Fechou os olhos e uma a uma as gotas foram brotando de sua face, como respingos da vida idealizada.
A chuva era como se fosse seu túnel do tempo. O botão que apertasse o caminho de volta.Vontade de ser pequena, pequenina como sua avó a chamava.
Saudade de sorrir a esmo. Lambuzar a cara de mel.Olhar-se no espelho e sentir a sensação ilusória de que já era adulta o bastante para se mascarar, como fazia sua mãe todas as noites.
Dormir.Em sua infância a mágica do dia dava lugar a sombras fantasmagóricas, seres noturnos que a atormentavam com seus gemidos, suas unhas afiadas, seus olhos prontos a sair das órbitas.
O sol sempre foi sua salvação. O ar que necessitava para continuar pela manhã aquilo que as trevas da noite havia interrompido. A luminosidade, as nuances de cores trazidas pelo sol a brincar nas flores do quintal, na roupa estendida no varal, em suas pequenas mãos abertas em busca do mundo imaginário.
Seus castelos reais, os seres alados, as viagens fantásticas, as conversas infindáveis, a ânsia de conhecer, de ser, fazer, deixar-se ir com o vento que sussurrava em seus ouvidos, acariciava sua face e docemente a soltava no ar. Suas saias voando, seus cabelos em desalinho, os pensamentos revirados e o destemor de mergulhar no espaço sem fim.
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