O Manifesto Antropofágico, publicado no início do século XX por Oswald de Andrade, propunha a manutenção dos ideais nacionalistas, em uma metáfora de incorporar conceitos externos necessários e regurgitar aquilo que estivesse na contramão das formas genuinamente brasileiras de expressão cultural. No entanto, é nítida a propensão do brasileiro em priorizar tudo aquilo que advém de fora do país e desvalorizar o produto nacional. Nesse sentido, pode-se inferir que o complexo de vira-lata persiste latente na mentalidade de muitos brasileiros em razão do desconhecimento acerca do valor cultural próprio, fato que corrobora com a possibilidade de uma crise identitária em nível pátrio.
Em primeiro plano, convém ressaltar que apesar de os meios de comunicação facilitarem o acesso à informação, no Brasil as mídias podem ter por outro lado, o efeito inverso, uma vez que a massificação dos costumes proporcionada pela internet e conceituada pelos pensadores Adorno e Horkheimer, padroniza os gostos tendo como base os valores sociais ditados pelo modelo capitalista. Dessa forma, muitos saberes e práticas culturais locais são relegadas ao segundo plano. Para exemplificar tal afirmação, pode-se citar o significativo arsenal de músicas, pinturas, danças e obras literárias cuja existência é por vezes ignorada.
Outrossim, verificam-se contradições a nível político, visto que decisões com base na ideia de apagamento da história nacional em razão do potencial de questionamento que o conhecimento possibilita, são fenômenos comuns em governos autoritários, que enxergam no advento da globalização, um meio de desviar a atenção dos cidadãos para um foco exterior que pouco lhe diz respeito, o que impacta fortemente seus vínculos culturais. A partir disso, sendo os jovens a esperança de que o referido quadro se inverta, eles ainda constituem a parcela mais vulnerável à problemática identitária que se visualiza.
Portanto, diante de uma conjuntura social que escancara o predomínio de comportamentos relacionados à síndrome de vira-lata, não se pode negar que a referida mentalidade assemelha-se a um tipo de violência, visto que inferioriza elementos culturais em detrimento de hábitos importados, o que consolida um epistemicídio, tal qual a frase atribuída a Jean-Paul Sartre: “A violência, seja qual for a forma como ela se manifesta, é sempre uma derrota”. Ou seja, a persistência de tal complexo é uma forma de auto aniquilamento, e em última instância, um descaso com a singularidade por anos construída.
|
Biografia: Sobre minha pessoa, pouco sei, mas posso dizer que sou aquela que na vida anda só, que faz da escrita sua amante, que desvenda as veredas mais profundas do deserto que nela existe, que transborda suas paixões do modo mais feroz, que nunca está em lugar algum, mas que jamais deixará de ser um mistério a ser desvendado pelas ventanias. |