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ESTÁGIO: ESPAÇO DE CONSTRUÇÃO DE IDENTIDADE PROFISSIONAL
Robério Pereira Barreto

Resumo:
Este texte discutir o estágio, na prática, como um espaço de aperfeiçoamento e aplicabilidade de fundamentos teóricos na práxis educacional do graduando. Reconhecendo que, Embora nesse espaço nem sempre reconhecido como lócus de formação, é através da interação com o professor-regente e os alunos, que o licenciando inicia seu processo de (re) constituição de seu saber e prática docentes até então vivenciados na sala de aula na universidade. Palavras-chave: Estágio; Estudante - estagiário, Ensino de LE; Identidade.

     Este texto faz uma discussão a partir de recensão teórica sobre o ideário educacional criado acerca da prática de ensino e do estágio supervisionado nos cursos de licenciaturas, sobretudo Letras, pautando-se nos fundamentos legais das leis 5.540/68 e 5.692/71 até 9.394/96 combinadas com os PCN-LE/1998, posta as evidências de que teoria e prática no curso de formação de professores se constituem numa dicotomia, uma vez que são freqüentes os relatos dos estudantes sobre a falta de diálogo entre a realidade teórica apresentada na sala de aula e realidade da escola, lócus de observação e teoria acessada nas aulas de prática do estagiário na academia.
     Nesse sentido, o estágio, na prática, é um espaço de aperfeiçoamento e aplicabilidade de fundamentos teóricos na práxis educacional do graduando. Embora nesse espaço nem sempre reconhecido como lócus de formação, é através da interação com o professor-regente e os alunos, que o licenciando inicia seu processo de (re) constituição de seu saber e prática docentes até então vivenciados na sala de aula na universidade. Portanto, Prabhu (1987-1990) centraliza a discussão da profissionalização do estudante-estágiário por meio desse contato inicial com os agentes educacionais efetivamente localizados, professores e alunos.
     Por isso, se se seguirá ainda as orientações de (Tardif (2005), Perrenoud (2002), Fazenda (2002); Almeida Filho (2000); Hymes (1998), PCN-LE (1998), LDB (1996) e outros para compreende-se os imbricamentos da teoria e prática na ação docente relativa à formação de estudante-estágiário.
     Assim, o estágio precisa ser visto como lugar de aprendizagem real, e a sala de aula é o ambiente para isso. Portanto, o estudante-estágiário no curso de letras, esteja ele atuando com língua materna ou estrangeira (LE), deve levar em consideração a comunidade na qual atua, construindo um planejamento que motive a participação de todos na resolução das demandas reais para a melhoria na aquisição da língua, evitando assim, que a teoria seja evidenciada em detrimento do planejamento e da ação prática.

Dessa forma, as orientações de estágio têm sido dirigidas em função de atividades programadas a priori, sem que tenham surgido das discussões entre educador - educando, no cotidiano da sala de aula, da escola. Assim, o conhecimento da realidade escolar através dos estágios não tem favorecido reflexões sobre uma prática criativa e transformadora nem possibilitado a reconstrução ou redefinição de teorias que sustentam o trabalho do professor. (PICONEZ, 1994, p. 17).


     O estágio nesse sentido passa a ser o lugar da construção da identidade profissional do estudante, porque é a partir dai que se descobrem suas potencialidades e possíveis metodologias para resolução de processo que, no caso do ensino-aprendizagem de LE, necessita de maior observação, visto que os aprendizes mostram reações diferentes à metodologia apresentada pelo estudante-estágiário e o professor regente.


Na teoria, um profissional deve reunir as competências de alguém que elabora conceitos e executa-os: ele identifica o problema, apresenta-o, imagina e aplica uma solução e, por fim, garante seu acompanhamento. Ele não conhece de antemão a solução dos problemas que surgirão em sua prática; deve construí-la constantemente ao vivo, às vezes, com grande estresse, sem dispor de todos os dados de uma decisão mais clara. Isso não pode acontecer sem saberes abrangentes, saberes acadêmicos, saberes especializados e saberes oriundos da experiência. Um profissional nunca parte do nada, tenta não reinventar a roda, considerando as teorias, os métodos já testados, a jurisprudência, a experiência, os gêneros consagrados (Clot, 1999) e o “estado da arte (PERRENOUD, 2002, p.10)


