Quantos morreram de amor para que a poesia
vencesse as garras da noite mais fria,
quando o escuro atingia seu ápice,
Lorca era abatido a tiros,
um poeta, ferido,
se jogava contra os pontiagudos vidros,
outros tiravam a própria vida,
a poesia não os abastecia,
não era a eles, comida...
Quantos apagaram versos que sabiam ser verdadeiros,
eram apagados por inteiro, e nós,
que passeávamos pelas alamedas do destino
ríamos com os poetas absurdos,
com os escritos que aos surdos
eram como pedras atiradas nas janelas,
palavras impróprias à vidas singelas...
Quantos cadernos estão guardados no fundo falso das gavetas,
atingidos pelo punho sedoso da solidão,
as palavras, envelhecidas,
misturam suas cãs à vida,
erguem ao alto do infinito
seus miúdos gritos,
e nós, ansiosos por comida,
bebemos o líquido vermelho
que cai de suas pétalas,
nobre alma oferecida...
Quantos espiam pelas janelas das poesias
seus sonhos que caem como gotas de chuva amanhecida...
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