Verônica chegou atrasada à coletiva de imprensa. O assessor ainda passava algumas regras, antes do inicio da entrevista. Desviou-se de uns auxiliares. Puxou o crachá escondido dentro da blusa e mostrou-lhe para o segurança. Abriu o bloquinho. Com a caneta segurada pelos dentes, passava as folhas, já preenchidas com falas de especialistas, povo-fala e, continha até a declaração do Ministro envolvido em escândalo. Ela procurava uma folha em branco. Não encontrou.
Era uma entrevista muito importante com o Governador. Ele iria anunciar investimentos para evitar mais tragédias no período chuvoso. Verônica pegou o celular. Nem câmara tinha. Fuçou, fuçou até que encontrou um gravador.
– Odeio esse troço, trabalho dobrado –, resmungou, e recebeu um nariz torto de uma repórter de Tevê.
O governador entrou.
– Boa tarde! – Disse sorridente.
“Como assim boa tarde? Tanta gente sem casa por ai. Crianças morrendo de fome e sede. Tanta gente nos hospitais com micose. Hoje eu pego esse cara!”, pensou a jornalista.
– O senhor está ciente de quantas famílias estão desabrigadas? – Perguntou Renan Castro, repórter de uma rádio.
– Não. Isso você pega com a Secretaria de Habitação.
– Quanto que o senhor irá disponibilizar para restaurar estradas? – indagou outro repórter.
– 30 milhões.
– Só para as estradas governador? – Perguntou Verônica, indignada.
– Sim senhora!
– Mas esse dinheiro é todo o montante disponibilizado pelo governo federal. E os investimentos para os desabrigados, para construção de escolas, já que as outras desabaram? Tudo está devastado, senhor. – Pinicou Verônica, o nariz do Governador.
– O importante é que todos os desabrigados estão num alojamento. E não estão no relento.
– Há quatro meses Governador. O senhor gostaria de ficar, mais de quatro meses debaixo de uma lona? Vendo seus filhos ficarem sem escolas?
O ultimato:
– A senhora está me afrontando? Em qual jornal trabalha?
– Escrevo no blog Acesso Livre! – Respondeu.
– Blog o que?
Alguns jornalistas começaram a se exaltar.
– Vai responder não?
– Assim que você sair daqui! – Disse convicto o governante.
– Mas você...
– Não respondo a mais ninguém, se essa blogueira não sair daqui! – Falou levantando-se.
– Por favor, nos acompanhe. – disse um dos seguranças.
Ela, desapontada, saiu com o rabo entre as pernas. Mas antes disse com eloqüência:
– Com essa roubalheira, jamais se resolverão os problemas do povo. Jamais!
No dia seguinte nas capas dos jornais: “Governo anuncia 30 milhões para construções de estradas destruídas pela chuva”.
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Biografia: Yago Sales, 17 anos, nasceu, estuda, trabalha, vive e busca inspiração em Goiânia, capital de Goiás. Escreve para lavar a alma. Tem inúmeros textos publicados em jornais, blogs, sites.
Blog: www.blogacessolivre.com.br |