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O mundo secreto das reuniões
Mario Bourges

Lá estou indo eu, mais uma vez, para a reunião. Para mais uma das intermináveis e insuportáveis reuniões, pensei. Daquelas que ninguém se entende. Onde todos querem falar alguma coisa, como que sentindo a necessidade de dizer algo, dizer por dizer, nem que não fosse importante para a empresa ou para o seu Vanderlei, o gerente do setor. Gerente este que vive perdido entre a papelada dos assuntos a tratar, e que passa horas de seu expediente para organizar os papéis, mas que, quando posto em dúvidas, coisa fácil de acontecer, bagunça toda aquela famigerada pasta marrom em busca de tabelas, organogramas, estatísticas, ou sei lá mais o quê. Tudo para esclarecer as possíveis dúvidas, que sempre há pelo menos uma dúzia delas para cada encontro, e as dúvidas são tanto dos subordinados quanto do próprio subordinador.

Então assim que cheguei na tal sala de reuniões me deparei com o seu Vanderlei de joelhos sobre sua cadeira. Sendo que esta cadeira, por sinal, é toda manchada pelos infindáveis cafezinhos que servem nestes eventos. Ele estava com a cabeça baixa e as mãos espalmadas sobre a mesa de tampo de vidro enquanto balbuciava, entre um filete de baba e outro, alguma coisa, impronunciável, claro. Porém, esses efeitos, essas coisas, podem ser explicadas, pois a pessoa que passa a freqüentar uma sala deste tipo, depois de um tempo aproximado de cinco minutos, começa a sentir enclausurado, asfixiado, e com a sensação de que todos ali estão te perseguindo. Se bem que, na maioria das vezes a perseguição acontece de fato. Mas o que quero dizer é que estas sensações podem ser causadas pelos cheiros de fritura encalacrado nas cortinas, e de fumaça de cigarro que sempre paira sobre as cabeças dos que lá ficam. Além, é claro, do clima tenso gerado pelas incalculáveis discussões, e que geralmente nos levam a crer que atos insólitos como estes não levam à lugar algum.

Bom, sem saber por que motivo o velho Vanderlei agia daquela maneira, como aliás nunca sei por qual motivo ele age, procurei se o mais profissional possível, ignorei tais esquisitices e perguntei ao nosso pouco estimado gerente qual seria a razão para mais uma dessas tolas reuniões. Espantado com a pergunta ele olhou para cima, em seguida olhou para os lados, e depois me olhou por alguns longos minutos, e, não satisfeito, ele continuava a me observar com um olhar atônito sem expressar reações conclusivas para esta pergunta que, acredito eu, deva ter causado um colapso em seu sistema neurológico, um tanto quanto primitivo. Contudo, outros tantos minutos se passaram, e então, após mais uns minutinhos de espera a resposta saiu da maneira mais destrutiva possível: não sei! Cuspiu-me assim tais palavras enquanto procurava um lenço para enxugar o suor de seu rosto carunchado e sebento.

Em seguida ele voltou a se congelar e a me observar por mais uma vez. Quanto a mim, estupefato fiquei momentaneamente ao saber desta infeliz realidade. No entanto não me aborreci nem fiquei com seqüelas por esta revelação. De certa forma já estava preparado... Sabe; até já me sentia maduro o suficiente para entender tudo isto. Assim sendo apenas dei meia-volta com meus sapatos novos de pelica e fui-me embora para minha sala. Larguei a pasta com as inúteis anotações que fiz na minha mesa, liguei o computador, afrouxei a gravata e rumei à sala do cafezinho para jogar um pouco de conversa fora com o pessoal de outro setor que não o meu, pois minha turma estava se perdendo na sala de reuniões, e obviamente, se perguntando o que foram fazer lá.


Biografia:
Sou jornalista de formatura, fotógrafo na prática e escrevo sempre que me é possível, pois vejo nesta atividade uma válvula de escape do cotidiano.
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