Quando eu era mais nova os adultos sempre falavam que eu nunca havia tido problemas de verdade, que eu só os entenderia quando alcançasse a sua idade. Mas na verdade eu percebi algo, os mais velhos nos apresentam esse quadro fictício porque ouviram de seus antecessores, e acataram sem se dar conta de que o reproduziam sem estudar suas próprias vidas.
Você vai passar anos da sua existência desconsiderando suas experiências. Verdadeiras décadas esperando chegar aquele dito momento em que você poderá se considerar adulto suficiente para pronunciar aquelas mesmas palavras. A hora em que seus antecessores te darão parabéns por ter problemas de verdade. Por conseguinte, ninguém consegue ver as consequências de tudo isso. Temos então um grande problema, pois depois de tanto tempo esperando para gritar seus problemas de verdade para o mundo, você não percebe que não é uma experiência especifica que te introduzirá no mundo real, você já está nele! E nem sequer percebeu suas cicatrizes ao longo do caminho, simplesmente porque ouviu a vida toda que eles não eram problemas de verdade, “de adulto”, e que trazê-los à superfície seria besteira.
Eu tenho então outra notícia pra te dar, o quadro nunca vai se inverter e os que vieram antes de você não param no tempo para dizer “está vendo, isso sim é um problema sério, agora você entende.” Os mais velhos só ficam mais velhos, e eles sempre te enxergarão como alguém alheio aos problemas de verdade, quando na verdade o que eles deveriam dizer é que nunca entenderíamos os problemas deles. Perseguimos algo inalcançável, porque nunca nos sentiremos dignos das cicatrizes que estão em nós.
Eu já acreditei nessas palavras um dia. Elas foram ditas pela minha mãe, minhas tias, minha avó... Então passei uns bons 10 anos esperando o ponto de ruptura em que finalmente eu entenderia o que elas queriam dizer, mas ele nunca aconteceu, pelo menos não da forma que eu imaginava. Foi algo mais gradual, como o envelhecimento físico, que você só se dar conta pra valer quando olha uma foto de anos atrás e percebe o quanto mudou. É quando você olha pra trás e lembra aquele momento na sua infância, quando sua melhor amiga fez uma “brincadeirinha” te chamando de gorda na frente de todo mundo e você só queria chorar, mas te disseram que era bobagem chorar por isso. Aquela “brincadeira” te fez sofrer por não estar no padrão por boa parte da sua vida, mesmo que estivesse bem aos olhos dos outros. Ou na sua pré-adolescência, quando você decidiu que beijar na boca te faria ser alguém, só porque todos faziam, por isso seria idiota se não fizesse. E consequentemente, levou um não do garoto “pop” o qual era apaixonada, acarretando uma total quebra de autoestima. Ou ainda quando você se dá conta de que foi abusada por alguém em que você confiava, e isso te transformou em uma pessoa chata, fechada, autocrítica, desconfiada e com algo escuro dentro da alma, pois não conseguia perdoar. Podemos lembrar também das suas trivialidades. Quando você tirou seu primeiro zero em uma prova, e ninguém viu como te afetou; Quando se dedicou tanto a uma matéria só pra mostrar que podia, mas não deu certo. E em todos esses pequenos casos você não era permitido se queixar, pois havia pessoas com problemas mais sérios no mundo.
Às vezes estar no limbo é a melhor coisa para alguém, pois a inércia faz a queda de um alfinete pareça um raio. Péssima comparação, eu sei. A questão, é que nessa espera pelo crescimento abordado pelos mais velhos, ignoramos total e completamente os pequenos pontos de ruptura durante a vida. Mas um dia acontece. É apenas uma percepção, mas está lá e é tão real quanto essas marcas invisíveis em suas mãos. Você começa a se lembrar do sentimento de ver seu avô preferido morrer, e saber que ele nunca verá você se casar ou ter filhos. Recorda-se das vezes em que deixou alguém te magoar e fingiu que estava tudo bem, ou ainda quando você magoou pessoas por aí e nem sabe disso, ou sabe e deseja desesperadamente voltar atrás. Aquela sensação de facas no estômago quando alguém , o qual você achava que conhecia, reage de uma forma covarde com outra pessoa bem na sua frente, e tudo o que você sente é vontade de gritar. A confirmação vem, e continua até que as barreiras levantadas anos atrás por seus antecessores são derrubadas, a descrença dos “experientes” te impediu de mostrar a todos que sim, você entende. E eles, na nossa idade, também entendiam, mas se esqueceram disso.
Pessoas irão dizer que é necessário ter a experiência deles para se receber o direito a queixa. No entanto, vivemos momentos decisivos desde que fomos gerados. Há os grandes momentos, ou apenas simples palavras, mas todos são construtores de caráter. Não deixem que te digam que nunca passou pelo bastante, pois aqui entre nós, eles não sabem nem 10%. Não estou dando garantia de que todos são iguais e que vão passar pelos mesmos problemas, porque ainda haverá mais. Algo bom, algo ruim, tudo é uma soma de experiências que vão deixar cicatrizes, e essas sim são a prova da compreensão, não seus anos de vida, mas quantos momentos você superou durante esse período. E se eu aprendi algo, é que os adultos não estão sempre certos. Basta olhar para você, que está lendo esse texto. Você é adulto, sempre acertas? Então não é válido ter a frustrante impressão de que um senhor de 50 anos estará.
Tenho 21 anos, e como disse, cansei de ouvir pessoas dizendo que eu não estava pronta o suficiente para compreender certas coisas. Eles podem até estar certos, em parte: eu nunca vou saber como é viver os problemas deles, mas eles também nunca saberão como é passar pelo o que eu passei. Muitos jovens são jovens apenas na identidade, porque dentro de cada um deles existe uma barreira que já foi rompida. Chegamos então a uma de muitas conclusões: a medida de experiências de vida não deveria ser baseada em números, mas em quantas vezes seu coração sangrou.
A vida, eu percebi, é linda sim. Não como poesia, mas como uma terra árida que precisa ser tratada diariamente para render frutos. Não importa quanto você já vivenciou, você verá ainda mais. E sim, eu me dou o direito de escrever isso. Mas o principal ponto de ruptura será aquele quando você verá que o único jeito de transformar todas as suas experiências em algo bom para si mesmo e para outros, é encontrar o amor. Não um amor, O amor. Ele te mostra o seu valor, te da uma nova autoestima, e segura a sua mão nas horas escuras, quando a confusão é tudo o que existe dentro de você. Aceitar o que você viveu sem desmoronar, só é possível olhando naqueles lindo olhos e segurando as suas mãos firmes, que nunca te deixarão cair. O amor sempre te amará de volta.
Posso não ter todas as respostas, mas sei o caminho.
|