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Maria Mal-Matada
Vanderlei Antônio de Araújo



Seu nome era Maria de Fátima da Silva, mas por causa das cicatrizes que trazia no corpo, devido a catorze facadas que recebera do marido, ficou conhecida pelo horroroso apelido de Maria-Mal-Matada. Levava com audácia o nome. Na época em que eu a conheci já contava bons anos, mais de cinquenta. Todos gostavam dela.
A maior parte do seu tempo vivia agradecendo a Deus por não ter morrido. Tornou-se uma mulher humanitária e muito religiosa, talvez pelo fato de ter visto a morte de perto. Também, aprendeu não guardar ressentimentos. Foi como se nascesse de novo. Tinha o coração limpo e não desejava mal a ninguém nem mesmo ao marido que a esfaqueara daquela maneira e sumira no mundo.
Casou-se aos dezesseis anos. Escolheu seu marido entre três pretendentes, por ser o mais bonito e trabalhador. O namoro durou três meses e o noivado, alguns meses a mais. Não precisava de mais tempo, dizia ao contradizer aos pais que inicialmente, eram contra o casamento por ela ser muito jovem. Mas insistiu tanto que acabaram consentindo. No dia do casório teve festa, muita bebida e dança. O pai não era rico, mas tinha algumas economias e encheu o casamento da filha de amigos.
Depois de doze anos de casados, em que tiveram muitas alegrias e nenhum filho, tudo mudou. O marido tornou-se muito ciumento e por causa disto, alcoólatra. Saia de casa pela manhã e só voltava à noite, bêbedo. Um dia, ao chegar em casa, perturbou-se, ao vê-la na porta da casa, conversando, animadamente, com um homem. Aí, o demônio do ciúme, incentivado pela bebida, tomou conta do seu corpo e da sua alma. O rapaz era seu primo e não havia nada entre eles que pudesse desaboná-la.
Ele não acreditou. O ciúme doentio, porém, não saiu mais daquela cabeça encharcada de álcool. E assim, de marido carinhoso passou a violento. Muitas vezes chegava em casa de surpresa na tentativa de descobrir alguma traição dela. Nada encontrando, iniciava uma discussão que se prolongava pelo resto do dia, terminando quase sempre em agressões mútuas. Ela respondia a altura, enfrentando-o com coragem.
Aos poucos, as relações entre ambos foram piorando até atingir um ponto insustentável. Numa tarde, ele chegou em casa bêbado e muito agressivo. Ela ficou calada, não deu atenção as suas insinuações e xingamentos. Irritado com a passividade dela, a chamou de vadia. Ela não se conteve e teve a audácia de chamá-lo de bêbedo e broxa. Disse ainda que ele estava procurando um pretexto para não procurá-la mais. Ele não gostou do que ouviu, bufou, deu murros na mesa, jogou coisas no chão e partiu para cima dela mandando-a calar a boca, ameaçando-a. Ela o enfrentou.
Calado, vai a cozinha e volta trazendo uma faca. E antes que qualquer palavra fosse pronunciada ele a agarra e com uma força descomunal que só os insanos têm, crava-a várias vezes no seu corpo. Ela tomba a seus pés se esvaindo em sangue. Pensando que a tivesse matado, ele fugiu. Nunca mais se soube dele. Maria foi levada, ao hospital, pelos vizinhos que ouviram seus gritos, e durante longos cinco dias, esteve entre a vida e a morte.
Escapou. No hospital, quando abriu os olhos, viu que estava num lugar estranho. De susto estremeceu. Pensou que tivesse morrido ao ver as enfermeiras, de pé a sua frente, todas de branco olhando-a como a hipnotizá-la. Só se deu conta de que não morrera, quando uma delas sorrindo, disse-lhe que estava num hospital. Sentiu-se aliviada, embora ainda sentisse dores, em várias partes do corpo. Quis saber por que estava lá. Disseram-lhe que havia recebido catorze facadas do marido.



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