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O filme francês “Mon Oncle”
um olhar atento sobre os personagens marginais
Gilson Borges Corrêa

Resumo:
Uma pequena crônica sobre o filme Mon Oncle, de Jacques Tati, tentando conceituar os personagens marginais na história que tem como mote principal a tecnologia modelando e padronizando pessoas.

Esticando um olhar mais aprofundado sobre os hilários e às vezes, patéticos personagens de Meu tio, “Mon Oncle”, com a direção de Jacques Tati (1958), observa-se, numa análise, ainda que de forma despretensiosa, características marcantes de personagens que talvez servissem apenas de contraponto para o desenrolar da trama. Na verdade, todo o conteúdo e análise dos diferentes tipos que tecem a urdidura da história já foram exaustivamente explanados em muitos artigos espalhados na rede ou mesmo publicados em periódicos especializados. Fica-nos, portanto uma pequena abertura, um buraco na fechadura, que em algumas vezes passa desapercebido, mas que ao conduzirmos a linha do olhar até o horizonte, acompanha-se, por certo, a trajetória do fio que enverga e sustenta a pandorga no ar. Falo de Gérard, o filho do casal, que ao lado do tio considerado subversivo aos conceitos da sociedade burguesa, e alienado da comunidade familiar, descobre novos horizontes em sua vida rasteira. Ao reunir-se aos meninos do outro lado da cidade, da periferia, montando as varetas de bambu, soltando pandorgas, atravessando caminhos íngremes, atirando pedras, escondidos atrás das montanhas e rindo-se sem parar, ao perceber as pessoas distraídas pelas pedras ou pelos gritos, chocam-se com o poste que lhes servia de obstáculo à passagem. Trata-se de uma alegria genuína, inocente, verdadeira, real, distante das armadilhas da pseudo-tecnologia ultra moderna, do padronizado exercitar-se na casa, do inalterado programa de todas as manhãs e noites, seguindo como de praxe, o senso comum. O progresso como fonte principal de satisfação, a ostentação, o luxo, a hipocrisia, a frustração, a humilhação, a padronização de procedimentos, o resvalar na mediocridade cotidiana. E lambuzar-se dela. O tio, Senhor Hulot, por seu lado, conduzindo o menino, conduz a sua própria identidade, evitando ser aviltada pelo emprego oferecido pelo cunhado.
Emociona-se com a elegante inocência da jovem andando de bicicleta, com o sorriso generoso do sobrinho e seu olhar arguto e perspicaz, com a vida que brota lá fora. Ao ingressar no mundo sectário, dividido sem partilhas, não se ajusta aos padrões identificados pela sociedade. Marginaliza-se, mas aquieta o coração, quando observa que o sobrinho aprendeu alguma coisa. Deixou a pele vibrar com uma lufada de vida, que lhe permitira aos poucos abrir o coração. Quem sabe não influenciará os da casa, desde que suas mentes e corações não se acovardem com o conforto aparente de quem se sente assim protegido e forte?



Biografia:
Bibliotecário e escritor. Literatura é respirar com sofreguidão a vida, nutrindo-a de sentido.
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