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A ÚLTIMA FESTA
Leonardo de Souza Dutra

A ÚLTIMA FESTA


     Desfez-se em pranto, ele notara e não pode fazer nada. Procurando se informar sobre o que poderia ter acontecido, deixou o pensamento levá-lo bem longe, tão longe que lhe foi difícil retornar em tão pouco tempo. Para poder revelar este mistério.
          
     Era deveras cansativo, não teria tanto tempo para isso. Ela simplesmente manifestou diante dele um leve sorriso quase sem expressão. Não poderia realmente entender, pois a muito, muito tempo estivera distante daqueles belos olhos.

     - Posso ajuda-la, Etrik?
     - Não, não pode. Hoje amanheci não muito bem.
     - Você sempre me responde com evasivas e não me deixa compartilhar do seu mundo.     
          
     Sem palavras apenas com um leve ar ela o olhou de soslaio, deixando deslizar suavemente mão sobre seu rosto.

        - Meu amor, um dia saberás tudo - ele não podia entender. Suspirou longamente. Retirou-se para a biblioteca, tomando em suas mãos um livro que já desgastado pelo tempo, caia-lhe as folhas como o outono, que vai imprimindo a sua marca como estação cinza, cenário de mistério.

     Mistério que também envolvia o verão da cidade de Tostado, implacável sequidão.

     Cidade pitoresca quase sem clima, nesse tempo ainda se vivia da solidão das montanhas e da calma imposta pelo jeito manhoso dos seus habitantes. Só uma coisa contrastava com aquele cenário. Lá no centro da praça erguia-se o busto de uma personagem que tivera deixado uma triste marca na vida dos seus habitantes. E que aparentemente não causava nenhum constrangimento aos passantes que indolentes dela não tomavam conhecimento.

     Odranoel olhou por entre a fresta da porta e mergulhou na sua leitura; "E outro som mais alto se alevanta...", havia parado justamente naquela pagina e essas palavras minara sua mente e o confundia mais e mais quando lembrara das palavras de Etrik.

        -Como poderei me libertar dessa mulher?

     Odranoel envolvera-se com ela, e nesse envolvimento não podia nem mesmo pensar em deixá-la. Estava realmente apaixonado.

     - Devo tomar uma atitude - cogitou quase sem respirar.

     O dia parecia não passar para ele. Tomado de um repulsa de si mesmo, levantou-se.

     - Vai sair?
     - E sim ... - parou um pouco para poder colocar as idéias em ordem. Etrik o envolvia com um abraço e isso o enlouquecia.
     - O que ira fazer a estas horas? É tão tarde e já estaremos tomando café.
     - Não, eu preciso falar urgentemente com Inor.

     Inor representava uma barreira ente ele e Etrik, isso a deixava um tanto insegura. Mas ela não deveria deixá-lo suspeitar dessa sua fragilidade, já que para Odranoel ela simbolizava uma fortaleza, onde ele poderia ter abrigo.
          
     O velho e bom amigo Inor tinha o conhecimento desse sofrimento, mas não tivera ainda coragem de dizer-lhe. E nem sempre se pode falar a um amigo o que realmente desejamos que ele saiba, caro leitor, é que somos fracos neste aspecto. Inor não era uma exceção, era tão frágil como todo e qualquer mortal.

     Caminhou alguns passos, cruzou a praça já deserta, poucas pessoas deixavam cair conversas sobre o balcão de um boteco. Sim poderíamos chamar aquilo verdadeiramente de boteco. O dono era um sujeito asqueroso, que trajava uma roupa já gasta pelo tempo. E deixava escorrer aquele suor sobre o balcão onde deslizavam os copos muito mais sebentos que aquelas mãos.

     Odranoel olhou, veio-lhe um asco pelo aspecto triste daquele lugar e das pessoas que ali se encontravam. E ele sabia que não estava tão distanciado daquela verdade. Pois sua verdade era mais nojenta e sebenta que aquela, resignou-se, continuou sua peregrinação em busca do amigo.

     - Ah! um dia deixarei tudo isso e estarei feliz e realizado - ainda envolto com os seus pensamentos, uma mão que pelo toque imprimida em seu ombro lhe era familiar.

        -Que faz o amigo envolto com tantos pensamentos? O vejo mergulhado neles como uma nau que busca um porto seguro.

     Inor era um filósofo, daqueles filósofos, que não são forjados por escolas, nem tão pouco estão submissos a mestres, era natural sincero. Seus olhos penetram no interior do amigo e sem uma única palavra apontou para um pequeno pardal que bem perto alimentava-se de umas migalhas de pão, deixadas pelos meninos de Tostado. Cidade de poucas crianças não se sabe ao certo se a falta dos mesmo era devido a ausência do apetite sexual ou os meninos passavam ao estado de homens tão rápido que não se podia perceber.

     - O pardal - disse ele - e como os nossos pensamentos nos leva por caminhos "nunca dantes navegado". Só uma coisa temos certeza, caro amigo, é que um dia iremos deixar de sermos homens e nos tornaremos todos pardais.

     O hábito de criar metáforas era tão natural como o ato de respirar. Odranoel sempre encontrara refúgio nessas palavras intrigantes, as vezes não entendia mas sabia que elas falavam dele, e isso lhe era confortável.

