Parto em dois,
como argilas se dobrando.
Parto em dois,
como estrelas
se esfarelando.
Parto em dois, como
uma pão que se divide
com os mendigos.
Se sou agora é porque nem
sempre fui.
Se não, estou tentando ser.
Mas porque querem me levar?
Nada mais importante do que
você se pertencer e não
pertencer a nada.
Ser meio-dono,
e de nada possuir.
Se faina, é pesada a carga,
se pesa, arqueja, como
monges envelhecidos.
Se procura na noite
encontra
silêncio
e coisas suspeitas.
Não posso me perdoar por não ser,
se o fizesse estaria traindo a
alguém, que não sei quem seja
nem porque está lá sentada,
me observando arguta.
Fixa,
imóvel, mas com olhos penetrantes e
fundos.
Talvez ela queira me dizer algo.
Talvez eu não queira ouvir nada.
Mas a figura estranha continua a
me perseguir.
Seus olhos azuis
são nesgas do meu passado,
seu corpo envelhecido
são sombras da juventude perdida.
E ai, me rendo, como um bom soldado,
que de guerras não quer saber -
a ela dou a mão
e partimos juntos.
Ela era a morte,
eu era vida.
Agora somos dois mortos
prontos para uma nova vida.
E prá dizer que isso acontece
a cada segundo, me amedronta
dos pés à cabeça.
Se sou fruto do mundo, estou atado
aos que me perseguem e um dia,
assolam na vida e não
descansam até tirar de mim
a força que, já escassa, em mim.
como pedras prontas a se
romperem em estilhaços,
que acabam sobrevivendo como
estrelas do milagre.
Ou anjos de guarda.
Tudo muito longe,
tudo muito arguto de
compreender.
Sou fruto da vida
e chegou a hora da
colheita!
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