Partindo da concepção de que a língua é histórica, quer por sua organização interna, expressa através dos conteúdos da língua, quer pelo processo de textualização, que pressupõem as condições de produção, hoje, pode-se proceder a um estudo historiográfico da língua que recorte um período no contínuo histórico
Como o estudo da língua pode ser considerado histórico, e realizado do ponto de vista social, a manifestação lingüística de um determinado período revela as marcas evolutivas da língua e também as características da sociedade, no momento de sua realização. Segundo Silva Neto (1979), a história da língua como instrumento de uma coletividade humana pode ser entendida como a história dos homens que a falam.
O olhar histórico dirigido à língua possibilita a abordagem de seus fenômenos evolutivos dentro do tempo e espaço; os fatos lingüísticos relacionam-se às circunstâncias da sociedade que os condicionou. Isso faz com que a língua sendo um instrumento de comunicação e estando em constante mudança, torne-se um objeto de contemplação histórica. De acordo com Le Goff (1996), estudar os fatos lingüísticos implica examinar os acontecimentos históricos a partir de sua representação. Assim, é a historicidade lingüística que nos remete a uma relativa efetivação dos fatos sociais, que se justificam pela subjetividade tanto da língua quanto da história, por não se configurarem uma realidade única e acabada, pois permitem uma releitura, de acordo com um novo campo de visão, seja este o da representação ou da interpretação dos fatos da língua, que conduzem à historicidade. É esta historicidade que nos possibilita a inclusão de novos elementos produzindo uma contribuição para a ampliação dos sentidos e sua atualização.
A língua sofre várias influências numa sucessão ininterrupta entre o novo e o velho que vem sendo trazido de geração a geração. Constituem esse quadro evolutivo mudanças nas palavras, mudanças de significados, criação de palavras novas e outras que caem em desuso. Tudo isso, em determinado estágio de língua, significa um nível equivalente de transformação social, e assim, temos a língua como representação da ação do homem no tempo, e sua história deve contribuir para ampliar a compreensão do presente lingüístico.
A importância do estudo de língua do ponto de vista da historicidade não está no fato lingüístico em si que pode ser trazido para o presente para ser observado, porque não é o estudo do passado por ele mesmo, mas a visão do presente em relação aos fatos passados. A Historiografia Lingüística possibilita a interação das diversas dimensões sócio-temporais, porque leva à compreensão de como se processa o desenvolvimento da língua através dos tempos e a insere no contexto sociocultural em que se realiza.
Nesse sentido, seja qual for o período que se recorte para observação de uma língua torna-se necessário que se considere suas fases anteriores porque os fatos lingüísticos, embora possam se repetir, não serão os mesmos. Por essa perspectiva, o passado é um aspecto do presente, e a história da língua torna-se o entendimento do passado no presente, no ato de sua realização, porque o estudo da língua sob a perspectiva histórica vai além dos limites do texto e do limite histórico de sua materialização. Dessa forma, a língua passa a ser produto da relação de um conjunto de elementos socioculturais que são essencialmente dinâmicos, porque o processo de historicidade da língua envolve produção e interpretação, considerando cada uma dessas realizações de acordo com seu tempo. Isto significa que, se, por um lado, a língua sintetiza e reflete o conhecimento humano de um determinado período, por outro, estimula o estudo em diferentes épocas, que precedem a sua reconstrução.
A historicidade lingüística representa um avanço no campo dos estudos históricos de língua, porque aponta para a reconstrução dos conteúdos em estudo, inserida em um contexto histórico-cultural, uma vez que relaciona o texto e o seu momento histórico.
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