Olhei-a de soslaio, buscando disfarçar minha cara de boba e as batidas inquietas do meu coração. Geraldo Azevedo ecoava como uma oração em meus pensamentos. Cada vez que eu ouvia: “Dona da minha cabeça, ela vem como carnaval e toda paixão recomeça...”, sentia que não havia jeito, estava de fato apaixonada. Aquele sorriso dançando nos lábios dela, o jeito como arrumava as mechas fugidias, até as marcas de expressão da idade que chegava em passos lentos me atraiam profundamente. Meu corpo reagia com ferocidade ao calor que emanava de suas mãos ao tocar, sem pretensão, em minha pele. Mas como dizer-lhe a verdade? Provavelmente provocaria repulsa, faria com que ela me odiasse e não quisesse mais me ver, afinal, estava certa da sua sexualidade, como insistia em dizer sem rodeios. Então, a incerta era eu? Nunca pensei sobre essas coisas, afinal me achava hetero com H. No entanto, estava ali, olhando aquele rosto como se o mundo pudesse acabar naquele instante. “Talvez eu estivesse confundindo as coisas”, disse-me meu analista. Confundindo? Acho que não! Cada vez estava mais certa de que a amava, desejava, queria. Quis muito me convencer de que se tratava de admiração por tudo que ela representava em minha vida, mas mais uma vez Geraldo Azevedo atirava a verdade a cara com seus versos: “Não há um porto seguro, futuro também não há, mas faz tanta diferença quando ela dança.” Meu Deus, quando ela dança... seu corpo se insinuando como um poema a luz do sol, cintilando, mavioso e suave. Todas aquelas sensações diversas que culminavam em formigamentos no estomago. As famosas borboletas existiam mesmo, agora sabia. Mas afinal, nada poderia dizer. Me restava sonhar, pois nos sonhos nada nos é proibido. Embalada por Geraldo, continuei a imaginar enquanto a ajudava a lavar a louça suja do nosso jantar de 4 anos de amizade.
|