Não procuro nada...
Nem sei onde estão escondidas as coisas,
o sapato que perdi num dia de chuva,
o poema de ventre aberto,
um sorriso que me caiu da boca,
a mão estendida que não toquei...
Tenho a chave da porta de casa,
o sofá, o televisor, o ventilador,
umas contas para pagar,
papéis em branco como virgens gregas,
esse ócio que me faz cada vez mais vagabundo,
essa preguiça que acho que Deus me deu...
E se eu achar alguma coisas, de que me valerá?
A estante da sala dorme poetas e pensamentos,
os vejo como caligrafia, rabiscos, argumentos,
todos mortos, só eu na sala a viver
cada palavra escondida nas entrelinhas,
um copo de chá, uma insaciedade estranha,
como se quisesse, nos versos quietos,
descobrir a razão do coração
bater mais acelerado
quando o poema me abraça
e me tira para dançar...
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