Desejo falar sobre a mulher, inspirada numa cena do cotidiano. Vi uma feirante, em cima de um caminhão, esforçando-se para soltar a lona de sua barraca, em final de feira, sábado à tarde. Era de idade madura, traços orientais e delicados. Ao vê-la logo me ocorreu como deveria ser extensa sua jornada. Acordar de madrugada, adquirir os produtos no atacado, carregar, armar a barraca no local habitual, atender a clientela, certamente de forma atenciosa. Após o encerramento todo o trabalho de novo até chegar a casa e descansar. Sem medo de errar, umas 10 horas consecutivas de trabalho.
Desde o massacre de Nova Iorque em 08 de março de 1857 data que depois foi convencionada de se comemorar o Dia Internacional da Mulher até a presente data muita mudanças e conquistas ocorreram.
É incontestável a presença marcante das mulheres em todos os segmentos produtivos da sociedade quer como profissionais liberais ou como colaboradoras nas mais diversas atividades, não só naquelas tidas como específicas pata mulheres, pois estas já desbravaram caminhos, abriram oportunidades para todas as que as seguiram.
A família e a sociedade mudaram com o trabalho da mulher, com sua ascensão profissional, o que inclui na bagagem uma dupla jornada e muitas vezes uma boa dose de culpa por sair de casa e deixar os filhos entregue a familiares ou a terceiros.
Ao escrever, desta vez desejo fazê-lo para aquelas que ainda não conseguiram se libertar de uma carga culturalmente muito pesada, que as massacre e mantém, via de regra, na mesma situação daquelas que as geraram, sem ter havido modificação na escala social, pelo que ainda hoje não vêem diante de si perspectivas de mudança.
Penso naquelas que ainda permanecem analfabetas e que por isto mesmo passam ao largo da inclusão social, nas sem trabalho, naquelas que, mesmo tendo escolaridade que lhes permitiriam prover seu sustento, não o fazem, por falta de oportunidades nesta sociedade extremamente competitiva e excludente; naquelas que permanecem sob o jugo de pais ou maridos que não permitem que elas trabalhem por preconceito, ignorância, discriminação ou simples insegurança.
Aplaudo nesta data, aquelas que trabalhando em atividades consideradas subalternas, sem maior grau de escolaridade também conseguem desempenhar múltiplos papéis, manter suas respectivas famílias, formar filhos em universidades, sem terem as compensações que aquelas de postos mais altos têm, como oportunidades de lazer variadas, viagens de férias em praias, atividades culturais, pois os parcos recursos que dispõem são para o sustento de filhos, pais idosos, marido enfermo além de outros familiares não enfermos, mas excluídos do segmento produtivo.
Este texto é para a senhora da feira, para a do cafezinho, da faxina, para a cozinheira, para a que trabalha de gari, para a dona de casa e outras tantas, como a comerciaria, a manicure, a florista, a ambulante, tão mulheres quanto às demais e que levam uma vida aparentemente sem glamour, levantando às seis horas da manhã fazendo um trabalho sempre igual.
A sociedade é uma engrenagem (que pode ser cruel) que necessita de todas as peças para funcionar, portanto, todas investidas de valor.
Não seria justo esquecer daquelas que mesmo sob a vigência da Lei Maria da Penha continuam a ser agredidas.
É importante que o círculo de exclusão seja rompido e que aquelas inseridas naquele segmento da sociedade sem oportunidades, quer pelo fator econômico, social, cultural por questões relativas à etnia ao gênero, ao credo ou diversidade sexual consigam acesso a melhores condições não só de sobrevivência, mas de vida digna que possam romper os paradigmas determinantes desta condição, de modo que seus filhos não repitam este estigma e sejam portadores de novas esperanças e de um novo futuro.
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