Pitoco era um cãozinho diferente, ele não tinha rabo.
Pitoco era o cãozinho de estimação da Bia,
e ela gostava muito de seu cãozinho.
Pitoco era amável com todo mundo, raramente latia,
raramente rosnava, e tinha por hábito ir sempre
à Igreja com sua dona.
Os outros cães ficavam do lado de fora a esperar
por seus donos, mas Pitoco não; entrava na Igreja,
assistia aos cultos sem fazer barulho e sem atrapalhar
o sermão. Ele não cantava porque não sabia cantar,
mas mexia a boca como se estivesse cantando.
Num domingo, lá do púlpíto, o pastor disse:
- Sede santos, porque eu Sou Santo,
assim diz o Senhor!
E os membros, com as "caras" redondas e baixando
levemente as cabeças e as pálpebras e a demonstrarem
reverência, responderam:
- Amém, amém!
Enquanto isso, Pitoco apenas olhava para uns e outros
e mexia as orelhas.
Aos domingos Pitoco costumava acordar cedo
e punha-se a latir para acordar a Bia e seus pais.
E então, começava a correria. A escova, a pasta,
a barba, o banho, a roupa, o terno, a gravata, o nó,
o vestido, o sapato, as sandálias, o gel, o creme,
e a pressa. Um resmunga daqui, outro resmunga
dali, e ninguém se entende. Mas Pitoco só a olhar
para um e para outro e a esperar pela hora de ir.
Num desses domingos, depois da correria,
ao chegar na Igreja e Pitoco colocar-se em
seu lugar preferido, assentado sobre as patas
traseiras, bem à frente de sua dona, ouve o
sermão em que o pastor diz:
- Amai a Deus sobre todas as coisas,
e ao próximo como a si mesmo!
Neste momento, Pitoco flexiona a cabeça e olha
fixamente para Bia, como se estivesse a falar
do seu amor por ela e a cobrar, dela, a mesma
atitude.
Então, ela responde:
-Amém! Amém!
E o pastor continua a fazer o seu sermão seu sermão:
- De ninguém falai mal, porque disto
Deus não se agrada!
Nesta hora, os membros da Igreja se aquietam,
num silêncio de espantar. Ninguém se atreve a olhar
para o lado, e um ao outro não que encarar. Mas Pitoco
que nunca falou mal de ninguém, embora alguns, dali,
dele já tivessem falado mal. Pitoco nunca revidou,
considerava como águas passadas, talvez por isto,
entre outras coisas, hoje todos o admiram e
fazem questão de dizer que gostam muito dele.
Naquele dia, porém, Pitoco, ao sair da Igreja,
foi atropelado por um veículo que trafegava
em alta velocidade, e, no mesmo instante, morreu.
Todos os membros da Igreja choraram a sua morte
e naquele mesmo dia fizeram o seu enterro. Mas
nunca esqueceram do cãozinho Pitoco.
Todos sentem a falta que ele faz, seu lugar está vazio;
os membros da Igreja dizem até que Pitoco era crente
e que se cães herdarem o céu, ele, com certeza, estará
entre eles.
Mas apesar de Pitoco ser considerado quase um santo,
por ter frequentado uma Igreja Protestante,
nunca buscaram saber se durante a sua vida de cão
ele tenha feito algum milagre. Nunca mandaram para
o Presidente Nacional das Igrejas o Pedido para sua
Canonização.
Moral da história:
Cachorro bom, mas sem manto,
era o cachorrinho Pitoco,
nunca se fazia de santo,
nem era santo do pau oco.
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