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Mega-Sena
T. Richter

Saiu um ganhador da Mega-Sena acumulada essa semana. Faturou sozinho 47 milhões. Pelo menos é o que os veículos da grande mídia dizem. Tenho um pé atrás com Mega- Sena e outros jogos similares. Sempre me vem à cabeça o que o Orwell falou sobre a loteria em seu “1984”.
     Minha família até costuma jogar, em especial aquela que corre no ano novo, a tal “da Virada” ou algo assim. Em geral quando se acerta um único número dentre os sorteados é muito. Dois acertos é fato muito raro. Eu prefiro o turfe. Não é mais honesto, mas pelo menos tem mais estilo. Se bem que eu também não ganhei... pudera... joguei no azarão só por farra...
     De qualquer forma... aceitando, a guisa de especulação, que não existe manipulação nem nada do gênero... 47 milhões tirados da cartola assim... é muita grana. Não sei bem o que faria se fosse o ganhador... não sei nem o que pensaria, aliás! Tanto dinheiro assim é quase algo abstrato para mim, que nunca cogitei seriamente ter algum dia nem uma parcela disso nas mãos.
     O que faria? Eu continuaria a trabalhar? Bem... no meu emprego atual, definitivamente não. Apareceria só para me despedir dos colegas. Talvez nem isso. Acho que continuaria escrevendo, entretanto. Faz sentido, já que escrevo sem pensar em fazer fortuna. Não faria muita diferença.
     Também acho que iria para algum lugar bastante distante... Ilha de Páscoa, provavelmente... Quem sabe a Ilha de Mann? Talvez Santa Helena, onde Napoleão Bonaparte passou os últimos anos de vida. Um pingo de tinta perdido no mapa... Bom lugar para um exílio, imposto ou voluntário.
     Cairia fora sem deixar endereço. Mesmo que não fosse para um torrão de terra esquecido no meio do azul, me mudaria. Assim evitaria conhecidos e vizinhos que jurariam ter sempre me tido em alta conta e me considerarem grande (talvez o melhor) amigo de infância; ex namoradas aparecendo para dizer que nunca me esqueceram e que descobriram recentemente que fui o grande amor da vida delas e também parentes distantes ou desconhecidos que subitamente descobriram a importância dos laços familiares e que família, afinal, é o que importa.
     Não ficaria para aproveitar minha súbita popularidade, isso é certo. Nunca fiz questão de ser popular mesmo. Continuarei o mesmo sujeito mal-humorado, destoante e meio isolado de sempre. Não... não é bem assim... tornaria-me totalmente isolado, a diferença é que não mais por falta de interesse próprio ou alheio, e sim por necessidade.
     No mais... não sei... talvez aquele mochilão por toda Europa de trem, que eu tanto sonhava nos tempos da faculdade. Ou então aprenderia a velejar e compraria um iate para combinar com a minha barba. Acho que o batizaria de “Karabudjan”, como o barco do capitão Haddock. Sim, pode dizer que é ridículo, mas se eu realmente tivesse ganhado na loteria, baterias palmas para o nome escolhido, tenho certeza. Obviamente teria companhia nisso tudo. Sou um tanto solitário, mas não um eremita recluso. E é bem provável que eu comprasse um par de botas de caminhada novas.
     Não tenho mais nenhuma certeza do que faria nesse caso hipotético de repentina riqueza. Como eu sequer jogo na Mega- Sena, não preciso esquentar a cabeça decidindo tais coisas. É um alívio, pois não é tarefa fácil. Ficam apenas as duas acima definidas mesmo. Ou talvez não... vá lá...uma terceira e última: levaria o cachorro conosco, para a Ilha de Páscoa ou seja lá onde for.
Exceto se ele passasse a fazer mais festa e a abanar mais o rabo do que o normal. Sem interesseiros por perto seria a norma e não comportaria exceções.
                                 Meados de 2016

*Originalmente publicado no extinto fórum do Bar do Escritor

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