Todavia é comum ocorrer durante a preparação das atividades, por parte dos estudantes-estágiários, subestimação ou superestimação da capacidade dos aprendizes na sala de aula, da escola, colocando em xeque as metodologias até então usadas pelo profissional da unidade escolar. Isso normalmente acontece quando o lócus é a escola pública.
     Desse modo cabe reforçar, é durante o estágio que o graduando volta-se para o desenvolvimento de uma ação vivenciada, reflexiva e crítica e, por isso, deve planejar suas atividades de maneira gradativa e sistematicamente fundamentadas em pressuposições teórico-metodológicas com vistas à resolução de problemas pontuais no ato de ensinar. “a prática profissional consiste numa resolução instrumental de problemas baseada na aplicação de teorias e técnicas científicas construídas em outros campos [...]”. (TARDIF; RAYMOND, 2000, p.2)
     Por ser uma disciplina obrigatória no curso de licenciatura, o estágio, como prática pedagógica tem papel decisivo na formação do aluno, possibilitando-lhe a inserção na prática profissional e, por isso, é pertinente que se assegurem meios para que todos os estudantes nessa fase sintam-se seguros para observar, planejar e executar as atividades nas unidades educacionais, podendo assim, realizar significativas trocas de saberes. Até porque a aquisição de saberes profissionais por parte do estudante acontece por meio de relações e trocas num contexto de trabalho, conforme Tardif afirma:

[...] o saber e sempre o saber de alguém que trabalha alguma coisa no intuito de realizar um objetivo qualquer. Além disso, o saber não é uma coisa que flutua no espaço: o saber dos professores é o saber deles e está relacionado com a pessoa e a identidade deles, com a sua experiência de vida e com a sua história profissional, com as suas relações com os alunos em sala de aula e com outros atores escolares na escola, etc. Por isso, é necessário estudá-lo relacionado-o com esses elementos constitutivos do trabalho docente. (TARDIF, 2002, p. 11).
     
     Com efeito, cada realidade cobra do estudante-estágiário, referências muito concretas e, às vezes, específicas em função da necessidade que ela atende e que são fundamentais da profissão, aplicadas àquela realidade particular. Assim, considera-se que as experiências selecionadas e que tenham algum nível de conexão e de organização com o contexto sócio-cultural, permitindo assim, que o conjunto de questões tenha ressonância para a formação do estudante como profissional de visão ampla, formando assim,


[...] o modelo do professor-pesquisador multiculturalmente comprometido pode representar uma via pela qual conexões entre o universo microssocial da sala de aula e a realidade cultural e social mais ampla possa se efetuar, com vistas a possibilitar desafios a discursos que congelam identidades e reforçam preconceitos. (CANEN, 2005, p. 3).

     Nesse sentido, é preciso que se tomem alguns cuidados na preparação e aplicação das atividades, visto que os estudantes-estágiários são motivados para a ação e, num passe de mágica querem mudar a realidade, exigindo o máximo de si e, automaticamente, transferem essas expectativas para a comunidade escolar, criando assim desconfortos entre alunos e professor regente da sala.

Desse modo, o modelo do professor-pesquisador multiculturalmente comprometido pode representar um possível caminho de transformação da desigualdade educacional que atinge, justamente, grupos culturais e étnicos cujos padrões não estão contemplados nos discursos curriculares abraçados pela escola. (CANEN, 2005, p. 3).

     
     Além disso, são notórias as dificuldades institucionais enfrentadas pelos estagiários no que se refere à defasagem de recursos. Além disso, têm-se as resistências naturais ao que é novo por parte dos professores que, na maioria das vezes, consideram o estagiário como um concorrente, sobretudo, no campo das língua(gens).
     Nesse contexto, o estágio passa a ser postulado como aglomerado de causas anteriores, isto é, o estudante é levado a recordar e aplicar conceitos e fundamentos teóricos, de acordo com a representação social na qual lhes são solicitadas ações interventivas, assim o estágio é considerado um dos pilares constitutivos da formação acadêmica do estudante, que se concebe como uma rede de crenças , saberes e desejos nomeados.
     Dessa maneira, formula-se o pensamento de que o estágio está sustentado na base epistemológica do conhecimento, pois precisa de organização científica, ou seja, o estudante deve planejar sua ação a partir da perspectiva de que a remissão aos conceitos, proposições e métodos é aportada em teorias bem definidas. No caso de estágio em língua(gens), certamente as teorias lingüísticas e ensino-aprendizagem são fundamentais, porque determinam o lugar de erudição e capacidade de sistematização do estágio a respeito da temática proposta no projeto de estágio.
     Nessa perspectiva, é importante ressaltar que, na prática, o estagiário passa a conviver com o binômio: conhecimento sistematizado – crença, sendo que as crenças advêm de determinadas concepções a respeito de determinado aspectos da realidade. Com isso, amplia-se o processo de construção e socialização dos saberes na sistematização das atividades do estágio por parte dos estudantes, de tal modo, que é preciso verificar e seguir paradigmas estabelecidos pelas “práticas discursivas” que, em sua autonomia determinam a pratica sócio-educacional.


