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A IMPORTÂNCIA DO BRINCAR
SIDNEY PRADO PEREIRA

O universo não para de evoluir, estamos em constante movimento e crescimento. Essa evolução exige que o homem esteja preparado para desenvolver ativamente e plenamente seu papel em todas as esferas da vida social. Este fato suscita inúmeras cobranças por melhores resultados, gerando no indivíduo uma
enorme pressão psicológica. A sociedade contemporânea estimula cada vez mais a
valorização do ter e não o ser, despertando sentimentos de individualismo e egoísmo, onde os verdadeiros valores morais e éticos tornam-se banalizados, pois que importa é o ter, os bens materiais são mais valorizados do que uma vida saudável e prazerosa.
Essa pressão por parte de uma sociedade capitalista está desenvolvendo muitas pessoas frustradas, obcecadas, deprimidas, estressadas e até mesmo doentes fisicamente. Tornando-se assim quase que um modismo, sendo comum em
alguma fase da vida ouvir alguém dizer que está estressado, deprimido etc. Essas cobranças estão crescendo absurdamente nem mesmo as crianças estão fora desse processo. Nossas crianças cada vez mais cedo estão perdendo o direito a viver sua infância, recebendo responsabilidades das quais ainda não se encontram aptas para desenvolvê-las.
Há alguma coisa dentro do homem e a dimensão lúdica é a forma de expressão mais espontânea e autêntica dessa sua qualidade subjetiva.
Segundo Shiiler o homem é verdadeiramente homem enquanto brinca.
Como o brincar, a dimensão lúdica é a expressão de vida em nossa
civilização, hoje, é permitido, apenas sobreviver e não viver na sua
plenitude. (PEREIRA, 1994, p. 11)
A infância é uma fase de suma importância na vida do ser humano e a brincadeira é
uma parte fundamental e significativa nesta etapa. É um direito assegurado por leis e
declarações, reconhecendo assim a importância que o ato de brincar proporciona a
formação e desenvolvimento da criança. Sendo uma etapa fundamental para as demais etapas da vida.
O brincar proporciona benefícios ao desenvolvimento humano em diversos aspectos, físicos, motores, psicológicos, emocionais, cognitivos e afetivos. Através deles a criança age, descobre, explora, amplia seus conhecimentos e relaciona-os, expõe seu modo de ver e pensar sobre o mundo e aqueles que a cerca.
Brincar cotidianamente de diversas formas, em diferentes espaços e tempos, com diferentes parceiros (crianças e adultos), ampliando e
diversificando seu acesso a produções culturais, seus conhecimentos, sua imaginação, sua criatividade, suas experiências emocionais, corporais,sensoriais, expressivas, cognitivas, sociais e relacionais. (BNCC,
MINITÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2018. p. 38)
Além de possibilitar a criança a aprender a lidar com suas emoções, experimentando novas situações das quais é o protagonista tendo a oportunidade de exteriorizar seus sentimentos, de forma mais viva e intensa. Essas situações ajudam a esquecer problemas e a solucioná-los e a sanar dificuldades de aprendizagem.
Conforme a afirmação de Friedmann:
É brincando que a criança mergulha na vida, sentindo-a na dimensão de suas possibilidades. No espaço criado pelo brincar nessa aparente fantasia, acontece a expressão de uma realidade interior que pode estar bloqueada
pela necessidade de ajustamento as expectativas sociais e familiares. A brincadeira espontânea proporciona oportunidades de transferências significativas que resgatam situações conflituosas. FRIEDMANN, 1992, p. 32)
Brincar possibilita o exercício da imaginação, fator importante para o desenvolvimento do pensamento, permitindo que a criança estabeleça uma relação de seus interesses e necessidades com o mundo que estão descobrindo
possibilitando a estimulação de novas ideias.
Segundo Piaget:
Na sua imaginação ela pode modificar sua vontade, usando o "faz de conta", mas quando expressa corporalmente as atividades, ela precisa
respeitar a realidade concreta e as relações do mundo real. Por essa via, quando a criança estiver mais velha, é possível estimular a diminuição da atividade centrada em si própria, para que ela vá adquirindo uma
socialização crescente. (PIAGET, 1975, p.89)
Portanto, os jogos iniciam-se no imaginário, no qual as crianças podem alterálo sempre que necessário, dessa forma interagir com os objetos ao seu redor, conseguindo um melhor conhecimento da realidade.
Com a evolução do pensamento, a imaginação do ser humano vai se desenvolvendo, inerente a percepção, memória e atenção, esse processo auxilia a criança na formulação de novos pensamentos.
[...], o raciocínio pratico apresenta alguns pontos semelhantes com o pensamento adulto, deferindo em outros, além de enfatizarem o papel dominante da experiência social no desenvolvimento humano. [...], a experiência social exerce seu papel através do processo de imitação: quando a criança imita a forma pela qual o adulto usa instrumentos e manipula objetos, ela está dominando o verdadeiro princípio envolvido numa atividade particular. (VIGOTSKI, 1998, p. 29)
Segundo Adriana Friedmann (1992,p.35) “Brincando nos reequilibramos, reciclamos nossas emoções e nossa necessidade de conhecer e reinventar. E tudo isso desenvolvendo atenção, concentração e muitas outras habilidades.” esses momentos contribuem para o entendimento e a compreensão de determinadas
situações assim a criança pode criar e recriar as situações dando a elas novos significados.
