho corrido, merecedora de um bom sono, perguntava-se a todo instante, o porquê de não ter conseguindo ser feliz. Cada momento que se virava abraçada à almofada abria os olhos. Na sua inquietação as roupas escorregam-se do seu corpo. Então tira o lençol que abafa, e descoberta, a alvura do seu corpo se distingue na penumbra do quarto, o suor escaldante. A noite se torna imensa, liga o rádio e a voz do locutor da madrugada a cumprimenta, parece reconhecê-la, veio mais uma vez fazer-lhe companhia. E suas palavras soam: “Pode chorar se está triste, sofrida. Mas gostaria mesmo de bater um grande papo com você, minha amiga que chora, porque as noites são sempre mágicas. Permitem que a gente, condenada pelos horários corridos ao um grande cansaço físico e mental, mas volto a dizer as noites são mágicas, nos fazendo recuperar as energias. Ativa a infância, a esperança e o saber dos sentimentos maduros guardados no curso dos anos. E como não há encontros e as palavras não são regadas de carícias, tudo é apenas solidão”. Com essa consoladora mensagem do locutor Lira engolia o choro enquanto, atenta à voz, silenciava o conflito dentro de si para que ninguém viesse, a saber. Mas logo entra em seus ouvidos o som envolvente, suave, leve, das eternas   músicas românticas fazendo-a esquecer lentamente as realidades.   Aos poucos Lira vai sendo acalentada e tudo fica ao sabor do desejo de ser amada com ardor, seu íntimo necessitava da companhia do amado para sentir-se feliz e a música a proporcionava grandes devaneios, expressando seus desejos reais. Com o rosto úmido de lágrimas pensa no seu príncipe envolvendo-a, ainda de bruços, a pele desnuda sente o tocar das mãos que a abraça suavemente com carícias insinuantes, seu corpo enrijece de puro prazer, arrepios percorrem-lhe todo o seu corpo em suave tremor e o peito se enche de prazer, o ventre pulsa, seus pequenos e rosados mamilos intumescidos vibram eletrizados e o calor das mãos que os tocam, saciam. Uma leve sensação de fome no estômago, a mão alimenta e caminha para o abdômen que se contrai e as pernas sobem em deslizantes flexões, bolhas de prazer transbordam do pequeno orifício. A língua sobe buscando o palato em busca de oxigênio para o delirante suspiro à espera do beijo caloroso, que não vem. Sente-se desprotegida no ninho frio feito por gelo. Bem que poderia ser derretido se só de gelo fosse, tinha sentimentos calorosos na pele macia e quente de amor, paixão e espera. Os ouvidos aptos para acolher a música que embala e adormece seu corpo em muitas noites... E o amor retido em seu peito...


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