| A casa Grande
 Uma morada acolhedora, uma casa antiga e de muitas histórias .Na sala da frente, o sustento daquela família.
 Quando passei a freqüentar à casa grande, observava vestígios da época em que nela funcionara um especial escritório, onde se registravam as  mortes e os  nascimentos.
 Eram tantas as emoções narradas pela dona daquela casa, que o sentimento nos transportava para um mundo  fascinante..
 Em sua simplicidade, a senhora uma interessante contadora de “causos”como brinca um letrado amigo, referindo-se a uma outra senhora do “era uma vez...”
 Naninha dona de sorriso meigo, ria com os olhos sempre que filhos e netos  estavam por perto...Em frente à sua casa, um banquinho em que se podia vê-la todos os dias, tão preocupada com os filhos mas também com aqueles que a procuravam para lhe pedir ajuda.
 Ao entardecer lá estava ela a conversar, a contar histórias,enquanto tornava a nossa convivência mágica...
 Eram histórias da casa grande onde durante  muito tempo, em sua sala principal,havia um cartório...
 Assim, em noites misteriosas gavetas mexiam, papéis voavam, ouviam-se vozes...Contava, também, Naninha que em um de seus sonhos aparecia alguém que afirmava haver um tesouro  debaixo daquela casa ...
 Eram narrativas mágicas em que o sobrenatural, o fantástico valorizavam-lhe a criatividade.
 Em seus  vinte e dois anos a nora caçula  dormia grudada ao marido, quando lá estava de tão assustada, já que  as histórias continuavam e ficavam, em rebuliço, em sua memória...
 Muitas vezes ríamos com as notícias daquele povo simples, sem estudo, ao registrar suas crianças.
 Perguntava o oficial do registro civil ao pai:
 __Qual o sexo... Masculino ou feminino, a resposta vinha, com firmeza: nem masculino nem feminino, senhor,é Manoel, menino homem.                                     Eram muitos os nomes  diferentes..
 Uma época o Sr. Alencar colocou no filho o nome Marlinge .E o nome ficou... O orgulhoso pai explicou aos espantados funcionários: mar de Guarapari, lin  do avô  Lindolfo, g de Getúlioe E de brigadeiro Eduardo...
 Muitas vezes quem dava o nome era o Sr. Antônio Lyra  tamanha era  a criatividade  desses pais ...Ocasião houve que um  pai quis batizar o filho com o nome “Escorrega lá vai dois.”Nesse caso, o Senhor Antônio Lyra colocou o nome que bem entendeu como era de seu hábito,em situações semelhantes.
 Um marido às avessas... Fora ele convidado para ser o prefeito de Guarapari.Época em que o prefeito era nomeado, mas não aceitou, já era vereador e não apreciou a hipocrisia da política, tomara a decisão mais sensata, segundo ele.Não quis  o cargo e aproveitou o momento de rebeldia para  abandonar  o cartório, nas mãos dos filhose foi ser pescador e dedicar-se a outras coisas não apropriadas a um bom chefe de família...
 Nas horas vagas, dedicava-se a plantações, cultivava uma bela horta, na colônia dos pescadores.
 A esposa uma mulher de fibra, cuidou dos filhos e até seu último dia de vida.Serviu com zelo a esse marido avesso às coisas corretas do lar.
 Os filhos homens lhe saíram, em se tratando de fidelidade conjugal, “tal pai tal filho...”Entretanto  em todos eles  existe  presença do  espiritualismo materno .
 Lembra-me a vez que resolvera Naninha indicar uma doméstica para sua nora caçula uma negra de um só olho , horrorosa, aceitou a jovem esposa , para não fazer desfeita... Só muito depois compreendera
 o gesto de amor de sua sogra .
 Ana, no silêncio de seu sofrimento, partiu cedo, mas Deus lhe deu oportunidade em  realizar um grande  desejo: o de ver o nome de seu pai em um de seus netos.
 Filha única de um senhor de muitas posses, mimada, tinha verdadeira adoração pelo pai.Casou-se a mocinha, mas de princesa passou a ser escrava de um prepotente marido.
 Pensando bem, não é necessário explicar os motivos que a levaram a casar-se. Na verdade, não se conhece ninguém, mas não se pensa nisso, em emoções de um grande amor...
 Com a sabedoria da alma, Naninha soube ser Família, soube ser Mãe, soube ser Avó, soube ser Amiga.Em momento algum, nós a vimos roubar a autoridade paterna. Em momento algum, deixou de socorrer a quem dela precisasse, ainda  que muitas lágrimas a  tenham acompanhado por toda uma vida...Hoje, quando vemos seu nome em coisa pública, pensamos...
 Mesmo que o marido tenha sido o primeiro vereador daquela cidade saúde, um político...
 Ana é quem  ficou na história  , no coração  e na lembrança  nossa e de todos os que tiveram a alegria de conhecê-la.
 Sem dúvida,quando homenagearam escola e outras situações  com o seu nome ,fez-se justiça a essa brava mulher, Ana Rocha Lyra, a luz, o brilho daquela  casa grande.
 Qualquer obra pública que receba  seu nome será sempre  a grande homenageada.
 Em horas difíceis, seu exemplo permanece vivo e também é mágico...
 HM
 
 
 
 
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