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DE PERNAS PARA O AR
FRANCISCO MEDEIROS QUARTA

Dei um grande trambolhão,
E, naquela confusão,
Bem duvido se nasci!
Mas podem acreditar
Que não irei gaguejar,
Ao descrever o que vi...

Fui ao mar, numa carroça;
Um bispo fazia troça
Dum pacato romancista.
Além, muito alvoraçada,
Vi uma rata assanhada
Chamar um urso fascista.

Entrei, depois, num cartório:
Bebendo um supositório,
Mestre burro legislava;
Um pachorrento advogado,
Puxando seu atrelado,
Tranquilamente zurrava...

Na serra peixes contentes,
Compravam pastas de dentes,
Para esfregar na bexiga.
Julguei ter um pesadelo
Ao encontrar um camelo
Namorando uma formiga...

De baloiço entrei na lua,
Aonde uma catatua
Concertava um gravador.
Apaixonado, um golfinho,
Tenta dar o seu beijinho,
Chamando à lebre estupor...

Nas aulas, um caranguejo,
Que é professor de solfejo,
Vai desentupir sanitas.
Um rouxinol democrata,
Dando o braço a uma batata,
Vão comer baratas fritas...

Passa agora um estudante:
Numa cisterna ambulante,
Quer-me vender malassadas.
Preguiçosa, a cozinheira,
Só pensa na brincadeira,
Não estuda as tabuadas.

Sagaz a fazer batota,
Vejo um pinto, em sua mota,
À conquista de eleitores.
Fez bastantes disparates,
Que o seu país de tomates
É já casa de penhores...

Fui bailar ao cemitério.
Num casino o pranto é sério:
Que gritos mais aflitos!
São os pobres dos defuntos
Que, chorando todos juntos,
Rezam por alma dos vivos!

Que fúnebre solidão!
Para enfrentar o Verão,
Temos de usar gabardinas!
Mas, se o Inverno chegar...
Isto é que vai ser de nadar,
Noite e dia, nas piscinas!

No rio, o trigo viceja.
Cresce, no forno, a cereja,
Germina o bronze, no prado.
O morcego bate sola,
O porco toca viola,
Mia a pulga, no silvado!

A pequenina baleia
Continua urdindo a teia,
Por uma parede acima.
Consultando um dicionário
Vejo um macaco ordinário
À procura de uma rima!

Sentada num foguetão,
De anzol enorme na mão,
Caminha, azeda, uma enguia
Vai arrancar um temor
Dum besugo pescador,
Vítima de leucemia...

E a vida lá continua,
Com ladrões em plena rua,
Proclamando honestidade.
E nas prisões, que nos resta?...
Estão cheias de gente honesta.
Que anseia por liberdade.

A fêmea, lavrando a terra,
Barafusta, contra a guerra,
Mas, trabalha, sem descanso.
E em casa, o pobre marido,
Coitado, todo torcido,
Já deu á luz um crianço!...

Loucos, tomai o poder,
Pois dá gosto obedecer
A quem sofra do miolo.
E digam se este poeta,
Com saídas de pateta,
Não parece um grande tolo!...


Este texto é administrado por: ANTÓNIO MANUEL FONTES CAMBETA
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