Em várias outras ocupações – e é o caso do magistério –, a aprendizagem do trabalho passa por uma escolarização mais ou menos longa cuja função é fornecer aos futuros trabalhadores conhecimentos teóricos e técnicos preparatórios para o trabalho. Mas, mesmo assim, raramente acontece que essa formação teórica não tenha de ser completada com uma formação prática, isto é, com uma experiência direta do trabalho, experiência essa de duração variável e graças à qual o trabalhador se familiariza com seu ambiente e assimila progressivamente os saberes necessários à realização de suas tarefas. (TARDIF; RAYMOND, 2000, p.2)

     
     Para Foucualt (2000) essas formações discursivas dão conta de que há na realidade dos sujeitos do discurso – estagiário, professor e aluno – comportamentos, conflitos frutos de uma “arqueologia do saber” consignada nos relacionamentos com ideologias que, sem dúvida, cria uma espécie de cultura escolar na qual saberes e conhecimento se imbricam, pois nascem de fontes variadas: mídia, política, regionalismo, etc. A partir disso, o estágio é envolvido por vários discursos, incluindo o da cultura escolar no qual se cria, por si mesmo, uma saber específico que, na maioria das vezes, é confrontado com a realidade. De um lado o conhecimento sistematizado já incorporado pelo corpo social da escola; do outro os conhecimentos disponíveis na cultural geral, menos elaborados, provenientes do cotidiano.
     De acordo com Perrenoud (2002) é nesse momento em que o estagiário entra em conflito por que é hora de abandonar o lugar de fala de estudante e iniciar o discurso de profissional responsável “[...] está abandonando sua identidade de estudante para adotar a de profissional responsável por suas decisões.” (PERRENOUD, 2000, p. 18) e tomar decisões e responsabilizar-se por elas no âmbito da sala de aula.

O principiante precisa de muita energia, de muito tempo e de muita concentração para resolver problemas que o profissional experiente soluciona de forma rotineira. O iniciante está em um período de transição, oscilando entre os modelos aprendidos durante a formação inicia e as receitas mais pragmáticas que absorve no ambiente profissional. (PERRENOUD, 2002, p. 18).


     O estudante-estágiário constitui-se na relação com o ambiente educacional ao qual passa a pertencer e, com isso, se torna um agente de transformação à medida que inicia processo de (self-study) uma pesquisa investigativa de sua prática pedagógica, vindo, dessa maneira se auto-afirmar como futuro professor.
     Conforme Fiorentini (2004) “o futuro professor, assim, qualifica-se para estabelecer com autonomia o diálogo cultural entre esses diferentes mundos, pois é por meio dele que produz seu trabalho docente e constrói sua identidade.” (FIORENTINI, 2004, p.256).
     Do ponto de vista da didática, o estágio deverá servir como fonte de reflexão sobre os aspectos teórico-práticos do processo de ensino e aprendizagem. Trata-se da única ponte (elo) possível de tornar concreta a fundamentação teórica e a prática educacional.
     Nesse sentido, a observação em sala de aula e, também a regência de sala, passam a sustentar os pensamentos obtidos em aulas teóricas. Com isso, o estudante-estágiário emerge na realidade e passa a construir suas reflexões enquanto futuro profissional. Com efeito, isso leva ao entendimento de que

O processo didático se explicita pela ação docente; ensinar, aprender, pesquisar e avaliar; o processo didático vincula-se á relação professor-aluno por meio do conhecimento e permeado pelas intencionalidades sóciopolíticos e pedagógicas, analisando criteriosamente a cada uma das dimensões e quais os seus significados. (VEIGA, 2004, p.13).


     Assim sendo, cabe à instituição de ensino-aprendizagem orientar o estudante-estágiário na aplicação dos elementos sócio-cultural demandados pela unidade escolar onde está atuando com agente de intermediação entre o saber sistematizado da teoria e a ação prática da sala de aula.

Referências

TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional, Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.



     


Biografia:
Professor, EscritoR, Poeta, minicontista e haicaísta
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