A inversão de papéis que ocorre na brincadeira contribui para que a criança troque experiências e socialize com outras ao seu redor e com adultos, possibilitando um melhor conhecimento de si mesmo e do mundo que as cerca.
Essas trocas possibilitam a ampliação do vocabulário e expressão verbal, ampliam e
estimulam a exploração e descoberta de novos conhecimentos.
Estes momentos possibilitam a criança lidar com seu mundo interior sem a interferência do mundo exterior, ou que ocorra repreensão ou represálias, assim a criança equilibra seus sentimentos e vai adquirindo aspectos para sua
individualidade, sua personalidade.
Vygostky nos diz:
A brincadeira tem a função significativa no processo de desenvolvimento infantil. Ela também é responsável por criar uma zona de desenvolvimento proximal justamente porque, através da imitação realizada na brincadeira, a criança internaliza regras de conduta, valores, modo de agir e pensar de seu
grupo social, que passam a orientar o seu próprio comportamento e desenvolvimento. (VYGOTSKY apud REGO, 1995, p.82)
Na concepção de Vygotsky, psicólogo russo, a brincadeira tem um grande papel no desenvolvimento infantil à criança a utiliza pela necessidade de ação e para atender a impossibilidade de realizar certas operações. Ao brincar de pilotar um avião ou um carro a criança efetua determinadas ações que na realidade ainda não domina, operações que são determinadas para a ação.
Para Vygotsky a aprendizagem e o desenvolvimento possuem uma estreita
ligação. O jogo é uma atividade específica e social em que a criança recria o real
usando os sistemas simbólicos em um contexto cultural e o brinquedo tem enorme influência no desenvolvimento da criança, ele fornece uma ampla estrutura para mudanças da necessidade e da consciência.
Para Kishimoto (2003, p.7), o brinquedo é um objeto que dá suporte a
brincadeira. O brinquedo ajuda a simular situações, estimulam o desenvolvimento do
raciocínio da linguagem. Já para Friedman (Brincar, Crescer e Aprender, p. 12) o
brinquedo é utilizado para designar o sentido de objeto de brincar. Maria Amélia (1994, p.8) difere o brinquedo do brinquedo pedagógico para ela é um material pedagógico é essencialmente diferente do brinquedo, já na concepção de Vigotsky (2007). O brinquedo tem um papel marcante para desenvolvimento, não podendo ser definido como objeto ou atividade que dá prazer a criança.
Enquanto brinca a criança aprende a conhecer, pois divide e troca informações com os outros, formula hipóteses, assim relaciona o que já sabe com o que está descobrindo. Instigando a resolução de desafios possibilitando a relação
com o pensamento. Brincando a criança faz uma transição do nível de aprendizado que se encontra para outros mais elevados.
Assim o brincar permite também o desenvolvimento do autoconhecimento, elevando a autoestima, propiciando o desenvolvimento físico-motor, bem como o do raciocínio e da inteligência, sensibilizando, socializando e
ensinando a respeitar as regras. Enfim, o brincar diverte, traz alegria e faz
sonhar. (CARNEIRO; DODGE, 2007. p. 67)
Com a crescente cobrança da sociedade atual, o brincar está cada vez mais escasso, a falta de espaço e tempo são fatores que contribuem para isso. As brincadeiras ficam reduzidas a curtos momentos em que as crianças vão ao parque,
play ground ou nos recreios das escolas. Mas a escola não é concebida como local para brincadeiras é um local tido como sério, onde se deve valorizar o aprendizado, devido a essa visão sobre a escola o brincar é banido ou visto como perda de tempo.
A escola sobrevive porque a criança se encontra com outra criança lá dentro, porque sem isso… se você tivesse ainda a brincadeiras de rua, elas estariam fugindo das escolas, a escola tem que resgatar isso, ela tem que
redefinir a sua função no século XXI. Ela se prostituiu cedendo o lugar dela se transformadora para mantenedora, no mais baixo nível, do status quo. A escola é, hoje um depósito de energia, segura os meninos porque eles não podem estar na rua e o professor é um herói, aliás herói não, mártir do
sistema. (PEREIRA, 1994, pág. 27)
O papel da escola é formar cidadãos capazes de atuar e transformar a realidade que estão inseridos, porém não está cumprindo com seu papel, seu principal objetivo é cumprir com o currículo (há um descompasso entre o currículo
declarado e o oculto) em que na maioria das vezes não visa à realidade do educando e não contribuem para seu pleno desenvolvimento. De acordo com Marcellino:
Há espaço para o lazer na escola, que não seja o dos “famigerados dias de
lazer”, impostos pelos calendários escolares e as incontáveis “festas”, que de festa pouco ou nada tem, mas se constituem em instrumentos para a arrecadação de fundos necessários para cobrir despesas que deveriam ser da responsabilidade do poder público. MARCELLINO, 1990. p. 101)
O sistema educacional brasileiro ainda em sua maioria é focado nos moldes
tradicionais de ensino e essa realidade necessita de mudanças. O tradicionalismo já
trouxe resultados em outras épocas, hoje nossa realidade é totalmente diferente, já
está comprovado a partir de estudos que nossas crianças são ativas no processo de
aprendizado.
