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GALINHÁGUIA
ANTONIO LUIZ MACÊDO E SILVA

Juvêncio era um homem introspectivo. Falava o necessário. Dado a experiências genéticas práticas, entusiasmara-se a tal ponto que a sua cabeça não parava de conjeturar qual seria a próxima. Beirando os sessenta e cinco anos, desde os doze aventurara-se por esse caminho. Não estudara muito, mas a sua perspicácia e observação fizeram dele o que podemos denominar “um cientista amador”.
    
Solteirão, morava numa chácara nas proximidades da sede do município. Mandara construir um galpão dimensionalmente gigantesco, onde realizava todos os tipos de experiências que afloravam à sua consciência criativa.
    
Certo dia - de passagem por aquelas bandas - o vejo sentado na espreguiçadeira, contemplativo e absorto. Aproximei-me e cumprimentei-o:
- Boa-tarde, Juvêncio!
- Boa-tarde! Quem é o senhor?
- Meu nome é Zuca. Moro em Pindaú, a uns 200 km daqui.
- Já sei: está viajando a trabalho e passando por aqui parou para saber alguma coisa dos meus experimentos.
- Como o senhor foi capaz de adivinhar? Pois não é que é isso mesmo!
- É sempre assim. As pessoas ouvem falar do Juvêncio, mas não acreditam. São pessoas iguais a Tomé: têm que ver para crer.
    Comecei a ficar interessado. Aliás, o seu papo era interessante. Fui em frente no assunto.
- Juvêncio, que tipo de experiência “rola” no galpão?
- Você já ouviu falar em alfacentro? É um tipo de alface que eu produzo com gosto de coentro. E o pimentolho? É um pimentão em forma de repolho. E assim vai. Se eu for enumerar todos os experimentos, você não vai chegar em casa antes de seis meses.
- Puxa! Que coisa, hein?!
    
Nisto aproxima-se um bicho que eu nunca tinha visto. Excêntrico e bastante estranho. Veio se acercando do lugar onde conversávamos. Encolhi um pouco as pernas numa reação natural de quem está com um pouco de receio. Juvêncio advertiu:
- Tenha medo não. Ela é mansa. Só está aqui por causa da jarra de milho. Deve estar com fome. Pode ficar sossegado!
- Que bicho é este, Juvêncio?
- É a galinháguia. Nunca ouviu falar? É só no que o pessoal da cidade fala. Você não sabe porque não é daqui.
- G-a-l-i-n-h-á-g-u-i-a?!
    Juvêncio olhou para o Zuca com um olhar de reprovação.
- Você é pior do que Tomé? Ele viu e acreditou; você está vendo e não quer acreditar? É a galinháguia. Talvez eu contando a estória você passe a dar crédito à minha última experiência.
- Faz favor, Juvêncio. A curiosidade é bem maior que a minha fé. Mas, conte. Sou todo ouvidos.
    
Juvêncio pigarreou, tomou um gole de água e passou à narrativa.
- Até hoje estou por saber quem mandou aquele isopor; mas o seu conteúdo eu sei muito bem: um ovo de águia. O que fazer? Pensei... Pensei... Pensei... Por fim lembrei da xitoca, uma galinha chocadeira que não perdia um ovo. Será que dá certo? É claro, xitoca é xitoca. Entre os ovos coloquei o ovo da águia. Decorridos os vinte e um dias os pintinhos começaram a sair. Doze. Lindos! Mas o ovo da águia continuava debaixo da xitoca. Decorridos vários dias, a galinha à beira de uma exaustão, eis que a casca começa a rachar. Na tarde daquele dia não pude me conter. A alegria era demais. Eu já havia lido que a temperatura de uma galinha chocadeira, quando passava do limite dos dias, seria capaz de alterar o genoma de ovos de espécies diferentes. Está aí na sua frente. É a galinháguia. Acredita agora?
Levante e venha ver a xitoca.
    
Eu não sabia o que falar. O bicho estava ali na minha frente. Não podia ser visagem. Eu estava vendo. Levantei-me e fui ver também a heroína xitoca. Era incrível!
    
Pra terminar, Juvêncio ainda confidenciou:
- A experiência não terminou na galinháguia. Entreguei a um biólogo amigo meu um ovo do bípede e ele levou para os Estados Unidos. Prometeu que o colocaria no ninho de uma águia. Estou aguardando apenas a confirmação.
- Qual confirmação, Juvêncio?
- Desse ovo vão nascer uma galinha e uma águia. Passe aqui na próxima viagem que você vai ver. Você só acredita vendo!...


Este texto é administrado por: ANTONIO LUIZ MACÊDO
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