ALMA E VOZ DE UMA CARRETA
Sei dos andantes e tropas
e o barro dos aguaceiros...
Sei do grito culatreiro
me cobrando ir adiante!
...Sou eu o pranto cantante
que embala a troca das luas
no colo da estrada nua
que torna o perto, distante.
Mal comparando, um relógio
que faz o seu próprio tempo!
Às "vez" com pressa. Outras, lento
- entre o antes e o depois -
Na poeira que já se foi
deixo rastro e identidade...
...e divido a minha saudade
com o berro grosso dos bois.
Nem sempre carrego a forma
perfeita no meu desenho,
mas firme em pé me mantenho
por meu feitio de madeir.
...Já cruzei muita porteira,
recortei tanta invernada...
Mas sempre voltei à estrada,
esta sim, pra vida inteira!
Embora tenha comigo
cicatrizes dos caminhos
e conheça bem o espinho
da picana no meu corpo,
assim - de pouco conforto -
eu vou, com anos na escolta...
...E as tuas pernas cambotas
são o meu semblante torto.
Porém, não choro minhas penas,
tocando légua por frente...
Neste viver diferente
onde faço e sou fiador.
...E a sede do corredor
entrego aos lábios da sanga...
Pois, quem vem por sob a canga
também compreende esta dor.
Quando quieta, ergo morada
num descanso disfarçado...
E meus olhos, já cansados,
cuidam homens de baeta.
...Espelhando a noite preta
que se apura em ir embora,
pra que o silêncio de outrora
ouça o que diz a carreta.
|