O que resta, no fim,
é só o clarão de luz que entra pela janela,
o bater macio da colher na panela,
o arroz e o feijão soltando fumaça,
o rir desajeitado da piada sem graça,
resta o pouso da mão sobre a outra mão,
a voz que recita um poema feliz,
o avião que passa e deixa um rastro de som,
o cão que late sem ter porque,
o bom-dia dado pelo homem do gás,
o que resta é um comichão no coração,
a vontade de abraçar alguém,
um riso miúdo e um choro graúdo,
o perfume da flor arrancada da árvore,
resta o silêncio depois que a palavra cala,
um fiapo de sonho quando se acorda,
o café bem quente e o pão macio,
um sentimento de evitar o pior,
restam as mãos lavadas depois do...,
o convite para a formatura do filho,
a água que desce pela torneira,
a fé, a crença, o desejo de continuar,
resta esta poesia que fiz com amor,
resta, de dentro dela, um salto,
resta a úmida lágrima, incolor...
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