     - Vejo que o amigo se encontra ainda mergulhado nesse sofrimento.
     - E sem retorno penso eu ... - suas palavras foram saindo quase sem muito sentido - já não tenho mais tempo para colocar os meus pensamentos, o ar parece-me tão difícil de ser respirado. Veja a noite como esta seca.

     Para Inor não era difícil de penetrar naquele mundo confuso. Sabedor de tudo - não irá querer o caro leitor que eu conte o que o atormentava, não seria tarefa minha, pois ainda não me encontro autorizado - de suas necessidades e do desejo de se libertar. O nome Etrik lhe veio a mente - que bela mulher - pensou. Sufocou na garganta aquele nome mais uma vez.

     - Quando vamos reunir novamente os velhos companheiros?
     - Não tenho a mínima idéia.
     - Todos estão tão atarefados, veja o caso de Odnumair e um verdadeiro escravo. Prisioneiro do trabalho.
     - Cada um, meu caro, tem a sua sina e a dele será não o trabalho e sim esse desejo incontrolável pelo vil metal.

     Todos naquela cidade conheciam a fama de Odnumair, sujeito voltado para dentro de si mesmo, vivendo apenas para o dinheiro que o corrompia a cada amanhecer. Para ele o dinheiro comprava tudo e todos, e nesse contexto permita-me o leitor, é uma verdade. Ele havia praticamente comprado a cidade de Tostato, o Padre, o Delegado, o Juiz ate mesmo o coveiro.

     Isso para os mais íntimos parecia um absurdo e aquele grupo seleto de amigos estavam tão distantes uns dos outros que seria impossível nesse momento trazer a tona todo aquilo que outrora fora possível de se fazer.

     - Devo revelar algo que o deixara intrigado, espero que o amigo não me tenha como um usurpador no seio de sua casa.

     - O que se passa?
        - Havia eu levado o Padre Oilerua a casa de Odnumair e encontrei sobre sua escrivaninha esse bilhete, o qual subtrai sem que ambos soubessem. Pude ver que a letra era de Etrik, e isso me deixou intrigado. O que fazia um bilhete de Etrik na casa daquele, daquele que desejou um dia tê-la como sua...
     Tirando do bolso um pequeno pedaço de papel que aos olhos de Odranoel lhe era familiar, um suave perfume foi sentido, isso fora o bastante para deixa-lo petrificado.

        -Não, não entendo - sua voz embaçada – dê-me, dê-me.

     Inor colocou o pequeno pedaço de papel nas mãos de Odranoel, que naquele momento era tão "lourde" sendo difícil abri-lo, tateou com os dedos todo o papel, relutando ainda para não acreditar, mas continuou seu calvário.

     Estava escrito: "CARO ODNUMAIR, TUDO CERTO DEVEMOS NOS ENCONTRAR NÃO MAIS EM SUA CASA. O QUE COMBINAMOS NÃO PODERA SER COMPARTILHADO COM MAIS NINGUEM". (Etrik)

     O mundo estava ruindo debaixo de seus pés, seu semblante era funéreo. Inor não tivera avaliado ainda o houvera feito.

     - Calma, amigo, não tire conclusões sem provas.
     - Isso é uma prova. Tudo agora se encaixa, a maneira como ela me tratava, como agia, sua indiferença. T-R-A-I-D-O-R-A!

     Tomado de uma fúria incontrolável correu apressadamente a casa daquele que lhe parecia ser o pior de todos os homens. Parou diante da casa o silêncio reinava, tudo estava quieto. Entrou lentamente, a porta foi aberta. A fúria havia-lhe deixado ensandecido, encontrou sobre um console uma pistola, tomou-a e dirigiu-se para o salão principal da casa a luz estava apagada, o silêncio era ensurdecedor e tomava conta do cenário. De repente luzes foram surgindo como que do nada e um grito em coro inundou toda a sala: HAPPY BIRTHDAY TO YOU!

        Tomado de surpresa Odranoel que a muito tempo vinha sofrendo do coração teve um enfarte fulminante, morrendo no dia do seu aniversario.

LEONARDO DUTRA          
          


Biografia:
Sou poeta, escritor, professor da Faculdade Escritor Osman da Costa Lins - FACOL, Servidor Público Federal da FIOCRUZ, Bacharel em Ciências Jurídicas, Auditor, Especialista em Gestão Pública Municipal - UFRPE. Amante da vida nascido da constelação zodiacal de aquários, natural da terra do frevo e do maracatú, Recife - Pernambuco. Mas quem sou eu? Sou os livros que li, Sou os momentos que vivi, Sou a infância vivida, e a vida repartida entre o desejo de ser e permanecer, Sou os amigos conquistados e os beijos roubados de sonhos que já sonhou, Sou a lágrima chorada, sou a tapa da cara que o outro lado virou, Sou da pedra que apedreja a morte que não enseja a dura sombra da dor. Sou o teu riso que belo afaga a face Da tua cara, quando da mão que acalenta amor. Sou o amor que dei, e os amores que não sei, As viagens que em grandes rios naveguei. Sou assim a vida que vaga. Na busca de tua vida para poder viver no mais o teu amor. Sou eu... Leonardo Dutra
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