O homem morto
está tão absorto
que não vê o mundo fenecer ao redor...
Se lhe perguntarem como está,
se mal ou pior,
dirá, silenciosamente,
bem melhor
do que quando estava vivo,
a pensar ter amigos,
falsos ou verdadeiros,
todos por dinheiro,
isso tudo dito
com os lábios em ricto,
sensual e trigueiro...
Os que creem em hipnose ou ilusão,
que uma faísca mágica, dirão,
saiu dos olhos do falecido,
como um risco no vidro
de sua íris cor de carvão:
será que ele quer voltar,
barco ao cais retornar?
O homem morto,
descrente do que se passa ao largo,
sente que lhe movem os bagos,
lhe lavam os pés,
o enchem de perfume;
ciente de sua última confissão,
olha a face do padre
e entrega à morte seu coração,
sem queixumes...
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