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Pseudônimo desvirtuado
Flora Fernweh

Minha poesia não existe fora do mundo que inventei, e não poderia ser de outra forma, porque nasci como poeta quando comecei a ter olhos diferentes para a vida. Crio dramas e histórias que não cabem em mim nem em minha sóbria realidade, há vivências que não me pertencem e idealismos que não suportam quem sou.

Assim, escrevendo, fui apresentada à Flora Fernweh enquanto uma dimensão poética e descarnada. Foi paixão à primeira vista, e amor em cada potencialidade de me exibir sem temer quem eu era, como quem é livre pela primeira vez. Flora soube me deixar mais leve, e a escrita fluiu, ouso dizer que ela foi a musa a qual eu precisava pertencer. Sou grata, com ela posso ser quem sou e também quem eu sempre quis ser. F. F. me faz florescer longe das barreiras naturais da identidade civil, e é um acalento à minha excentricidade literária.

Me corroi, no entanto, saber que meu pseudônimo vem perdendo sua razão de ser. Suponho que seu propósito foi deturpado pelo orgulho em ser transparente com a produção própria e por acharem que busco admiração em troca de algo que me é simplesmente tão natural quanto respirar. Por vezes, minha escrita é ousada e pouco diz respeito à pessoa que bate nas teclas e faz o texto acontecer, na maioria das vezes, o dom sublime não se explica senão por aquilo que se passa tão somente com Flora.

Já me sinto arrancada daquilo que há de mais íntimo na fagulha da letra, receando compartilhar meus desejos e minhas verdades. Não ter um codinome de confiança me deixa à beira das mentiras que conto a mim mesma, em fuga do campo da invenção artística. Um pseudônimo nunca trai seu escritor, a menos que este assim o permita. Pergunto-me em qual momento agi sem desvelo, e cheguei à conclusão de que talvez eu tenha errado quando o compartilhei com aqueles que não têm compromisso algum com a poesia ou que não padecem desse afã, que não me traz severas recompensas, e esse é o seu intento.

Vou me desconhecendo aos poucos ao perder a confidente de quase todos os meus segredos, porque há sempre algo lá no fundo que sabemos e que não abrimos a mais ninguém. Porém, ainda há chances de recuperar esse elo enfraquecido sem que eu parta para outra fantasia que acoberte a escrita que sei emanar, sem que sejam necessários outros heterônimos à la Fernando Pessoa. Não tenho requintes de personalidade nem uma tendência temática que justifique um poeta distinto para cada viés, porque sou muitas em uma só, e nisto reside a minha sofisticação e o meu delírio.

Meu coração apenas quer continuar sentindo com gravidade tudo aquilo que desequilibra o espírito e provoca a manifestação poética. Minha mente apenas deseja continuar sendo agraciada com essa faina a qual me doo com disciplina e sem a qual desaprendi a existir. É um mistério o que me rodeia, e não consigo encarar sozinha tudo o que me atravessa, prefiro sustentar esse enigma com ela, que é a parte mais importante de mim. O que posso dizer, por hora, é que não está em meus planos abandonar Flora Fernweh, isto significaria abandonar a poetisa que me habita e renunciar à minha essência, seria uma decretação plácida da morte mais funesta de minha vida.


Biografia:
Sobre minha pessoa, pouco sei, mas posso dizer que sou aquela que na vida anda só, que faz da escrita sua amante, que desvenda as veredas mais profundas do deserto que nela existe, que transborda suas paixões do modo mais feroz, que nunca está em lugar algum, mas que jamais deixará de ser um mistério a ser desvendado pelas ventanias. 
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