Login
E-mail
Senha
|Esqueceu a senha?|

  Editora


www.komedi.com.br
tel.:(19)3234.4864
 
  Texto selecionado
Sempre somar e dividir
Carol Gar

É um dia como outro qualquer, ela levanta-se, entra no chuveiro e só ali desperta. Toma seu café e acende o primeiro cigarro do dia enquanto pega o jornal embaixo da porta. Não tem o saudável hábito de alimentar-se de manhã, então assim que termina, simultaneamente, o cigarro e o café, escova os dentes.
Coloca uma roupa comum e segue ao trabalho caminhando. Lá encontra-se com as pessoas que convive todos os santos dias, das quais - admite - anda muito cansada.
É sempre bem recebida no escritório e trata a todos muito bem, não deixando transparecer o mínimo de hostilidade. Porém o que vê nas pessoas que convive a incomoda de fato. "Talvez por isso, pergunta-se habitualmente, é que continuo sozinha." Dissipando esses pensamentos ela volta ao trabalho. É muito ativa, questionadora e muitas vezes discute com colegas. Certa vez se estranhou com um individuo de sua mesma repartição que quis ajudá-la em um projeto. Ela perguntou se por acaso ele pensava que ela não era capaz de fazer sozinha. Não aceitava ajuda de ninguém e suas idéias eram sempre mais práticas e objetivas.
Mas foi nesse dia que ela chegou ao trabalho que muitas coisas mudaram...
Um outro sujeito pelo qual ja nutria uma certa antipatia apareceu no escritório exalando a álcool e com a roupa toda amassada (nitidamente a mesma da noitada anterior). Não era moralista, mas o fato é que seu colega de trabalho levava uma vida regada à boemias. Porém o que a deixava insadecida era o quanto ele gastava com suas noitadas. Há alguns dias atrás ela achara uma nota de um clube sofisticado da cidade no nome de Paulo Ávila Tusco (sim, ele mesmo) em meio as notas de reembolso que os funcionários costumavam pedir a empresa. O valor era simplesmente R$5.467,00 pagos por uma única garrafa de champagne. Ela sabia muito bem que era indelicado olhar as notas dos outros funcionários, pois já havia na empresa pessoa designada para tal função. Mas era como se a pasta vermelha de notas que ficava em cima do balcão nos últimos dias do mês tivesse um ímã, sempre ia parar nas mãos dela. Apesar de se relacionar bem com seus colegas, não mantinha um contato fora do ambiente de trabalho com nenhum deles e então sentia se impelida a ver como cada um gastava seu dinheiro. Passados uns dias em que ela vira a tal nota, Paulo aparecera novamente com uma aparência péssima no trabalho devido a noite anterior. Ele que, com o patrimônio que tinha, deveria andar sempre alinhado e impecável, muitas vezes, era visto como um garotão que religiosamente usava jeans italiano e camisas pólo, que gostava da ostentação, do luxo, que falava sempre com a voz mais alta e exibia um relógio à cada dia da semana. Pois bem nesse belo dia em que ela acordou normalmente e reproduziu todos os passos descritos no primeiro parágrafo, ao se deparar com Paulo no corredor da empresa tomando uma garrafa de água francesa, de óculos escuros e resmungando qualquer coisa sobre uma dor de cabeça, não consegiu segurar. Começou a falar ali mesmo o quanto Paulo era ridículo, e o quanto as atitudes dele a incomodavam. Quando ele perguntou ao que exatamente ela se referia, sem pestanejar ela o acusou de tomar seu champagne de R$5.467,00 e apresentar a conta à empresa. Todos que passavam por ali pararam para ver o que estava acontecendo, ele então sem alterar o tom da voz chamou a de bisbilhoteira e intrometida e antes que ela respondesse gritou para todos os andares do prédio escutar que naquela noite quem estava com ele no clube era ninguém mais, ninguém menos que o presidente da empresa, que promovera Paulo e o autorizara a colocar a nota no reembolso do mês já que Paulo que tivera que arcar com as despesas comemorativas daquela noite. (Era costume da empresa "mimar"seus funcionários promovidos.)
Ela então muito confusa e sem graça disse que o absurdo não era gastar o dinheiro da empresa e sim pagar um preço daqueles numa garrafa de bebida enquanto muitos não têm o que comer e passam dificuldades.
Naquele dia Paulo foi embora depois de encerrar seu expediente pensando no ocorrido da manhã. Refletiu sobre a garota que o acusara de ser um bon vivant e se perguntou se o seu jeito de levar a vida apenas incomodava pessoas como ela ou se seu estilo de vida afetava diretamente as questões sociais do país. Depois de muito pensar ele chegou a seguinte conclusão: - Eu tenho dinheiro porque trabalho.
E só trabalho porque tive boas oportunidades.
Depois de chegar à essa conclusão resolveu ligar para sua colega de trabalho e questioná-la. Quem era ela afinal? Uma espécie de justiceira do mundo, ou se gostava de fazer alarde para atraír a atenção.
Depois de conseguir o número com a secretária da empresa fez a ligação.
Conversaram muito, ela pediu desculpas gentilmente o que nunca teve vergonha de fazer, e ele também se desculpou se justificando mais uma vez através dos costumes festeiros da empresa. Então ela sugeriu-lhe que como novo diretor do setor ele designasse fundos à pessoas que, como ela, encontraram muitas dificuldades nos estudos e à maioria que não chega a concluí-los. Ele gostou muito da idéia e solicitou sua ajuda para colocá-la em prática.
Foi preciso um grande desentendimento, algumas acusações e falsos julgamentos para hoje esses dois estarem trabalhando numa causa comum.
Por mais que sentimos as diferenças de nossos próximos e que nos julgamos incapazes de lidar com elas, as afinidades ainda que pequenas, somam forças muito maiores para trabalharem juntas.


Biografia:
Enfermeira, estudante de medicina e professora voluntária de literatura.
Número de vezes que este texto foi lido: 52813


Outros títulos do mesmo autor

Biografias Eu nunca vou ser uma lady. Carol Gar
Crônicas Mazelas desabafadas sobre relacionamentos amorosos e amizade Carol Gar
Crônicas Sempre somar e dividir Carol Gar


Publicações de número 1 até 3 de um total de 3.


escrita@komedi.com.br © 2024
 
  Textos mais lidos
JASMIM - evandro baptista de araujo 68995 Visitas
ANOITECIMENTOS - Edmir Carvalho 57910 Visitas
Contraportada de la novela Obscuro sueño de Jesús - udonge 56745 Visitas
Camden: O Avivamento Que Mudou O Movimento Evangélico - Eliel dos santos silva 55820 Visitas
URBE - Darwin Ferraretto 55076 Visitas
Entrevista com Larissa Gomes – autora de Cidadolls - Caliel Alves dos Santos 55008 Visitas
Caçando demónios por aí - Caliel Alves dos Santos 54886 Visitas
Sobrenatural: A Vida de William Branham - Owen Jorgensen 54872 Visitas
ENCONTRO DE ALMAS GENTIS - Eliana da Silva 54776 Visitas
O TEMPO QUE MOVE A ALMA - Leonardo de Souza Dutra 54737 Visitas

Páginas: Próxima Última