De acordo com a BNCC (2018, p. 39) “Parte do trabalho do educador é
refletir, selecionar, organizar, planejar, mediar e monitorar o conjunto das práticas e
interações, garantindo a pluralidade de situações que promovam o desenvolvimento
pleno das crianças. As atividades que envolvem o lúdico são fundamentais para o
desenvolvimento intelectual e cognitivo das crianças tornando-se indispensável a
prática docente.
O brincar é essencial a vida da criança, então algo nas práticas educativas
não estão indo de acordo com o que se compromete o desenvolvimento do ser. A
brincadeira é algo quase que extinto nas escolas, professores, diretores e até
mesmos os pais não reconhecem os benefícios que brincar proporciona a vida da
criança.
A operação é, na compreensão de Piaget, um tipo particular de ação que
constrói estruturas lógicas. Uma operação está sempre ligada a outra e é
parte de uma estrutura total. Essas estruturas são base do conhecimento.
(FRIEDMANN, 2002, p.57)
Outro fator importante é a falta de formação de profissionais, muitos
educadores não estão aptos ou não se sentem preparados para introduzir a
brincadeira em sua prática pedagógica.
No livro Educação da Sensibilidade, Maria Amélia nos mostra uma solução
prática em relação a esse problema, ela acredita que a formação acadêmica não
deve se restrita apenas as teorias do brincar – lúdico, para se aprender é necessário ir às ruas (in Loco) e observar as crianças brincando, pois somente através dessa
formação o profissional entenderá o processo em sua essência. “Não vejo outro
meio para se formar o professor a não ser através da observação” (PEREIRA, 1994,
Pag.18).
Uma aula bem planejada e descontraída pode possibilitar mais a curiosidade
em aprender do educando, não limitando ao aluno a seriedade e severidade na qual
estamos habituados, os resultados podem ser bem melhores quando despertamos
essa curiosidade, pois quem afirmou que aprender deve ser ou tem que ser chato? E
que não se pode aprender brincando.
Com o corpo (por meio dos sentidos, gestos, movimentos impulsivos ou
intencionais, coordenados ou espontâneos), as crianças, desde cedo,
exploram o mundo, o espaço e os objetos do seu entorno, estabelecem
relações, expressam-se, brincam e produzem conhecimentos sobre si,
sobre o outro, sobre o universo social e cultural, tornando-se,
progressivamente, conscientes dessa corporeidade. (BNCC, MINISTÉRIO
DA EDUCAÇÃO, 2018, P. 41, 42).
Brincando a criança corre, pula, movimenta-se possibilitando um melhor
conhecimento de seu corpo. Favorecendo e aperfeiçoando as habilidades físicas e
motoras, pois desenvolvem os músculos, absorvem oxigênio, treinam o equilíbrio,
entram em contato com vários objetos e situações desconhecidas. O brincar como
atividade física para a criança desencadeia processos de ordem biológica,
fisiológica, proporcionando saúde e qualidade de vida.
A criança, quando brinca, vai acumulando, desde bebê, as experiências que
vão construindo sua cultura lúdica. Essa experiência vai se enriquecendo na
medida em que ela participa de brincadeiras com outros parceiros (adultos e
crianças), pela observação de outras crianças e pela manipulação cada vez
maior de objetos de jogo. A brincadeira é um processo de relações da
criança como o brinquedo, com outras crianças e com os adultos, portanto,
um processo de cultura. (SALTA PARA O FUTURO, PORTO, 2008. p.36)
A localização temporal e espacial também é favorecida, existem brincadeiras
que necessitam de uma maior locomoção levando as crianças a aprenderem noções
de espaço e tempo que são gastos para percorrer determinados trajetos.
O movimento ajuda a criança a construir conhecimento do mundo que a
rodeia, pois é através das sensações e percepções que ela interage com a
natureza. É através de sua ação no meio ambiente que a criança pode
formular os primeiros conceitos lógicos matemáticos, pois o sentido de
tempo e espaço é construído primeiramente no corpo, corpo este que media
a aprendizagem. Assim, brincando com seu corpo a criança vai construindo
diferentes noções. (OLIVEIRA, 1997, p. 34)
A criança que tem a possibilidade de brincar em sua infância torna-se um
adulto mais saudável, capaz de solucionar seus problemas com mais facilidade,
confiantes, criativos, autônomos, pois através desses momentos conseguirão
superar seus traumas, medos, angústias, experimentando a superação de seus
limites, além de ser algo totalmente prazeroso não devemos esquecer que através
delas a criança aprende de forma espontânea e prazerosa.


Biografia:
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