Foi anunciada uma nova excursão, na quinta série. Legal, zoeira no fundão do “busão”, gritaria e, muito importante, sem aula. Só que a excursão era para o programa do... Bozo, o palhaço. Eu, no alto dos meus 11 anos, achava aquele passeio ultrajante. Eu já me considerava um adulto. Um cara que nunca mais foi visto brincando com carrinhos e corria até a loja de doces sozinho. Quem deixou a infância para trás não podia aceitar aquele retrocesso.
Durante dias, aquele dilema tomou conta da minha cabeça. Ao menos eu tinha uma justificativa, acreditava, para as notas baixas. Depois de muito refletir no prejuízo que aquela, aparentemente inofensiva, aparição no show do parlapatão me traria, decidi ir, afinal, ficaria atrás, escondido dos telespectadores.
Durante o trajeto, tudo igual a toda excursão. Na atração televisiva do saltimbanco alçado à condição de astro midiático, eu fiquei, lamentavelmente, na primeira fileira, vergonhosamente de frente para a câmera e, para humilhação definitiva, segurando um tipo de pompom, para chacoalhar nos momentos de, suposta, animação. Fiquei catatônico, por ver aquela, literalmente, palhaçada ao vivo e participar de algo que causaria embaraço pelo resto da minha, ainda incipiente, vida.
No intervalo, eu fui transferido para trás no pequeno auditório, por absoluta falta de animação. Lá, eu pude ficar estático, segurando aquele maldito pompom.
Num dos intervalos, pude desmascarar o simulacro de palhaço. Quando vi, atrás da arquibancada, o Bozo sorvendo uma fumegante xícara de café, escorreram ralo abaixo os resquícios da inocente infância que ainda resistiam. Depois fui saber, cafeína era o único “aditivo” confessável que ele usava. Bozo partiu, do meu imaginário, como Papai Noel e Coelhinho da Páscoa.
Hoje, até exponho este episódio nesta crônica, porque o “Zé Graça” tornou-se pop, cool ou vintage. Em suma: ele é old school, em tempos que o eufemismo ou o politicamente correto rebatizaram o velho histrião de clown. Esse baluarte do imaginário infantil, era doidão e, por isso, virou filme. O farsante, também, virou ícone ou símbolo de uma época (anos 80). Então, hoje sinto até um pequeno orgulho de ter ido ao programa do Bozo.
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